Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A arte de assoprar brasas

Habituados a enxergar o jogo político como cenário de guerra, ao qual se integraram nos últimos anos mais como combatentes do que como testemunhas, os principais jornais de circulação nacional apostam no agravamento da disputa entre o PT e o PMDB como tema principal de suas edições de terça-feira (4/1).


Muito provavelmente os editores estão corretos ao avaliar que a primeira dificuldade concreta da presidente da República, tida como pessoa pragmática e decidida, será acomodar todos seus aliados em cargos de destaque. Mas falta ao noticiário um detalhe importante: analisar, e ilustrar os leitores a respeito, o que torna tão interessantes esses cargos.


De modo geral, as reportagens e comentários sobre essas disputas fazem referência às verbas monumentais administradas por diretores de estatais e secretários executivos de ministérios, o que deixa no ar uma suspeita de más intenções entre os que ambicionam controlar esses postos. Se esse dilema acontece a cada início de governo, talvez fosse interessante explicar à opinião pública como funciona o trajeto do dinheiro público entre o Tesouro e sua destinação final, e onde estão os furos por onde ele pode vazar.


Cenário para reflexão


Outra questão que aflora do noticiário, nesses primeiros dias de inauguração, é o surgimento de divergências entre ministros. A nova titular da Secretaria dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, anunciou que vai instalar a Comissão da Verdade, criada no governo anterior, para investigar as violações de direitos humanos durante a ditadura militar. O novo chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general José Elito Siqueira, se manifesta contrário à ativação da comissão, argumentando que os fatos do período devem ficar nos arquivos históricos.


A imprensa volta regularmente a esse tema, mas, afora a desastrada avaliação da Folha de S.Paulo, segundo a qual o período do regime militar foi apenas uma ‘ditabranda’, faltam bons trabalhos jornalísticos sobre o que realmente ocorreu entre o golpe militar de 1964 e a redemocratização do país, consolidada com a posse de José Sarney na Presidência da República.


A chegada ao poder de uma ex-guerrilheira, que tem como um dos principais aliados o velho senador que tantos serviços prestou à ditadura, produz o cenário ideal para uma ampla reflexão sobre nossa história recente.


Muito protagonismo


Até mesmo para habilitar-se a projetar o que imagina como futuro do Brasil, a imprensa e a própria sociedade precisam ter bem claro na memória o que tem sido essa trajetória da República.


O período em que a democracia brasileira esteve interrompida produziu efeitos importantes não apenas na política, mas também na segurança pública, na educação e nos negócios.


Há quem diga, como o general Siqueira, que não se deve revolver o passado, agora que o Brasil, segundo a maioria dos prognósticos, tem sua melhor oportunidade de desenvolvimento. Mas há controvérsias, e o papel da imprensa é iluminar o debate.


E qual é a capacidade real da imprensa brasileira de fazer uma análise profunda e isenta sobre os fatos da História, tendo sido ela própria, na maior parte desse tempo, mais protagonista do que cronista?


Observatório na TV


Conforme observa Alberto Dines, a mídia saiu-se muito mal neste final de ano em matéria de retrospectos – do ano, do mandato presidencial e da década. Não é para estranhar: o próprio trabalho da mídia, tanto no plano factual como analítico, ficou muito, mas muito abaixo do razoável.


A edição desta terça-feira (3/1) do Observatório da Imprensa na TV tenta compensar essa lacuna com avaliação do que aconteceu e o que poderá acontecer. Sem bolas de cristal e adivinhações, apenas tentando projetar para adiante os fatos marcantes de 2010.


Uma espécie de pré-pauta para o ano que começa, com a participação dos mesmos analistas dos últimos dois anos – Renato Lessa, Sérgio Besserman e Cláudio Bojunga. Hoje, às 22h, em rede nacional pela TV Brasil. Em São Paulo, pelo canal 4 da Net e 181 da TVA. A partir de quarta-feira (5/1), no site do Observatório da Imprensa, você poderá ver a íntegra dos balanços de 2008, 2009 e 2010. Vale a pena comparar.