Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A banalização do absurdo

Quando eu era adolescente e almejava seguir a profissão de jornalista, achava que um texto impresso em folha de jornal era sagrado, não podia ter erro nenhum, seja de concordância, de digitação, o que fosse. Achava o cúmulo alguém da linha de produção de um jornal, que era lido por tantas pessoas, deixar escapar falhas no texto, que é o sentido pelo qual aquele produto foi feito. Afinal, para se entender uma notícia, é fundamental que ela seja bem redigida.

Depois que me tornei jornalista, sempre tomei muito cuidado ao escrever, ainda que tenha me deparado com a realidade da linha de produção dos veículos de comunicação, que é cruel. Mas, exatamente por isso, acreditava eu, era necessário que os redatores dominassem a língua portuguesa e tomassem o cuidado de reler com atenção seu texto pelo menos uma vez antes de passá-lo para frente. Assim, facilitariam a vida do revisor ou não o entregariam com falhas ao diagramador, caso não houvesse alguém para revisar.

No período de 14 anos em que trabalhei em jornais diários, quantas vezes não briguei com editores e diagramadores porque queria dar mais uma “lidinha” antes de entregar minhas matérias. E olha que eu era rápido, não comprometia o andamento dos trabalhos. Mas a presteza necessária ao ofício foi aumentando ao longo dos anos, ainda mais quando veio a internet e a necessidade de “furar” os concorrentes, publicando a notícia o mais rápido possível.

Claro que já falhei, como todo mundo. Mas as falhas me causavam uma onda de calor nas faces, me deixavam com as pernas moles de vergonha. Fui aprendendo a me perdoar, mas, eu comigo mesmo, sempre praguejei bastante quando elas aconteceram.

Hoje em dia, é muito comum ler matérias de jornais com erros de digitação ou palavras faltando no título, falta de concordância verbal no subtítulo e com frases inteiras que não fazem absolutamente nenhum sentido. Acontece todos os dias, em praticamente todos os veículos de comunicação, impressos ou não.

O meu medo é que a precarização da mão de obra e o consequente desprezo pela língua portuguesa (sem falar na falta de compromisso com a verdade, mas esse é outro assunto) que se vê hoje nas redações chegue ao ponto de rivalizar com os absurdos gramaticais encontrados nas redes sociais. E todo mundo achar normal.

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Roberto Schiavon é jornalista na cidade de Araraquara, interior de São Paulo.