Pouco tempo atrás, a emissora de TV pan-arábica Al-Jazira, com sede no Catar, era desprezada em Washington. Considerada o órgão oficial de Osama bin Laden por levar ao ar seus pronunciamentos antiamericanos, a rede passou a ser acompanhada na Casa Branca, em busca de uma cobertura confiável dos fatos durante a crise no mundo árabe. A transmissão dos confrontos feita pela Al-Jazira valeu-lhe o ódio do presidente líbio, Muamar Kadafi, e derrubou o presidente egípcio Hosni Mubarak. Outros governantes sitiados na região também sentiram o calor dos holofotes. A cobertura atrai cada vez mais elogios nos EUA.
‘A audiência da Al-Jazira está aumentando nos EUA porque a emissora traz notícias de verdade’, disse a secretária de Estado Hillary Clinton à Comissão de Relações Exteriores do Congresso no início do mês. ‘Talvez o espectador não concorde com aquilo que é exibido, mas se tem a sensação de estar recebendo notícias continuamente em lugar de milhões de comerciais e programas de debates, características de nossos canais de notícias, que não informam muito o público americano, e menos ainda a audiência estrangeira.’
Espaço na TV a cabo dos EUA
Muitos analistas da mídia e especialistas em política acreditam que a Al-Jazira esteja vivendo seu ‘momento CNN’, conforme a cobertura dos levantes impulsiona a emissora a uma posição de destaque nos EUA, assim como ocorreu com a cobertura contínua da CNN durante a Guerra do Golfo, em 1991. A emissora de Atlanta afastou de vez sua imagem de noticiário amador e foi reconhecida como força respeitada no jornalismo. ‘As revoluções na Tunísia e no Egito poderiam ser chamadas de revoluções da Al-Jazira’, disse Dave Marash, jornalista veterano que trabalhou na edição em inglês da emissora árabe.
A rede tenta agora ganhar espaço na TV a cabo dos EUA. A emissora se envolveu em negociações com a Cablevision, a Dish Network, a Time Warner Cable e, mais recentemente, a Comcast, na tentativa de ser incluída em seus pacotes de canais a cabo.
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Poderosa formadora de opinião
Quando os levantes começaram no mundo árabe, a emissora pública KCET, de Los Angeles, decidiu passar o programa MHZ Worldview – noticiário da Al-Jazira antes transmitido somente no canal digital – para seu canal principal. Representantes da rede americana disseram que o noticiário tem feito sucesso desde então. De acordo com Bret Marcus, diretor chefe de conteúdo da emissora, entre 7 de fevereiro e 4 de março a audiência do noticiário da Al-Jazira transmitido às 18h30 aumentou 450%, atraindo cerca de 100 mil espectadores.
Também é possível assistir diariamente aos noticiários árabes na Link TV, emissora independente disponível principalmente nos sistemas DirectTV. Outra opção para os americanos é assistir ao canal em inglês diretamente a partir do site, ao vivo. Mas a aparente limitação ao acesso não impediu que a Al-Jazira fosse elogiada por sua cobertura. ‘A rede mostrou à mídia global como se cobre um levante popular – indo de encontro ao olho do furacão com as câmeras ligadas, ao mesmo tempo testemunhando e catalisando os acontecimentos’, dizia um texto publicado na edição de março/abril da Columbia Journalism Review.
Às vezes, a rede se aproxima demais da ação. O cinegrafista Ali Hassan al-Jaber, do Catar, morreu no início do mês quando seu carro foi alvejado na Líbia perto da cidade de Benghazi, controlada pelos rebeldes. Representantes da Al-Jazira disseram que 20 homens armados invadiram seus escritórios no Iêmen na semana passada, e confiscaram os equipamentos de transmissão.
Alguns analistas da mídia dizem que a ascensão da Al-Jazira pode ser associada ao declínio da cobertura internacional feita pelos canais de notícias da TV americana. Com a redução da audiência, as redes americanas fecharam suas sucursais no exterior para poupar dinheiro, valendo-se de vídeos comprados de emissoras estrangeiras ou de profissionais freelancers. O reconhecimento de hoje difere muito da opinião desfavorável que muitos americanos faziam da Al-Jazira durante a presidência de George W. Bush. Segundo a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, a imagem dos EUA transmitida pela emissora é de importância vital, pois ele se tornou uma poderosa formadora de opinião no Oriente Médio. ‘Além disso, a rede é eficaz, quer gostemos dela ou não’, acrescentou.