Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Crise afeta cobertura das viagens de Obama

A mídia noticiosa descobriu uma nova área de cobertura para o corte de despesas: o presidente dos Estados Unidos. Durante décadas, era um dado que sempre que o presidente viajava, um voo charter repleto de membros da imprensa o acompanharia. Mas os voos da imprensa têm sido fortemente reduzidos nos últimos meses, vítimas do corte de despesas de empresas de mídia no seu esforço para permanecer lucrativas.

Por causa disso, menos repórteres estão acompanhando o presidente Barack Obama e seus assessores, limitando o número de fontes noticiosas num momento em que os americanos estão agudamente interessados nas políticas e personalidades da Casa Branca.

‘A razão exclusiva é dinheiro’, disse Edwin Chen, o veterano correspondente da Bloomberg News na Casa Branca e presidente da Associação de Correspondentes na Casa Branca, que considera os cortes alarmantes.

Os cortes orçamentários – por organizações noticiosas tão variadas como USA Today e ABC News – estão atingindo a cobertura da Casa Branca, tradicionalmente o principal alvo das sucursais de notícias em Washington. Esse é o mais recente sinal de recuo, anos depois de muitos jornais regionais deixarem de designar repórteres para a Casa Branca.

Agora, até as grandes redes estão sendo pressionadas.

‘Estou buscando dia após dia novas maneiras de cortarmos aqui, cortarmos ali’, disse Christopher Isham, chefe da sucursal da CBS News em Washington.

Quando Obama visitar San Francisco na terça e na quarta-feira, para reunir-se com arrecadadores de recursos e dar um giro por uma empresa de painéis solares, não haverá nenhum voo charter.

Há uma preocupação crescente na imprensa de que um resultado desses cortes será menos reportagem sobre o presidente, vindo de um número cada vez menor de fontes. Em seu lugar, provavelmente não por coincidência, virão os comentaristas ruidosos da TV, significando com isso que os cidadãos ainda ouvirão e verão seu presidente constantemente, mas com menos fatos agregados.

‘Isso seria impensável algum tempo atrás’, disse Frank Sesno, um ex-correspondente na Casa Branca e chefe da sucursal da CNN em Washington. Sesno, que agora dirige a escola de mídia e assuntos públicos na Universidade George Washington, disse que os cortes acompanham ‘o declínio das grandes redes e jornais’.

Isham e outros executivos da mídia noticiosa dizem que continuam comprometidos com as atividades da Casa Branca, mas estão buscando maneiras novas e menos caras de trabalhar. Mark Whitaker, chefe a sucursal da NBC News em Washington, disse: ‘Ainda cobrimos o presidente de maneira tão completa e responsável como sempre fizemos; precisamos apenas procurar a melhor maneira de fazê-lo dos pontos de vista logístico e financeiro.’

Gastos

As viagens presidenciais custaram cerca de US$ 18 milhões para a imprensa no ano passado, segundo a associação de correspondentes.

‘Os preços são exorbitantes’, disse David Westin, presidente da ABC News. Os assentos num voo charter da imprensa podem custar US$ 2 mil para um voo doméstico e dezenas de milhares para o exterior. A ABC parecer estar observando os custos no momento em que reformula sua divisão de notícias, que eliminou 25% dos postos neste semestre.

As agências de notícias votam se vão fretar um avião, mas não é fácil obter a maioria: as grandes redes de televisão, ABC, CBS, CNN, Fox News e NBC – representam, cinco de sete votos. (Chen deposita os outros dois votos em nome dos outros correspondentes.) Quando uma rede decide não viajar num pacote, repórteres de todos os tipos precisam fazer outros arranjos.

A mesquinharia nos voos charters começou no final do governo de George W. Bush e aprofundou-se durante os 16 meses de Obama no cargo, particularmente nos últimos três meses, segundo executivos da mídia.

