Com os últimos tempos mergulhados em crises política e econômica, uma das saídas mais viáveis para que a sociedade se municie e possa agir é através da aquisição de informações a respeito dos ocorridos. Informações das mais variadas fontes e formatos, desde que possam ajudar uma pessoa a traçar, sem deixar de lado sua bagagem, um cenário do próprio país. Acontece que o que temos obtido – e de forma abundante – é mero conteúdo, e não informação. Em plena era da informação, estamos mergulhados em info-entretenimento, palpites e especulações. É o jornalismo do grito.
Nenhum veículo de comunicação está isento de parcialidades. É uma questão humana tomar um lado como o mais correto, o mais verdadeiro, o mais alinhado com nossas convicções. Porém em alguns setores estratégicos, como o jornalismo, apesar das parcialidades nossas de cada dia, olhares macro e micro de ambos os lados devem andar juntos, lado a lado, e jamais sobrepostos ou ocultos.
O que temos presenciado com o agravamento da crise política e da crise econômica é um agravamento acirrado e preocupante do jornalismo brasileiro. Um jornalismo partidário, panfletário e financiável. Emissoras, jornais impressos, revistas, portais ou profissionais autônomos. Todos estão demonstrando conjuntamente, embora em lados diferentes de um mesmo muro, desserviços gravíssimos para com a sociedade brasileira.
As maiores emissoras do país, juntamente com seus mais importantes noticiários jornalísticos, traçam um cenário do que seria o ideal de discurso. Por falta de emissoras com alinhamento editorial diferente, fica difícil compararmos em pares, mas é possível enxergar falhas sérias, tendenciosas. O mesmo caminho tem sido tomado pelos maiores jornais do país. Ainda que mais coerentes em seus discursos, mais analíticos e profundos em suas reflexões, também cometem deslizes graves na prestação do serviço jornalístico. Mas nem de longe são comparáveis aos acontecimentos da guerra entre a chamada internet progressista e a maior revista impressa do Brasil.
Tempos perigosos
Muito criticada em ambientes acadêmicos, a revista Veja tem partido para um ataque que não se sustenta, fraco, sem prestar atenção que a cada passo dado, centenas de “comprovações contrárias” são expostas da rede. Sejam elas reais ou forjadas, isso compromete a cada dia a imagem da publicação diante do público. A revista Veja tem se comportando como os famosos mafiosos hollywoodianos que, quando emboscados, sempre achavam mais lúcido “cair atirando”. A revista, que já não tem mais a mesma força nem o mesmo respaldo em cenário nacional, usa um jornalismo considerado duvidoso, com argumentações e posições que mais se assemelham a posições pessoais do que jornalismo bruto. Esquece-se o jornalismo serviço e foca-se o jornalismo de manchete, de ataque, de grito.
Porém, do outro lado dessa guerra jornalística, temos a chamada resistência, formada por portais, blogs e jornalistas independentes que, assim como Veja, mergulham em partidarismos explícitos e se esquecem que o papel de informar está – ou deveria estar – acima das posições pessoais. Nesse ponto vale o resgate do que já foi dito: nenhum veículo de comunicação está isento de parcialidades, mas o que temos presenciado no entrincheiramento entre jornalismo pró ou contra é de assustar. Merece reflexão por parte da academia, por parte do mercado e, sobretudo, por parte da sociedade.
Sim, da sociedade, pois se existe um veículo produzindo conteúdo – e não informação – a níveis partidários explícitos e sem qualquer receio de cometer ataques (inclusive pessoais) ou usar de jargões nada recomendáveis para expor opiniões – e não informações, vale repetir – é porque do outro lado alguém está consumindo e se sentindo satisfeito com o que vem recebendo como jornalismo. Nesse caso não vale a máxima de “consumir” diferentes veículos para criar uma ideia mediada na balança. Ajuda, mas não resolve. O jornalismo está cruelmente deficiente em qualidade, em estrutura e inovação em nosso país, mas sobretudo nos últimos tempos estamos tendo a chance de observar como um importante eixo da sociedade tem se tornado um mero ferramental de uso político.
Eu vi no Face
Aliás, temos ainda as páginas temáticas criadas no Facebook, páginas com “jornalistas” dos mais diferentes grupos extremistas – e até mediados, talvez – produzindo um “jornalismo de Facebook”, munindo pessoas de “informações” sobre política e resultando em usuários que acreditam estar se informando nesses ambientes. Informações que posteriormente são repassadas em seus respectivos ambientes pessoais, como família, trabalho e lazer. O “vi no Facebook” tem se alastrado como fonte jornalística, como verdade e como informação. As bolhas comprovadamente criadas na maior rede social do mundo estão contribuindo para um jornalismo deficiente.
É um ciclo vicioso. É a informação lida, comentada e compartilhada na rede. É a bolha no Facebook. É a bolha no jornalismo. Em tempos de pluralidade, estamos nos fechando e sendo fechados. Perdemos o senso crítico, mas não o da crítica, de criticar. Criticamos tudo e todos, mas acreditamos que se a Dilma cair Tiririca será presidente. Acreditamos em tudo na Globo, na Folha, na Veja, no Estadão, na Caros Amigos, na CartaCapital, na rede. Mais do que nunca, são tempos perigosos para uma nação, para a política, para o jornalismo. Sem jornalismo não há democracia. E sem democracia?
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Cleyton Carlos Torres é jornalista, mestrando MDCC pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, Unicamp, e editor do Mídia8!