Saturday, 30 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Cobertura em zonas de alto risco

Foi um aniversário sem bolo nem festa. No dia 30 de dezembro, fez 365 dias que Hervé Ghesquière, 47 anos, e Stéphane Taponier, 46 anos, jornalistas da televisão francesa, estão nas mãos dos talibãs. A data detonou novamente o debate sobre o envio de jornalistas a países de alto risco.

O primeiro aniversário do sequestro dos dois jornalistas no Afeganistão teve discursos diante da prefeitura de Paris, fotos dos dois projetadas no Arco do Triunfo pela organização Repórteres sem Fronteiras e reuniões diante das prefeituras de diversas cidades francesas. A projeção das fotos no Arco do Triunfo foi feita sem autorização das autoridades, uma forma de lembrar que o povo francês espera impaciente e insubmisso a libertação dos jornalistas.

As manifestações em toda a França eram um recado ao Quai d´Orsay: a sociedade francesa quer a libertação dos sequestrados custe quanto custar. A madrinha do comitê responsável pelas ações é a jornalista Florence Aubenas, que como enviada especial pelo jornal Libération a Bagdá ficou cinco meses sequestrada, em 2005, e foi libertada por uma soma nunca revelada pelas autoridades.

Negociações sigilosas

Antes de Florence Aubenas, os jornalistas Christian Chesnot e Georges Malbrunot foram capturados em 20 de agosto de 2004, pelo Exército Islâmico no Iraque, juntamente com o chofer sírio Mohamed Al-Joundi. Os sequestradores deram um ultimato ao governo francês: anular a lei sobre a laicidade (proibição do véu islâmico) em 48 horas para que eles fossem libertados. O país se mobilizou para pedir às autoridades que as negociações fossem rapidamente concluídas. Eles foram libertados depois de 124 dias de captura. Mais uma vez, silêncio total sobre o custo da libertação dos jornalistas, já que a lei nunca foi posta em questão.

To go or not to go? Os jornais têm o direito de mandar correspondentes para zonas de guerra pondo em risco a vida de profissionais? O sequestro de um jornalista é um acidente de trabalho ou culpa de ‘imprudentes’? Quanto vale a vida de um jornalista? E quanto vale a vida de um jornalista refém?

Todas essas perguntas voltaram à tona com o aniversário do sequestro de Hervé Ghesquière e Stéphane Taponier.

Como as negociações são tratadas como secret défense, o equivalente de top secret, não saberemos nunca quanto os talibãs estão exigindo, por que os jornalistas não foram até hoje libertados e, quando o forem, quanto foi pago. Há boatos de que os talibãs exigem, além de dólares, a libertação de prisioneiros detidos pelas potências ocidentais.

A última prova de vida

Depois de qualificar Ghesquière e Taponier de ‘irresponsáveis’ por terem ido buscar informações ‘espetaculares e inúteis’ no Afeganistão, o general Jean-Louis Georgelin, chefe do Estado-Maior das três armas, chegou a mencionar numa entrevista em fevereiro a cifra de ‘mais de 10 milhões de euros’ exigidos pelos talibãs para libertar os prisioneiros. Segundo ele, quem vai pagar, se houver acordo nesse sentido, é o Estado francês – ou seja, o contribuinte. Além do mais, os ‘imprudentes’ mobilizam homens armados e recursos que deveriam estar dirigidos para o combate contra os terroristas (que são vistos por parte da população como resistentes). O Palácio do Eliseu também condenou os ‘imprudentes’ por intermédio do secretário-geral da Presidência da República. Como se os repórteres tivessem ido a Cabul para fugir da monotonia de Paris!

A última prova de vida dos jornalistas chegou a Paris poucos dias antes do aniversário do sequestro. As famílias foram recebidas no Quai d´Orsay para ver o vídeo e serem informadas das negociações. O máximo que puderam saber é que ‘tudo está sendo feito para a libertação’ em breve.

Havia cansaço nas vozes dos familiares que falaram à imprensa.

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Jornalista