Concurso de charges sobre o Holocausto, promovido pelo jornal iraniano Hamshahri em retaliação à publicação de desenhos do profeta Maomé, foi duramente criticado por governos Ocidentais e organizações judaicas. O jornal de Teerã, um dos cinco principais títulos do país, voltou a defender sua iniciativa e afirmou que ela tem como objetivo testar os limites da liberdade de expressão tão apoiada pelos países Ocidentais. ‘Nós não queremos gozar ninguém com a competição; só queremos levantar uma questão para encontrar uma resposta que é muito importante para nós’, completou Mohammadreza Zaeri, publisher do Hamshahri.
O concurso, que terá inscrições abertas até maio, já causa polêmica. A primeira charge submetida, e reproduzida por veículos de diversos países, foi atribuída ao prestigiado desenhista australiano Michael Leunig.
A charge é dividida em dois quadros. No primeiro, um homem com um desenho da Estrela de Davi nas costas caminha em direção ao campo de concentração de Auschwitz em 1942. Na entrada, lê-se a inscrição ‘o trabalho traz a paz’. No segundo quadro, o mesmo homem carrega um rifle ao caminhar em direção a um portão em Israel, em 2002, com a inscrição ‘a guerra traz a paz’ na entrada. O desenho, realmente de autoria de Leunig, foi rejeitado em 2002 pelo então editor do jornal australiano The Age por ‘ultrapassar os limites’ impostos por ele para o debate sobre o Oriente Médio.
Leunig afirma, entretanto, que não submeteu a charge ao concurso. Em um sítio iraniano, foram publicadas citações atribuídas ao desenhista, onde ele afirmaria que havia contribuído para ‘expressar solidariedade ao mundo Islâmico’. ‘Essas não são minhas palavras’, protestou Leunig, que se disse satisfeito quando seu desenho foi retirado do sítio do concurso.
Homens-bomba em desenho alemão
E como a confusão parece não ter fim, o jornal alemão Der Tagesspiegel publicou na semana passada uma charge onde representa jogadores do time de futebol iraniano vestidos como homens-bomba. No desenho, quatro jogadores são mostrados com explosivos amarrados ao peito. A legenda diz: ‘Por que o exército alemão deveria ser usado durante a Copa do Mundo’.
O Irã é um dos 32 países classificados para a Copa deste ano, sediada na Alemanha entre junho e julho. A embaixada iraniana em Berlim exigiu um pedido de desculpas, afirmando que o desenho é ‘um ato imoral’.
Malte Lehming, editor do Der Tagesspiegel, afirmou que a caricatura era voltada ‘ao público alemão’. Perguntado se sua publicação havia sido imprudente, ele afirmou: ‘O problema é onde estabelecemos um limite? Cartuns devem ser satíricos e maus. Sentimos muito se ferimos os sentimentos de iranianos. Mas não pedimos desculpas’. O cartunista responsável pelo desenho, Klaus Stuttmann, recebeu três ameaças de morte.
Em uma entrevista publicada pelo jornal esta semana, ele afirma que não teve como objetivo ofender o Irã, e sim estava tentando fazer uma ironia. ‘Eu sou contra soldados serem usados na Copa do Mundo e tentei expressar que acho essa sugestão absurda. Não vejo os iranianos como homens-bomba, e eles não o são. Pelo contrário, eles são esportistas como outros esportistas’, completou.
Mais dois mortos em protestos
Os protestos violentos pela publicação das charges de Maomé e contra o Ocidente continuaram esta semana. Milhares de manifestantes no Paquistão, em Islamabad e Lahore, incendiaram lojas de redes multinacionais como McDonalds e Kentucky Fried Chicken na terça-feira (14/2). Centenas de carros foram danificados e um retrato do presidente do país, general Pervez Musharraf, que é pró-ocidente, foi destruído. Duas pessoas morreram. No Irã, manifestantes lançaram bombas de gasolina e pedras nas embaixadas britânica e alemã no Teerã. Com informações da Associated Press [14/2/06], Reuters [14/2/06], AFP [15/2/06] e Luke Harding, Declan Walsh e Robert Tait [The Guardian, 15/2/06].