Esqueça a ética e a imparcialidade. Pode dar adeus, também, ao bom senso. Afinal, antes de tudo, você é um torcedor brasileiro. Se os editores responsáveis pela capa de grande parte dos jornais nacionais dessem uma aula de como elaborar uma primeira página no último 9 de julho, com certeza essas dicas ganhariam ênfase especial.
Não foi um dia qualquer. Como bem sugeriu o Hora de Santa Catarina, o dia seguinte à amarga derrota da Seleção brasileira para a Alemanha na Copa que sediamos poderia ser chamado de “Quarta-feira de cinzas”. Realmente, os sete gols que levamos geraram um misto de frustração, vergonha e indignação. Porém, o que se viu no dia 9 mostrou a enorme capacidade da imprensa brasileira de não conseguir separar as coisas, enfatizando a máxima de que o futebol é mesmo uma paixão nacional. O negócio acabou, realmente, indo para o lado pessoal.
Se a escolha pela cor preta define bem o sentimento de luto que a torcida brasileira sentiu naquela quarta-feira, muitos foram os jornais que optaram por ela para cobrir suas capas. Uma das mais ousadas foi a do jornal Meia Hora, do Rio, que destacou a frase “Não vai ter capa” – fazendo um trocadilho com o famoso bordão “Não vai ter copa” – e justificou que os editores estavam abalados demais para pensar noutra opção de primeira página. Na contramão, o Lance deixou a capa em branco e sugeriu que os próprios leitores escrevessem nela o que sentiam após o fracasso da Seleção brasileira. Indignação, revolta, pena e frustração foram algumas das sugestões deixadas pela publicação.
Uma sacada interessante e criativa
Houve quem optasse apenas por palavras únicas de impacto em letras garrafais, como fiasco, vexame, ressaca. O Diário do Nordeste ainda destacou os números que ninguém conseguirá esquecer por um bom tempo: “Humilhação, 7 x 1”. E, logo após: “Foi duro. O placar diz mais que qualquer texto”. O Correio do Povo, de Porto Alegre, resumiu: “1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 x 1. Foi isso”.
O jornal NH conseguiu ser solidário com o nosso camisa 12. Mostrando o goleiro Julio César sentado, atonitamente, o periódico estampou na capa a frase: “Dizer o quê?”. E complementou: “Coitado, não teve o que fazer”. Já o Diário Gáucho desabafou: “6 era sonho. 7 é pesadelo”.
Dentre todos os veículos que aproveitaram para chutar o balde e colocar o sentimento de revolta na frente de qualquer princípio editorial, O Dia, certamente, foi destaque. “Vá pro inferno você, Felipão”, imprimiu, com fúria, a publicação na capa. “Ele ganha cerca de R$ 1 milhão por mês, é o maior garoto-propaganda do país, não treinou, escalou mal e substituiu errado. Foi responsável pela pior humilhação da Seleção em mais de um século de história. Semana passada, questionado sobre suas atitudes, ele disse: ‘Vou fazer do meu jeito. Gostou, gostou. Quem não gostou, vá pro inferno’”, concluiu.
Mas foi justamente desmistificando a que se considerava a nossa pior derrota como país-sede de um Mundial que o Extra e o Diário de Pernambuco conseguiram se diferenciar dos colegas. As alfinetadas à atual equipe, é claro, não ficaram de lado. Entretanto, o reconhecimento à Seleção de 1950 foi uma sacada interessante e criativa, que acabou virando homenagem. “Parabéns aos vice-campeões de 1950, que sempre foram acusados de dar o maior vexame do futebol brasileiro. Ontem, conhecemos o que é vexame de verdade”, disse o Extra. O Diário de Pernambuco optou pela frase “Barbosa, descanse em paz”, uma alusão à injusta culpa que o goleiro do Brasil na ocasião, Moacir Barbosa Nascimento, carregou até mesmo depois de sua morte, em 2000, por ter tomado dois gols do Uruguai em pleno Maracanã.
No mínimo, um bom material a ser discutido nos cursos de Jornalismo país afora.
******
Taís Brem é jornalista