Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Avaliação colaborativa de notícias sobre saúde

Febre amarela, aneurisma, vírus zika, SUS, câncer, dieta sem glúten, botox, protetor solar, homeopatia. Não há dia, nem veículo, que não tenha algum jornalista preparando uma matéria de saúde. Concorrem pela audiência, que já é fácil de medir, mas há uma pergunta que ainda deve de ser respondida. Como avaliar a qualidade de uma matéria de saúde?

A seleção se faz necessária. O Observatório da imprensa já mostrou exemplos de curadoria de notícias de saúde  feita por especialistas e ofereceu aos seus leitores bons exemplos de jornalismo cientifico. Agora, um projeto catalão disponibilizou na web uma base de dados de matérias selecionadas em saúde, ciência, tecnologia, médio ambiente. O interessante do projeto PerCienTex (Excelencia e innovación en el Periodismo Científico en España) é o método de seleção escolhido.

Diferentemente de outros programas de curadoria que tem uma equipe profissional que segue critérios rígidos (exemplo, Health News Review), ou uma seleção de avaliadores mas amplia e que seguem critérios pessoais como faz o projeto de curadoria do Observatório da Imprensa, neste caso a convocatória foi dirigida a “qualquer pessoa com formação científica, técnica ou humanista que tivesse interesse ou experiência em comunicação.

Porque este projeto é importante? Em primeiro lugar, porque ninguém o fez antes”, declaram os organizadores da Associació Catalana de Comunicació Cientifica. “Em segundo, porque fizemos a pesquisa pelo método de crowdsourcing, um cérebro coletivo, uma comunidade de leitores críticos e comprometidos que trabalha em conjunto. Em terceiro lugar, porque achamos mais boas práticas do que o esperado e donde não esperávamos”. Segundo eles, a escolha não pode se fazer sem ajuda dos leitores porque a definição de boa pratica é necessariamente o resultado de um consenso. “Se queremos aumentar a qualidade do jornalismo, é imprescindível aumentar a exigência dos leitores” acrescentam.

Os 40 voluntários receberam durante uma semana treinamento em jornalismo, leram exemplos de matérias modelo em jornalismo investigativo, jornalismo de dados, ou matérias escolhidas pela qualidade da narrativa ou pelo aproveitamento das novas narrativas. Depois, lhes foi dado uma guia sobre excelência, e tiveram oportunidade de aprofundar no significado dos critérios, que foram desenvolvidos a partir da literatura, os códigos de boas práticas no jornalismo e os critérios seguidos pelos grandes prêmios jornalísticos. O tempo todo, podiam discuti-los no grupo de Google com os colegas. Depois, leram as matérias de ciência do veículo que lhes foi indicado e selecionaram quais eram a seu critério as melhores matérias.

Os quesitos mínimos considerados foi que a noticia seja relevante e imparcial, respeite as regras deontológicas, compare fontes, seja legível e utilize corretamente as ferramentas digitais. Mas tudo isso foi considerado insuficiente para declarar a excelência, pois os voluntários precisavam ainda prestar atenção à diversidade de fontes. Cada veículo foi monitorado por, ao menos, dois voluntários, que durante o processo todo participaram em foros on line. No total, avaliaram o conteúdo de 14 veículos digitais de várias regiões espanholas, durante 11 semanas.

Cérebro coletivo.

Trabalhar em conjunto para melhorar o jornalismo científico em geral, e de saúde em particular, é tal vez a melhor lição que pode-se tirar do projeto. Aprimorar a qualidade pode ser uma tarefa conjunta mediada pela tecnologia e fora das empresas que pagam pelas matérias. Neste sentido, é bom acrescentar que tomei conhecimento deste projeto europeu por um grupo de jornalistas argentinos (a RADPC – Red Argentina de Periodismo Cientifico). Na ocasião, logo foi colocado no grupo de discussão, um outro jornalista mostrou para comparar um projeto americano, o Showcase .

O objetivo declarado do projeto PerCient Ex, foi encontrar e mostrar exemplos de boas práticas no jornalismo científico para inspirar outros jornalistas, especialmente os jovens, e melhorar a profissão. “Na Espanha,  tentaremos fazer uma segunda edição neste ano, se tivermos financiamento. Não temos conhecimento que tenha sido feito ou mesmo esteja programada uma experiência similar em outros países”, respondeu por e.mail a pesquisadora principal, Esther Marin, a uma pergunta do OI.

Jornalistas conectados em rede, funcionando de forma independente das empresas que os contratam, podem ser uma maneira de aperfeiçoar os produtos jornalísticos. Uma maneira barata, e que possivelmente resista melhor as crises.

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Roxana Tabakman é  bióloga, jornalista, autora de “A saúde na mídia, Medicina para jornalistas, jornalismo para médicos” e participante da Red Argentina de Periodismo Científico (RADPC).