Não dá para concordar com a decisão do Ministério da Justiça em adiar por 90 dias a obrigação de adequação da programação de TV aos fusos horários do país. Está claro que a implementação dessa medida é essencial para a plena efetividade das regras de classificação indicativa por faixa etária, e sua postergação prejudica diretamente crianças e adolescentes das regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil. O adiamento, ocorrido horas antes do dia 9 de janeiro (data prevista para a medida entrar em rigor), foi feito sem diálogo com os setores que vinham participando dos debates sobre a classificação indicativa e sem que houvesse motivos justificados para isso.
Em nota divulgada no próprio dia 9, o ministro Tarso Genro declarou que ‘a decisão do Ministério da Justiça foi uma resposta aos pedidos de parlamentares e de entidades representativas das emissoras das regiões com fuso horário diferente ao de Brasília, que alegam dificuldades financeiras das emissoras regionais na aquisição de equipamentos e contratação de mão-de-obra para fazer as modificações técnicas necessárias ao cumprimento do fuso horário’. Entretanto, as emissoras tiveram 180 dias para se adequar às novas regras, e devem à sociedade e ao governo respostas sobre o que foi efetivamente feito ao longo desse período para se adequar à medida e quais são, concretamente, as dificuldades técnicas e financeiras para sua implementação.
Falta explicar
Há ainda outra questão a se esclarecer. Segundo reportagem do jornal Folha de S.Paulo (9/1), SBT, Record e Bandeirantes estavam prontas para se adequar às novas regras. Aparentemente, a emissora que mais defendeu o adiamento foi a Rede Globo, justamente a de maior faturamento no país. Esse fato leva a crer que os interesses comerciais na veiculação do programa Big Brother, que seriam diretamente prejudicados pela medida, prevaleceram em relação ao interesse público de adequação da programação ao fuso horário do país. Sem esclarecimentos públicos a essas questões, o adiamento torna-se injustificável.
É constrangedora a decisão do Ministério da Justiça de acatar o pedido de adiamento de uma regra legal, às vésperas de sua entrada em vigor, justamente por aqueles que teriam que se adequar a ela. Na nota divulgada, o ministro Tarso Genro declarou que a implementação da medida trazia o risco de ‘causar desestruturação às emissoras regionais, o que poderia ser confundido com algum tipo de censura ao direito à informação’, antes de afirmar que ‘este é o prazo final e não será mais prorrogado’.
Não há qualquer possibilidade de que a entrada em vigor dessa norma legal seja confundida com censura. É absolutamente legítima a determinação do próprio Ministério da Justiça, expressa na portaria 1220/07, de vinculação da classificação indicativa ao horário de exibição dos programas, com respeito ao fuso horário brasileiro. O que precisa ser explicado é o adiamento da regra, e não a sua aplicação. Sobre a decisão do Ministério da Justiça, só nos resta lamentar e esperar que o novo prazo seja de fato cumprido, sem adiamento.
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Do Observatório do Direito à Comunicação