Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Aconteceu na Venezuela

Entrevistado pela jornalista Maria Lydia no telejornal da TV Gazeta (14/7), o tucano Arnaldo Madeira respondia assim à questão sobre o que seria, para ele, opinião pública: ‘É a mídia (…)’.

A percepção de Madeira sintetiza a dos meios de comunicação brasileiros que acreditam, como acreditou e continua acreditando a mídia venezuelana, que jornais, revistas, rádios e televisões de grande porte e renome têm como manipular a opinião pública de acordo com as opiniões deles.

As meias-verdades e mentiras inteiras que vêm sendo contadas pelos meios de comunicação aos brasileiros, como aconteceu na Venezuela, em lugar de pararem de ser difundidas passaram a ter veiculação intensificada justamente por inicialmente não terem atingido seu intento da mesma forma (vide pesquisa CNT-Sensus sobre a popularidade de Lula).

No limite do desespero

Aconteceu na Venezuela e começo a temer que esteja acontecendo de forma espantosamente parecida no Brasil. Chávez começou a tomar o mesmo tipo de medida que tem tomado o governo Lula. Começou a prender gente rica que delinqüia, como delinquiram os donos da Schincariol e sua sonegation e a dona da Daslu, que pratica a mesma benemerência social que qualquer traficante de drogas em favela do Rio. E aí começou a encrenca…

Inicialmente, começaram a pulular ‘denúncias’ sem provas contra o governo Chávez e contra o presidente, endossadas e incessantemente difundidas pelos meios de comunicação venezuelanos. Qualquer acusação contra Chávez ganhava ares de veracidade e, portanto, grande publicidade. Logo em seguida, as pesquisas de opinião começaram a ser falsificadas. Essas pesquisas falsas começaram a ser veiculadas dando conta de que a maioria esmagadora dos venezuelanos ‘odeia’ Chávez. E, finalmente, nada do que era negativo aos adversários dele passou a prosperar na mídia.

Claro que aqui ainda não chegamos ao ponto de as pesquisas começarem a ser falsificadas. Mas duvido, pela insistência da mídia em distorcer e ocultar fatos (vide o Jornal Nacional, que simplesmente decidiu que seu público não precisava saber da pesquisa que mostrou que a popularidade de Lula permanece intocada apesar das denúncias contra seu governo), que pesquisas favoráveis ao governo e/ou contra seus adversários continuem sendo veiculadas. E ainda suspeito de que, no limite do desespero midiático, pesquisas poderão começar também a ser fraudadas no Brasil.

População instigada

Mas voltemos à Venezuela. Num segundo momento, a população pobre e majoritária que apoiava Chávez começou a se revoltar contra a minoria de elite que teimava em afrontar o país com mentiras nos meios de comunicação. Enfrentamentos de partidários dos dois lados começaram então a brotar cada vez mais violentos e irracionais. E então gente começou a morrer…

Seguiu-se a esse clima uma tentativa fracassada de golpe de Estado, em que Daslus e Schincariois venezuelanos tomaram o poder e, como primeira medida, fecharam o Congresso. O povo, porém, sempre silencioso e calado pela imprensa, afluiu à rua gritando, bradando, exigindo a volta de seu presidente. Vieram em motos, bicicletas, a pé e até em cadeiras-de-roda e muletas. Pardos, desdentados, alguns maltrapilhos, fizeram valer a democracia e os votos que deram àquele que entendiam que os estava honrando. E então exigiram que o presidente constitucional de seu país lhes fosse devolvido.

Mas a mídia venezuelana, como a brasileira, não aceita, não aceitou que o país continuasse trilhando o caminho da distribuição de renda e do fim dos privilégios de poucos. Então continuou instigando a população a todo tipo de ação irracional, intolerante e até violenta. Assim, não tendo mais como derrubar o governo pela via do golpe de Estado, tentou sabotar o próprio país incitando uma greve na companhia petrolífera estatal venezuelana, a PDVSA, que constitui a maior fonte de divisas da Venezuela. Resultado: recessão e mais violência. Não deu certo. Chávez tinha o povo. Então conseguiu sufocar a greve, substituindo os grevistas.

In loco

Como tentativa desesperada de colocar fim ao justiçamento social promovido por Chávez, a mídia venezuelana começou a pregar o caminho da derrubada constitucional do governo com um mecanismo que esse mesmo governo fez inserir na Constituição, o do referendo revogatório do mandato do presidente da República com um número mínimo de assinaturas da população. Na reta final da campanha do referendo disputada entre governo e oposição, aconteceu um prodígio: de repente, os índices de popularidade de Chávez, detectados pelas pesquisas, começaram a explodir. Para encurtar a história, Chávez venceu o plebiscito de lavada. Ressalte-se: a lisura do pleito foi referendada por montes de observadores internacionais, entre os quais o insuspeito ex-presidente americano Jimmy Carter.

No Brasil, um dado das pesquisas sobre a popularidade de Lula e de seu governo não tem sido exposto corretamente à opinião pública. Poucos sabem que essa popularidade, que vem se mostrando cada vez mais firme, provém das classes C, D e E. Os mais pobres, beneficiários dos programas sociais de Lula que a mídia diz serem um ‘fracasso’, estão apoiando o presidente porque os programas ‘fracassados’ dele estão fazendo diferença. Algo que para a classe média que a mídia conseguiu colocar contra Lula é difícil de comprovar, porque esse estrato social está extremamente distante (inclusive conceitualmente) das classes ‘inferiores’ que o apóiam.

Sei que este texto é considerado ‘subversivo’ e por isso é virtualmente impossível que venha a ganhar maior visibilidade para a sociedade. Mas a todos os que o lerem imploro que reflitam sobre seu conteúdo e que, se virem em minhas palavras alguma coerência, que as difundam a tantos quantos puderem. Eu vi o que aconteceu na Venezuela (in loco) e tremo só de pensar que possa acontecer o mesmo por aqui.

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Comerciante, São Paulo