Nesses casos – sejam eles em Buffalo neste mês ou em Praga para onde Obama viajou no mês passado sem um voo charter da imprensa para um importante acordo sobre armas nucleares – os únicos repórteres que estão na chamada bolha presidencial são as dezenas num pool de viagem que voam no Air Force One e tomam notas e tiram fotos para o restante da imprensa.

Os demais precisam comprar passagens em voos comerciais e torcer para chegar em tempo ao evento presidencial. Alguns decidem ficar em Washington, e suas redações enviam repórteres locais em seu lugar, embora seja difícil dizer a frequência com que isso ocorre.

Para os repórteres, a falta de voos charters ‘aumenta seriamente os inconvenientes e o tempo fora da verdadeira cobertura noticiosa’, disse Mark Knoller, correspondente de longa data da CBS Radio na Casa Branca.

Para cobrir uma visita de duas horas de Obama ao Centro Espacial Kennedy, no mês passado, Knoller disse ‘isso ficou com a parte do leão de três dias’, porque ele teve de pegar um voo comercial para a Flórida um dia antes e permanecer lá até a manhã depois do discurso. Mas com isso, poupou centenas de dólares para a CBS; um assento num charter para a Flórida teria custado US$ 2.400.

Knoller disse que compreende que as agências de notícias estejam sob ‘uma enorme pressão’ para gastar menos.

A viagem do presidente Obama tem um impacto direto nas declarações de lucros e perdas das sucursais em Washington. Quando a administração cancelou uma viagem à Indonésia e à Austrália no meio do debate sobre a reforma da saúde, as agências de notícias tiveram de arcar com taxas de cancelamento de aproximadamente US$ 7.500 por assento.

Sesno disse que alguns podem ver a cobertura das viagens como uma commodity, já que as palavras do presidente repercutem amplamente na mídia. Mas disse que ao não viajar com ele, ‘perde-se o sabor especial, perde-se o contexto’.

A diminuição dos voos charters da mídia chamou a atenção na Casa Branca, onde o secretário de imprensa, Robert Gibbs, transmitiu suas preocupações a Chen numa reunião recente.

Questionado sobre as preocupações, o vice-secretário de imprensa, Bill Burton, disse: ‘Vocês podem por certo defender o argumento de que se menos repórteres viajarem, menos terão informações de primeira mão e insight para cobrir o presidente e suas políticas.’ Domesticamente, cerca de 30 a 40 pessoas voam nos voos charters quando ainda lhes ordenam.

Campanha

‘Não quero falar de espiral mortal (sobre os voos charters), mas é nitidamente uma espiral descendente’, disse Chen. ‘Quanto menos organizações voarem, mais altos os custos para as que viajam. Quanto mais altos os custos, mais empresas cairão fora.’ As agências de notícias também pagam por assentos em aviões da imprensa durante campanhas presidenciais, mas executivos de redes dizem que é cedo demais para avaliar como elas lidarão com a campanha de 2012.

Por sua parte, alguns chefes de agências dizem que os charters da Casa Branca provavelmente foram acertados com muita liberalidade no passado.

Agora, eles são acertados numa base individual. Por exemplo, os voos charters são mais necessários quando o presidente faz diversas paradas numa viagem. Seria praticamente impossível os repórteres em voos comerciais fazerem a cobertura.

‘Estamos tentando aplicar um pouco de senso comum na maneira como gastamos o dinheiro’, disse David Bohrman, chefe da sucursal da CNN em Washington.

Senso comum, ou sovinice comum: ponham 11 membros da imprensa num ônibus para um discurso de paraninfo feito por Obama no sul da Virgínia no começo deste mês.

Quando as redes vetaram o voo charter para a viagem, ‘eu sugeri isso por pura frustração e sarcasmo’, disse Chen sobre o ônibus. ‘E sabe o que aconteceu? As redes disseram, ‘quer saber, não é uma má ideia.” Ao preço de meros US$ 200 por assento, o custo seria imbatível.

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Do New York Times