A imprensa brasileira segue discutindo de forma pouco esclarecedora o momento econômico, em especial no que se refere ao verdadeiro estado da inflação, às perspectivas de continuidade do crescimento econômico e sua vinculação com a questão agrícola.
As notícias e análises justificando a versão de que o crescimento do consumo é a principal causa do aumento de preços se chocam com dados apresentados pelos mesmos jornais sobre o crescimento da produção de alimentos.
O leitor de jornais que prestou atenção aos números apresentados nos últimos dias ficou sabendo, por exemplo, que os níveis de produção agrícola, em alguns casos, e da indústria em geral, subiram mais de 40% no último ano.
Da mesma forma, tem sido noticiado que também se eleva o nível de consumo, pela agregação de milhões de famílias à nova classe de renda média, apesar dos juros mais elevados como parte das medidas de contenção tomadas pelo governo.
Investimentos e capacidade produtiva
Esses números não são conflitantes, mas deixam um espaço a ser mais esclarecido, quando são vinculados ao aumento de preços. Além disso, noticiar como fator negativo o aumento do consumo de alimentos por famílias que foram promovidas socialmente equivale a desvincular a economia da sociedade.
É certo, segundo o que tem sido publicado, que em alguns setores, como o de eletrônicos, que tem atraído o desejo da chamada nova classe média, as vendas têm crescido acima da capacidade da indústria, mas a imprensa não tem associado ao tema os dados referentes a importações, que seguem estimuladas pelo baixo valor do dólar frente ao real.
Apesar do retrato incompleto, os jornais insistem que, no cenário geral, o Brasil continua a sofrer um descompasso entre o crescimento da demanda interna por produtos e serviços e a oferta. Mas, ao mesmo tempo, são noticiadas as decisões de investimentos da indústria sem que se faça uma relação entre esse detalhe específico e a questão da maturação desses investimentos e da capacidade futura do setor produtivo de atender a essa demanda crescente.
Esclarecedor e didático
A recente decisão do Copom de aumentar a taxa Selic de juros para 13% ao ano, segundo especialistas citados pela imprensa, é o ponto central da tática do governo para fazer com que a inflação volte para o ponto médio de 4,5% já no ano que vem. Esse foi um dos propósitos apresentados pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, durante debate de que participou, na Fundação Getulio Vargas, em São Paulo, há cerca de dez dias.
Os jornais dos dias seguintes buscaram questionar a estratégia do governo, praticamente cobrando uma decisão sobre uma possível elevação da meta de superávit primário, o que poderia sinalizar uma expectativa menos otimista quanto à capacidade da economia nacional de superar o risco inflacionário em médio prazo.
Se o aumento dos juros tem o objetivo de desestimular compras a prazo, endividamento e pressões do consumo sobre os preços, a imprensa seria muito útil se oferecesse um quadro compreensível, esclarecedor e didático que ajudasse o cidadão a refletir melhor na hora de decidir o que fazer com o aumento de renda que lhe caiu nos bolsos.
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Jornalista