Depois da fase emocional, em que deu amplo espaço para o relato dos dramas das primeiras vítimas, a imprensa tratou de buscar explicações para a extensão dos deslizamentos de terra provocados pelas fortes chuvas ocorridas no Rio de Janeiro. Na sexta-feira (9/4), começam as primeiras responsabilizações pela tragédia.
Se em São Paulo o prefeito Gilberto Kassab foi poupado até o ponto em que não foi mais possível esconder as evidências de omissão da prefeitura – como o corte na verba para coleta de lixo e a redução do número de vagas nos albergues públicos –, no Rio a blindagem de autoridades cai seletivamente.
Até quarta-feira (7), quando se considerava que o pior havia passado, tudo indicava que o noticiário se consolidaria com a contagem dos mortos e as explicações técnicas. As responsabilizações ficavam diluídas entre os prefeitos e governadores que se sucederam no Estado e na cidade do Rio durante os últimos quarenta anos. Eventualmente, uma ou outra referência aos demagogos que sempre se opuseram à desocupação das encostas pontilhou o noticiário, mas até a sexta-feira as críticas eram pouco individualizadas.
Mas a avalancha que atingiu o Morro do Bumba, em Niterói, obriga os jornais a renovar as energias para a cobertura. Foram cerca de 50 casas arrastadas morro abaixo, e mais de 200 pessoas podem estar soterradas sob os escombros.
Dois lados
Na sexta, as explicações técnicas dão conta de que as autoridades municipais de Niterói fecharam os olhos, durante trinta anos, para o crescimento da favela no alto do morro, onde antigamente funcionava um grande depósito de lixo.
Com o amolecimento da terra provocado pelas chuvas, segundo os jornais, o gás metano produzido pelos detritos orgânicos armazenados havia décadas vazou para a superfície, causando explosões e provocando a avalancha.
A Folha de S.Paulo, por intermédio de um colunista, afirma que a Rede Globo protege o governador Sérgio Cabral, tratando-o ‘a leite de cabra’, mas o tratamento desigual é visível em todos os jornais, quando se compara as notícias sobre o Rio e sobre Niterói.
O Estadão, o Globo e a a Folha de S.Paulo acusam o prefeito de Niterói, filiado ao PDT, de haver ignorado estudos sobre a ocupação desorganizada dos morros. Como se não houvesse estudos semelhantes nos morros do outro lado da baía da Guanabara.
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Uma explosão reveladora
A explosão que matou um jovem de 17 anos, filho do bicheiro Rogério Andrade, no Rio de Janeiro, é noticiada pelos três jornais de circulação nacional como uma trama entre mafiosos. Mas o acontecimento tem relações até mesmo com a pauta de votações do Congresso Nacional.
Segundo explicam os jornais, Rogério Andrade alimenta uma disputa com outro chefe do jogo no Rio, Fernando de Miranda Ignácio, pelo controle do negócio de caça-níqueis. Com a decadência do jogo do bicho e a perspectiva de legalização dos bingos eletrônicos, Andrade estaria acirrando a luta pelos pontos do concorrente.
Segundo a imprensa, o ataque, muito semelhante aos atentados terroristas que acontecem com frequência no Iraque, foi produzido por profissionais. A polícia suspeita de uma bomba ‘plantada’ sob o banco do carro blindado e até do uso de um lança-granadas. As imagens publicadas pelos jornais dão idéia da devastação provocada e do poder dos explosivos utilizados.
Mas o mais importante não está presente no noticiário. Não se trata apenas de mais um episódio na briga de quadrilhas que se sucedem há décadas no submundo das nossas grandes cidades. Trata-se de atividade criminosa que invade o cenário político.
Passou da hora
Como se sabe, tramita aceleradamente na Câmara dos Deputados, com o patrocínio de figuras destacadas do Congresso, um projeto de lei que prevê a legalização das casas de jogo. Também se sabe que os chefes do esquema financiam campanhas eleitorais há muito tempo.
A explosão que matou o filho de Rogério Andrade é a manifestação mais ruidosa dessa disputa. Ao mesmo tempo, revela o lado mais obscuro dessa espécie de ‘empreendedor’ cujos negócios o Congresso ameaça legalizar.
Está na hora de os jornais estamparem os nomes dos parlamentares que, direta ou indiretamente, estão a serviço do crime organizado.