Rita Lee já disse que mulher é bicho esquisito. E bota esquisito nisso! Solteira, ficante, casada, viúva, separada, nunca mais. Homem é tudo igual, só muda de endereço. Novamente apaixonada, será que ele vai ligar? Eu é que não telefono, não tô nem aí. Dessa vez é para sempre. Pode dizer sim quando quer dizer não, ou vice-versa, tem sexto sentido, deseja discutir a relação. TPM, ninguém me ama, sente-se a última das últimas. Nunca tem nada para vestir, se afunda em um pote de sorvete enquanto assiste, pela milésima vez, a Casablanca e, no dia seguinte, passa à base de alface.
Já acreditou em príncipe encantado. Agora sabe que é melhor ficar sozinha do que acordar ao lado de um sapo. Queimou sutiã, hoje coloca silicone. Vai trabalhar, o salto quebra, o chefe manda fazer 12 relatórios, responder a 83 e-mails, comprar os brinquedos para os trigêmeos dele, tudo para ontem. Finalmente, ela bate o ponto e sabe que o seu salário é menor do que o rapaz que ocupa a mesma função. Ou então, cozinha, lava, passa, costura e arruma, sem receber salário.
Encaracola os cabelos lisos, faz escova progressiva nos cachos, pinta os fios de vermelho, se depila com cera quente, tira a cutícula… e pergunta: “Você não notou nada?” Ele responde: “ Mudou o batom?” Ouve a piadinha de que mulher só tem dois neurônios: o Tico e o Teco. Mas consegue ver a novela, falar ao telefone e digitar a sua dissertação de mestrado ao mesmo tempo. Gosta de ir ao banheiro com as amigas, de fofocar, de guardar segredos. O olhar diz tudo – meigo ou fulminante –, faz cara de paisagem. Tem um pretinho básico, mas coloca a roupa vermelha e sai pronta para matar.
Três entre milhares
Afirma não ser romântica. No entanto, guarda os cartões dos antigos namorados e adora dar presentes que antecedem a tradicional pergunta: “Você sabe que dia é hoje?” E ele esqueceu que faz um ano que trocaram o primeiro beijo. Entra em greve, prepara um jantar para comemorar as pazes. É boa filha, mãe, companheira, funcionária, equilibrista, joga nas onze. Comentam que é capaz de tudo por amor, que quando coloca uma ideia na cabeça, ninguém tira. Será? Segundo conta a lenda, para conquistar César, Cleópatra se enrolou em um tapete e o fez chegar até ele como presente. Penélope também usou um tapete. Teceu-o e o desfez, mais de mil vezes, para esperar um homem que amasse. Julieta preferiu morrer quando viu o seu sonho acabado.
As mulheres são sentimentais, sim. Mas também arregaçam as mangas e vão à luta. A missionária Dorothy Stang foi assassinada por defender causas ambientais e trabalhadores sem-terra. Madre Teresa de Calcutá apoiou e recuperou os desprotegidos na Índia. Dilma Rousseff foi eleita a primeira presidente do Brasil. E tem a Ana, a Maria, a Conceição… Meninas que descobrem, adolescentes que questionam, mulheres que executam, mães que agem iguais às suas, avós e bisavós que sorriem com sabedoria… Tantas e tão únicas. Frágeis e guerreiras.
Maria da Penha Maia Fernandes conseguiu que o seu marido agressor fosse condenado, criando assim a Lei Maria da Penha. Mas a violência contra a mulher ainda persiste. No dia 20 de agosto de 2000, a jornalista Sandra Gomide, de 33 anos, foi assassinada com dois tiros em Ibiúna, interior de São Paulo, pelo ex-namorado, o diretor do Estado de S. Paulo Pimenta Neves. Em 13 de outubro de 2008, Lindemberg Alves, de 22 anos, executou a ex-namorada, de 15 anos, Eloá Cristina Pimentel da Silva, em Santo André, São Paulo. No dia 11 de junho de 2010, o corpo da advogada Mércia Nakashima, de 28 anos, foi encontrado em uma represa, no interior paulista. Ela levou um tiro do ex-namorado, o policial aposentado Mizael Bispo de Souza. São apenas três, de milhares de casos semelhantes.
Muito a ser conquistado
E o Dia Internacional das mulheres foi instituído exatamente por uma barbárie ocorrida contra elas no século 19. Em 8 de março de 1857, operárias de uma fábrica em Nova York entraram em greve para reivindicar melhores condições de trabalho, tais como redução na carga horária (elas eram obrigadas a cumprir uma jornada de 16 horas por dia), equiparação de salários com os homens (recebiam apenas um terço dos vencimentos deles para exercer a mesma função) e tratamento digno no ambiente de trabalho. A manifestação foi reprimida com extrema violência. Os patrões trancaram as mulheres dentro da fábrica, que foi incendiada. Cerca de 130 tecelãs morreram carbonizadas.
Mas só em 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de março passaria a ser o Dia Internacional da Mulher em homenagem às funcionárias que morreram na fábrica. Em 1975, através de um decreto, a data foi oficializada pela Organização das Nações Unidas. Nesse dia, na maioria dos países, realizam-se conferências, debates e reuniões para tentar diminuir e, quem sabe, um dia terminar com o preconceito e a desvalorização da mulher. Mesmo com todos os avanços, elas ainda sofrem, em muitos locais, com salários baixos, violência masculina, jornada excessiva de trabalho e desvantagens na carreira profissional. Na minha opinião, ainda há muito para ser conquistado e pouco para ser comemorado.
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[Vera Lucas é jornalista e escritora, Rio de Janeiro, RJ]