Os jornais fazem a cobertura da campanha eleitoral com o pressuposto de que os leitores acreditam em sua isenção. Todos eles já publicaram notas e projetos especiais anunciando a determinação de produzir um jornalismo objetivo e equânime em relação aos principais candidatos, conforme seus posicionamentos nas pesquisas de intenção de voto.
No texto, tudo muito elogiável. Na prática, o que acontece é mais do mesmo e os favorecimentos de sempre.
Não há como escapar: a imprensa, de modo geral, é conservadora. Naturalmente conservadora, como o Vaticano, ou seja, com raras exceções, não se espere que, entre duas alternativas, o jornal escolha aquela que parece mais progressista.
A imprensa escolhe, recorrentemente, a alternativa que promete menos mudanças, menos surpresas e mais lealdade aos cânones que movem as empresas de comunicação. Um desses dogmas é a defesa do credo liberal segundo o qual o Estado deve se manter distante dos negócios.
Bem na foto
Assim, os principais jornais do país, aqueles que se supõem de circulação nacional, escolhem sempre, em qualquer instância, os candidatos que lhes parecem mais fiéis a esse credo liberal. No caso da disputa pela Presidência da República, os jornais parecem ter chegado à conclusão de que o candidato do PSDB, o ex-governador José Serra, tem esse perfil.
Com alguma sutileza, ou às vezes de maneira ostensiva, o noticiário sempre dá um jeitinho de colocar esse candidato em condição favorável na comparação com as duas adversárias que ele enfrenta.
Na série de entrevistas realizadas pelo Jornal Nacional, da Rede Globo, as análises publicadas pelos jornais nos dias seguintes procuraram destacar supostas deficiências e contradições das concorrentes de Serra. Na edição de quinta-feira (12/8), após a entrevista do candidato tucano, os destaques são suas supostas qualidades, como a frase em que ele critica o fisiologismo dos deputados federais e referências negativas a sua principal concorrente, a petista Dilma Rousseff.
Em todas as fotos, um candidato sorridente e seguro, ao contrário das imagens escolhidas nas entrevistas de Dilma e Marina Silva.
Chama atenção, na Folha de S.Paulo, mensagem postada no twitter pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson, comentando que a entrevista foi ‘mais amena’ com José Serra do que havia sido com os demais entrevistados. Segundo o ex-deputado, cassado em 2005 e com os direitos políticos suspensos por oito anos no caso chamado de ‘mensalão’, os apresentadores do Jornal Nacional ‘facilitaram’ para o seu candidato.
Independentemente da opinião do ex-parlamentar, pode-se fazer análises bastante acuradas dos verbos, adjetivos e frases escolhidos para descrever o desempenho de cada um dos candidatos no principal noticioso da televisão.
O tema central
Os mesmos critérios usados pelos jornais para descrever o que seriam características de segurança, postura, clareza e precisão nas respostas dos candidatos durante a entrevista podem ser aplicados na análise do noticiário produzido pelos jornais em cima das entrevistas e em torno das atividades dos candidatos.
Da mesma forma, os observadores podem exercitar essa análise nas escolhas de temas, títulos e textos dedicados ao noticiário geral sobre a campanha eleitoral.
Na quinta (12), por exemplo, os jornais voltam a falar dos programas de governo dos candidatos, destacando de alguma forma o pressuposto de que a candidata do PT é mais estatizante do que o candidato do PSDB.
Embora não haja qualquer garantia de que este ou aquele venha a aumentar ou reduzir o tamanho do Estado e sua ação na economia, os jornais sempre insinuam que, se Dilma Rousseff for eleita, ela poderia reestatizar as empresas que foram privatizadas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.
Pode-ser afirmar que essa é a questão principal, para a imprensa, nesta campanha eleitoral, como foi em algumas das anteriores. Para os jornais que são considerados os mais influentes do país, os problemas estariam resolvidos se o governo privatizasse tudo e oferecesse as reservas estratégicas à exploração do capital privado. Pouco importa o fato de ter sido o Estado, e não o capital privado, que manteve o Brasil seguro no meio da crise financeira que ainda abala o mundo.
A imprensa se apega a certas crenças e vive criticando o fanatismo religioso.