O desempenho da Bolsa de Valores do Brasil, com uma elevação de quase 9% em três dias, volta a entusiasmar a imprensa. Ao fechar na quarta-feira (6/5) acima dos 50 mil pontos, segundo analistas citados pela imprensa, o mercado brasileiro de ações dá uma demonstração de pujança como não se via havia muito tempo e apresenta sinais de estabilidade muito antes do que se esperava.
O bom momento da Bovespa, segundo os jornais, se deve em parte a circunstâncias externas, mais precisamente ao desempenho da bolsa Nasdaq e à recuperação do índice Dow Jones, dois dos mais acreditados indicadores de valorização das empresas de capital aberto. Outro fator apontado pela imprensa foi a divulgação de uma Pesquisa Nacional de Emprego dos Estados Unidos, produzida por uma empresa privada de análise macroeconômica, que circulou no início do movimento na Bolsa brasileira, indicando um corte na oferta de postos de trabalho significativamente menor do que o número esperado pelo mercado.
Também são apontados como elementos positivos a sucessão de dados sobre a economia brasileira e a percepção generalizada de que a chamada gripe suína não deverá produzir a hecatombe anunciada.
Bom senso
O saldo da entrada de recursos estrangeiros no mercado brasileiro de ações se mantém positivo em abril, pelo terceiro mês consecutivo neste ano, o que, na percepção geral, indica que a economia nacional segue inspirando confiança.
Um elemento de informação que pode escapar dos leitores menos atentos é o fato de que o movimento do mercado de ações no Brasil é produzido por investidores de perfil mais agressivo, que estão dispostos a correr maiores riscos porque precisam demonstrar que seguem sendo competitivos.
O otimismo é saudável, mas cautela ainda continha sendo uma medida de bom senso. Afinal, faz bem pouco tempo que o comportamento festivo da imprensa especializada conduziu milhões de investidores a correr riscos excessivos.
Falta sustentabilidade
A classificação do mercado brasileiro como destino preferencial de investidores internacionais pode estar indicando que o Brasil se consolida como referência, junto com a China e a Índia, mas o cenário ainda é nebuloso.
Trata-se de um fato interessante, mas que não representa o comportamento típico do mercado. O risco de momentos como esse é o de que a imprensa volte a se encantar com as valorizações súbitas da Bolsa, introduzindo no imaginário coletivo a interpretação de que a crise se desvaneceu.
A rigor, não houve grandes mudanças no sistema global de negócios e o alívio constatado não significa necessariamente que a economia está livre da crise. Aliás, nenhuma das medidas anunciadas até aqui pelo governo brasileiro como resposta à crise financeira internacional representa mudança significativa no modelo econômico adotado na última década.
Se produziram estabilidade e crescimento nesse período, e, aliadas a programas sociais, fizeram surgir uma nova classe média, essas medidas ainda estão longe de representar uma estratégia voltada para a sustentabilidade. Essencialmente, trata-se de produzir obras de grande porte capazes de movimentar a economia e abrir mão de receitas tributárias para estimular o consumo.
Interpretação correta
Em alguns aspectos, as regras e as práticas do jogo econômico têm deixado em segundo plano questões fundamentais do desenvolvimento sustentável, como a defesa do patrimônio ambiental. Da mesma forma, a questão social não se consolida com obras de emergência.
A consolidação da nova classe média exige investimentos pesados e eficientes em educação, mas esse tipo de inversão não costuma produzir efeitos de curto prazo no caso de crises econômicas.
Entre o pessimismo que dominava o noticiário até poucas semanas atrás e o otimismo baseado em soluços da Bolsa de Valores, a imprensa precisa encontrar um ponto de equilíbrio capaz de produzir confiança no público.
Essa confiança se constrói com a interpretação correta dos acontecimentos.