Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Senador Julian Assange?

No fim de semana (17-18/3), a central de notícias do WikiLeaks (WL Central) acusou a grande mídia por publicar fatos que sequer foram checados. A suposta candidatura de Julian Assange para o Senado australiano em 2014 não passou de um artigo independente, postado na central do WikiLeaks no final de dezembro de 2011, que especulava sobre a elegibilidade de Assange diante do sistema eleitoral australiano: “O artigo apresenta a opinião legal e independente da lei australiana e, a seguir, a opinião política independente de um escritor em relação à candidatura de Julian Assange para o Senado australiano”, afirmou a central do WikiLeaks. O grupo, que no início foi rechaçado por “não ser jornalismo”, agora, com sua central de notícias, fez a crítica da mídia com maestria.

Tudo não passou de um estudo exploratório feito em dezembro de 2011 que expressava, além de estudos sobre a lei australiana e a elegibilidade de Assange, pontos de vista individuais do autor – que não é membro do WikiLeaks. Mas a imprensa internacional precipitou-se, entendeu tudo errado, não conferiu fontes, não entrevistou ninguém e várias matérias foram publicadas, todas propagando o mesmo erro: a Reuters (17/3), a CNN (18/3), o Huffington Post (17/3), o conglomerado australiano de Murdoch (a Herald Sun Organization, 17/3) e o Sydney Morning Herald (18/3) informaram a suposta candidatura de Assange sem examinar melhor as fontes originais. Sem nenhuma prova.

Dois periódicos chegaram a declarar que o WikiLeaks “flertou com a ideia de criar seu próprio partido político”: o Washington Examiner (16/3) e o Sydney Morning Herald (18/3). A central do grupo de ativistas negou isso também. A conclusão foi dos próprios jornalistas, avisou a central. Outro erro grosseiro da imprensa: nada foi postado no Twitter que levasse alguém a acreditar que Assange iria concorrer ao Senado. A especulação (que na realidade não passa de um grande e bom estudo) foi publicada no próprio WikiLeaks em dezembro do ano passado (ver aqui).

Sabem fazer jornalismo

O site do WikiLeaks não perdoou tanta irresponsabilidade e avisou a velha mídia “que ficasse com seu próprio sistema de checagem de fatos”. E que era lamentável “que os repórteres online hoje em dia continuassem a escrever suas matérias apenas copiando e colando material encontrado na web”. Sem citar fontes, sem checagem, sem consulta ou entrevista: se o assunto atrai o público, então pouco importa se é fato ou especulação: publica-se o que foi declarado e ponto final. O pito que a mídia mundial levou da Central de Notícias do WikiLeaks foi feio:

“A Central WikiLeaks é um centro independente de notícias do WikiLeaks. Escritores na WL Central são muito protetores de suas integridades jornalísticas. Mas parece que este conceito está perdido na grande mídia.”

A mídia mundial foi humilhada por sua própria precariedade. Por praticar jornalismo declaratório. A mesma mídia que se preocupou com questões irrelevantes, como perguntar se o WikiLeaks era jornalismo ou não. Foi realmente uma vergonha para muitos jornalistas de todo o mundo divulgar a notícia falsa da candidatura de Assange: tentaram criar uma realidade falsa, baseados num documento postado no final do ano passado e que nem lido corretamente foi. Devemos presumir, então, que eles ficaram todo esse tempo com o material em mãos só para chegarem a uma conclusão temerária sem prova alguma?

Em seu início, o WikiLeaks não tinha um quadro de jornalistas. Agora tem. E eles mostraram neste final de semana que sabem fazer jornalismo.

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[Sergio da Motta e Albuquerque é mestre em Planejamento urbano, consultor e tradutor]