São Paulo não fica tão longe assim do Rio de Janeiro, nem o Rio é tão desimportante para o Brasil, a ponto de justificar a provinciana discrição com que O Estado chamou na primeira página a tragédia da Sexta-Feira Santa na Favela da Rocinha.
Está certo que não precisaria dar, como O Globo, uma manchete de duas linhas atravessando a página, em tipos enormes (‘Guerra do tráfico mata 5 e impõe terror na Zona Sul’).
Mas a chamadinha de 13 linhas, quase no pé da página, é de uma insensibilidade chocante. A Folha, pelo menos, deu ao caso o segundo título mais importante da página (‘Guerra do tráfico por favela do Rio mata 5’, em quatro colunas).
E se é para considerar o inferno iraquiano mais importante do que o banditismo carioca – o que faz sentido em jornais de outros estados –, manchete melhor é ‘Caos marca 1 ano da queda de Saddam’ (da Folha) do que ‘EUA recuperam Kut; rebeldes fazem mais reféns’ (do Estadão).
Os pingos nos iis do enriquecimento
Louve-se o colunista Nelson de Sá, da Folha, por ter lembrado em ‘Toda mídia’ que, já em 19 de dezembro, o repórter Ricardo Baltazar publicou no Valor uma matéria com todas as informações – menos as críticas americanas ecoadas em texto de primeira página do Washington Post do último dia 4 – sobre as inspeções da AIEA às instalações de enriquecimento de urânio em Resende.
E louvem-se o Estado e a Folha por terem cedido espaço a um dos maiores especialistas brasileiros em energia e política nuclear, o físico (e secretário do Meio Ambiente do governo paulista), José Goldemberg, para que implodisse a patriotada de que a finalidade das inspeções a que o governo resiste é desvendar os segredos tecnológicos do Brasil nessa matéria.
Pela simples razão de que ‘esses tais segredos são difundidos em muitos países hoje em dia’. Goldemberg lembrou que um consórcio europeu – cujo nome o repórter da Folha grafou Orenco, em vez de Urenco, Uranium Enrichment Corporation – usa a ‘tecnologia brasileira’ há pelo menos 15 anos. [Textos finalizados às 15h20 de 11/4/04]