Começo este texto dizendo que há vários militares em minha família, inclusive um que participou ativamente da Revolução de 31 de março de 1964. A participação desse revolucionário, ao contrário do que muitos amigos sabem, foi marcada por uma postura intransigente na defesa da integridade física e psicológica de seus prisioneiros.
Mais uma vez, um grupo de militares levanta a voz para tentar calar a verdade. Esta mensagem não vai apenas para os antigos militares que participaram desse período, mas para os jovens militares; aqui incluo também os atuais oficiais generais de quatro estrelas – muito jovens na época. Não tem sentido rasgar uma página da nossa história porque isso desagrada a algumas poucas pessoas. Não foram as forças armadas que torturaram ou mataram, e sim, um pequeno grupo de militares e de paramilitares. Nenhum militar deve se achar no dever de defender um psicopata assassino que nunca conheceu.
Ao contrário do que pensa e diz esse pequeno grupo obscurantista, que assinou o manifesto “Alerta à Nação – eles que venham, aqui não passarão”, a criação da Comissão da Verdade não visa a dar início a uma “caça às bruxas” baseada em rancor e revanchismo. O que se pretende é determinar a localização dos desaparecidos e os responsáveis por eles. Ela pretende também investigar violações dos direitos de cidadãos brasileiros cometidas por agentes do Estado. A criação dessa comissão aconteceu até com muito atraso, mesmo quando nos comparamos com países vizinhos que sofreram um período de repressão bem mais sangrento que o nosso. A verdade está sendo restaurada nesses países e não existe nenhum motivo razoável para que isso não ocorra em nosso país.
Punição exemplar
O que esse pequeno grupo sectário está fazendo é lançar informações inverídicas na mídia. Vamos aqui, nesse ponto, esclarecer algumas delas. Não é verdade que não houve apuração sobre a atuação de grupos de esquerda – isso é um absurdo. As pessoas que atuaram de forma criminosa perante as leis vigentes na ocasião foram julgadas e condenadas: algumas cumpriram pena, outras fugiram do país. A apuração que falta é exatamente aquela ligada aos crimes cometidos pelos agentes do Estado. O que esse pequeno grupo equivocado não diz, mas pensa, é que existia uma “guerra suja” e, em uma situação como essa, vale tudo, pois “guerra é guerra”. Essas pessoas esquecem que, mesmo na guerra, existem princípios que devem ser respeitados, pois elas, pelo menos, já ouviram falar nas convenções de Genebra.
Vivemos em um período de democracia plena e em paz. A lei de anistia (lei nº 6.683 de 28 de agosto de 1979) cumpriu e cumpre o seu papel – temos um país pacificado. No entanto, precisamos conhecer a nossa história. Se algum militar torturou, com requintes de sadismo, e matou friamente um prisioneiro, a lei de anistia garante sua impunidade, mas nós precisamos saber quem foi esse militar e onde está enterrado o corpo desse prisioneiro.
O governo pode e deve exigir punição exemplar para esse grupo de militares que participaram do manifesto e, caso não possa contar com os oficiais de quatro estrelas, que passe todos eles para a reserva e promova os de três estrelas, e assim por diante. Isso é hierarquia, isso é Estado de Direito.
***
[Augusto Cesar de Castro Barbosa é professor, Rio de Janeiro, RJ]