Little Rock, capital de Arkansas (EUA), é, à primeira vista, candidata improvável a inventar modelos visionários para o mundo dos grandes jornais: tem menos de 200 mil pessoas espalhadas por uma grande área verde cortada por um rio.
Mas é de lá que o publisher Walter E. Hussman Jr. vem convencendo o país de que seu estilo de liderança no diário Arkansas Democrat-Gazette – foco no jornal impresso, investimento na equipe e cobrança de acesso ao site do jornal – pode ser o caminho para a superação da crise da indústria de mídia norte-americana.
Seu mote é simples: proteger o valor do produto. ‘Não faz sentido dar notícias de graça de um lado e esperar que paguem pela mesma coisa depois’, disse à Folha.
A ideia chocou muitos ao ser implementada, no fim de 2001, quando era quase obrigatório oferecer conteúdo grátis na internet. Hussman determinou que quem não assinasse o jornal teria de pagar taxa mensal ou diária para acesso irrestrito a seu site.
‘Inicialmente os leitores ficaram irados’, afirmou o publisher. ‘Ligavam sem parar para reclamar. Colocamos um gerente para falar com todos e explicar que não sabemos como sobreviver gastando US$ 10 milhões por ano na produção de notícias e entregar depois de graça.’
O empresário teve de suportar também o escárnio de outros publishers. Mas, contra todas as apostas, a estratégia deu certo.
Enquanto assistia ao declínio da indústria ao seu redor, o Democrat-Gazette se tornou aberração ao ver a circulação aumentar entre 1998 e 2008 – de 173.316 para 176.275 na média diária.
Mesmo a crise financeira global não teve impacto tão dramático. Enquanto boa parte do setor perdeu até 30% dos assinantes, o Democrat-Gazette manteve, até setembro, 169.458 cópias diárias na semana e 258.160 aos domingos.
Cortes de funcionários foram limitados a menos de 10% depois do início da recessão no país. O grupo que controla o New York Times, por exemplo, cortou 20% no ano passado.
Receita
O Arkansas Democrat-Gazette não obtém nem 1% de sua receita com a cobrança no site. O objetivo do modelo é manter os assinantes do jornal impresso, que gera 95% da receita do grupo.
Mas boa parte da indústria mantém o ceticismo.
‘Acho que [Hussman] tem uma visão míope do futuro da indústria’, disse Shafqat Islam, consultor de estratégia on-line para jornais. ‘Está sacrificando sucesso futuro em favor de lucros rápidos baseados em um produto que está morrendo.’
Apesar de ser parte de uma minoria, Hussman é estudado com crescente atenção. Em 2008, foi eleito ‘publisher do ano’ pela publicação Editor & Publisher.
Os figurões em Nova York e Londres começam a concordar. O Financial Times e o Wall Street Journal já têm sistemas de cobrança por acesso na internet; o New York Times dará início ao seu em janeiro.
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Família comprou seu primeiro diário em 1909
Nadar contra a maré e comprar brigas não são novidades para Walter Hussman Jr. Foi assim, e deixando inimigos pelo caminho, que ele começou sua carreira.
Hussman deixou Nova York, onde foi repórter da revista Forbes, para ajudar o pai a tocar seus jornais no início dos anos 1970, em Little Rock. Em 1974, compraram o conservador Arkansas Democrat e iniciaram guerra de 17 anos ao rival esquerdista Arkansas Gazette.
As armas escolhidas foram incomuns: o Democrat parou de cobrar por classificados e contratou mais repórteres. Venceu. Os dois foram fundidos em 1991, criando o Democrat-Gazette. Mas só uma parte ínfima da redação do perdedor foi mantida.
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Hussman continuou a expandir os negócios. Hoje controla 12 diários e distribui canais de TV a cabo.Republicano, conta que seu avô comprou o primeiro jornal da família no Texas em 1909, durante sua lua de mel.O conservadorismo, porém, é vencido pela ambição. Diz que será o primeiro a trocar o jornal impresso pela web quando esta der lucros.