O caso News of the World é uma desgraça para o jornalismo. Pior do que a crise de modelo de negócios que afeta a atividade na América do Norte e na Europa ocidental. Porque envolve valores mais importantes que os financeiros e econômicos.
Como se tem noticiado, há evidências fortíssimas de que repórteres e editores desse tabloide inglês – que faz parte do conglomerado mundial de mídia de Rupert Murdoch – invadiram a caixa de mensagens do telefone de uma menina de 13 anos que foi vítima de homicídio e de soldados britânicos mortos no Afeganistão e no Iraque, além de pagar suborno a policiais por informações.
A indignação pública com essas revelações se refletiu no mercado de ações e de publicidade. Murdoch pretendia fechar nesta sexta-feira (8/7) uma grande operação que lhe daria o controle do canal de TV pago BSkyB, o que provavelmente não vai mais ocorrer. Diversos anunciantes cancelaram sua programação no News of the World.
Entre as consequências do episódio até agora estão: o fim do jornal, anunciado pela família Murdoch na quinta-feira (7/7), a muito provável prisão de diversos jornalistas envolvidos na história, ameaças de políticos conservadores de tentar aprovar leis para aumentar o controle estatal da imprensa.
Mau exemplo
Muitas conclusões podem ser tiradas dessa situação escabrosa. Uma: está mais do que na hora de o jornalismo se autorregular de verdade, por meio de mecanismos ágeis que inibam ações como as que ocorreram no News of the World e, quando elas assim mesmo ocorrerem, permitam punições significativas para os que as cometerem.
Outra: se o jornalismo – em qualquer meio (impresso, audiovisual ou internet) – deseja sobreviver e se manter socialmente relevante, precisa pautar o comportamento de seus profissionais por princípios que sejam opostos aos daqueles que o combatem na blogosfera. Ou seja: eles devem ser responsáveis, nunca usar formas ilegais ou ilícitas para conseguir notícias, seguir padrões de conduta respeitáveis em qualquer circunstância.
Terceira: os empresários do setor também precisam obedecer a valores similares aos que seus funcionários devem se submeter. A decisão de fechar o News of the World (que possivelmente será acompanhada da de ampliar a circulação do outro tabloide do grupo na Inglaterra, The Sun, o que portanto significará na prática uma fusão sob um só título, com grande economia de custo) é duplamente imoral: não resolve literalmente nenhum dos problemas éticos criados e ainda é oferecida à sociedade como uma resposta drástica em favor da moralidade.
Os tabloides ingleses, como a imprensa sensacionalista no mundo todo, sempre foram alvo de recriminações de parte da população e de muitos observadores da imprensa pela sua própria essência e pelo conteúdo de que se nutrem. Mas há inúmeros exemplos em que esse tipo de jornalismo foi e é exercido com inteligência, profissionalismo e dignidade.
O que o News of the World fez não foi jornalismo. Matá-lo como os Murdoch fizeram não resolve coisa nenhuma.
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[Carlos Eduardo Lins da Silva é jornalista]
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