Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

A imprensa adora esquecer

Articulistas embasbacados e desprovidos de qualquer senso crítico afirmaram nos quatro cantos do mundo que o Wikileaks mudava tudo. A diplomacia, a política internacional e o próprio jornalismo jamais seriam os mesmos.


O sucesso do site de vazamentos criado pelo hacker Julian Assange foi tamanho que dois dos três jornalões nacionais (a Folha de S.Paulo e O Globo) não se vexaram em pegar carona no grupo dos cinco veículos globais que a ele se associaram.


Exatos dois meses depois, nesta pátria dos modismos ninguém quer mais ouvir as fofocas com data de validade vencida. Prova disso são os documentos vazados na terça-feira (25/1) contendo a opinião da ex-presidente chilena Michelle Bachelet a respeito de governos e líderes latino-americanos.


Sobre a ex-colega argentina Cristina Kirchner, a chilena disse que ela ‘tende a acreditar nos rumores e textos caluniosos publicados na imprensa e faz comentários desastrosos em público’. Para ela, a democracia argentina ‘não é robusta e suas instituições são frágeis’.


Pouco destaque


A respeito do nosso país, Michelle Bachelet foi ainda mais incisiva: ‘O Brasil goza de uma fama desproporcionada como mediador em conflitos regionais’. Para ela, Lula é um zorro (raposa), inteligente e encantador, mas sua então candidata, Dilma Rousseff, distante e formal.


Publicadas com destaque pelo diário espanhol El País na quarta-feira (26), as candentes opiniões de Bachelet vazadas pelo Wikileaks ficaram de fora do noticiário de quinta-feira, no Brasil. A torneira giratória de Julian Assange já não tem charme, breve estará apenas nas colunas sociais.


A imprensa brasileira adora badalar e adora esquecer. Sobretudo as tragédias: duas semanas depois do maior desastre já acontecido no país, a tromba d’água na região serrana do Rio, há pelo menos dois dias só consegue produzir uma chamadinha na capa do Globo. Nos jornais da Paulicéia, nem isso.