Em geral, é nas manchetes e nos grandes títulos que ocupam o alto das páginas dos jornais que o leitor vai buscar assuntos para suas conversas e a consolidação de suas opiniões. Essa é a razão principal para haver uma hierarquia entre as notícias: os jornalistas sabem que existem fatos mais e menos importantes para mover a opinião do público e, obviamente, aplicam os critérios adotados em cada publicação para fazer essas escolhas.
Um jornal ou revista que não seja capaz de se manter entre os principais interesses de seu público certamente não pode assegurar que continuará circulando por muito tempo.
No entanto, eventualmente a realidade do mundo pode ser captada com mais precisão e abrangência em pequenas notas, ou até mesmo em uma palavra perdida em meio ao noticiário mais atrativo.
Observe-se, por exemplo, que os principais jornais brasileiros desta quarta-feira, dia 18, publicam com destaque os últimos indicadores de crescimento da economia chinesa. Cada um com sua nuance, os chamados diários de circulação nacional dão conta de que o Produto Interno Bruto chinês cresceu 8,9% no último trimestre de 2011, fechando o ano em 9,2%, índice igual ao de 2009, ano que marcou o auge da crise financeira reconhecida em 2008.
O leitor que tenha acesso aos três jornais vai observar que a Folha de S.Paulo puxa para o pessimismo – o que já é um vício de seus editores –, anunciando na primeira página que a economia chinesa “tem desaceleração no final de 2011”.
O Globo foi buscar um cenário mais amplo e embute a informação sobre o PIB da China em outra reportagem, noticiando que a população chinesa já é mais urbana que rural, fenômeno que se registra pela primeira vez na milenar história daquele país. O jornal carioca explica que o processo faz parte da política de incentivo do governo chinês para estimular a migração, com o objetivo de fortalecer o mercado interno e reduzir a dependência de sua economia das exportações. De passagem, o Globo informa que o PIB de 9,2% registrado em 2011 é o menor em dois anos e meio, mas ainda superior às previsões, o que fez as bolsas subirem em todo o mundo.
O Estadão ficou no meio-termo, observando que a desaceleração da economia chinesa no quarto trimestre do ano que passou foi analisada positivamente pela maioria dos especialistas, porque indica um processo seguro de combate à inflação sem que a queda da atividade econômica venha a afetar a economia global.
O chamado “pouso suave” da economia chinesa foi bem recebido pelo mercado, a julgar pelas opiniões reproduzidas nos jornais – apesar do pessimismo atávico da Folha.
Ameaças à democracia
Mas nem só de manchetes é feito um diário.
Como dizíamos no início, há notícias interessantes também nas notas minúsculas que completam o pé das páginas.
Uma delas, publicada pelo Estadão, por exemplo, diz que um dissidente chinês foi indiciado pelas autoridades daquele país por ter escrito no ano passado um poema sobre a liberdade. Zhu Yufu, o perigoso poeta, é um veterano de manifestações pela democratização da China. Participa de movimentos dissidentes desde 1979 e já foi preso duas vezes antes – condenado em 1999 a sete anos de prisão e, posteriormente, em 2007, a mais dois anos de reclusão.
O ato subversivo que deverá lhe custar mais alguns anos de privação da liberdade foi a publicação, na internet, de um poema de sua autoria que as autoridades interpretaram como uma conclamação aos chineses a aderirem à “Revolução do Jasmim”, movimento que surgiu na esteira da “primavera árabe”, no início de 2011.
Mal traduzido de uma versão em inglês, o trecho principal do poema diz mais ou menos o seguinte: “Está na hora/povo chinês/A praça pertence a todos/Os pés são seus/Está na hora/de usar seus pés/para caminhar até a praça/e fazer uma escolha”.
Embora seu advogado afirme que Zhu Yufu não participou diretamente do movimento, seu poema foi reproduzido por outros dissidentes.
Também está nos jornais, com um pouco mais de destaque, a decisão dos dirigentes da Wikipedia, a enciclopédia colaborativa da internet, de bloquear suas páginas nesta quarta-feira, em protesto contra duas leis que estão sendo votadas na Câmara dos Representantes e no Senado dos Estados Unidos e que, segundo afirmam, poderão afetar a liberdade de expressão na rede mundial de comunicações digitais.
Os projetos conhecidos como SOPA, acrônimo para a denominação, em inglês, que significa Ato de Contenção da Pirataria Online, e PIPA, denominação dada ao Ato de Proteção à Propriedade Intelectual, foram inspirados por parlamentares conservadores logo após a eclosão do fenômeno do Wikileaks, que revelou o conteúdo de milhares de documentos secretos.
Não está nos jornais, mas a grande imprensa discretamente andou apoiando as duas propostas que ameaçam a comunicação democrática na internet.