O município de Teresópolis, na região serrana do estado do Rio de Janeiro, sofre novamente com tragédias causadas por fortes chuvas. O advérbio novamente é a base da crítica que faço aqui à cobertura jornalística brasileira em acontecimentos que geram grande repercussão, como as chuvas em Teresópolis. Antes de prosseguir, um esclarecimento. Agir como policial, juiz, legislador, chefe do executivo ou fiscal permanente da lei não está entre as atribuições do jornalista. O papel do jornalista é levar uma informação de qualidade aos cidadãos para que estes sejam capazes de se autogovernarem, como preceituam Bill Kovach e Tom Rosenstiel.
Sendo assim, uma informação de qualidade é o bem mais importante produzido e oferecido pelos profissionais de imprensa à população e, na maioria das vezes, essa informação denuncia, alerta ou torna público algo que não está funcionando bem na própria sociedade. Em muitos casos, a informação nasce de um acontecimento inesperado, de uma tragédia, de um fato que será noticiado por vários dias.
O que causa espanto é a facilidade com o que a imprensa abandona os fatos que, por um espaço de tempo, são explorados à exaustão pela própria imprensa. Por isso, a menção às consequências das fortes chuvas na região serrana do Rio de Janeiro. Algo parecido acontece com as encostas da rodovia Rio-Santos na altura do município de Angra dos Reis. A corrupção denunciada pelo Fantástico há duas semanas envolvendo empresas terceirizadas e órgãos públicos é o evento mais recente.
Permanente não significa diário
Uma pessoa que acompanhe com frequência a cobertura diária da imprensa, sobretudo através do jornal impresso e do telejornalismo, tende a imaginar, depois de certo tempo, que os problemas causados pelas tragédias, por exemplo, foram todos superados pela população, ou solucionados pelo poder público. Isso acontece porque geralmente durante os 15 dias seguintes ao evento que deu origem à cobertura, mesmo que não sobrevenham fatos novos relevantes, os veículos de comunicação mantêm o assunto em suas pautas diárias, ouvindo as pessoas afetadas, os órgãos públicos envolvidos e especialistas que ajudem a traduzir os acontecimentos.
Entretanto, os problemas nem sempre se resolvem em 15 dias, sobretudo quando estão relacionados a causas naturais. Seria necessário acompanhar mês a mês o andamento das ações implementadas para recuperar áreas atendidas, os projetos de prevenção apresentados, os impactos e desdobramentos para a população e para a própria região, a apuração de responsabilidades quando comprovadas, enfim, há uma gama de assuntos que poderiam pautar a imprensa mesmo após a exaustiva cobertura dos chamados hard news.
Resta claro que o jornal diário trabalha em cima do factual, do que está em evidência, da notícia do momento, mas se um assunto mereceu atenção das redações por cerca de duas semanas, esse assunto merece um acompanhamento permanente. Permanente não significa diário. O assunto, simplesmente, não deve ser esquecido e noticiado novamente apenas se voltar a acontecer, como no caso de Teresópolis. Tragédias não sobrevieram em Angra dos Reis, mas quem trafega pela supracitada rodovia vê que, mesmo após três anos, nem todas as obras de contenção ficaram prontas. Como nem todos usam a Rio-Santos, isso só viria à tona através da informação jornalística. A corrupção identificada nos hospitais federais cariocas ainda não saiu da pauta, mas sairá e algumas perguntas sobre o envolvimento de servidores públicos nos esquemas identificados ficarão sem respostas.
Mudança de mentalidade
Por isso, cabe ao jornalismo acompanhar permanentemente os fatos que tenham sido fruto de amplas coberturas da mídia. É uma questão de credibilidade. Não acompanhar, abre margem para questionamento sobre o tratamento dado pelo jornalismo à informação e sobre a “falta” de importância que tem a vontade do público em obter informação nas reuniões diárias que estabelecerão os assuntos que serão colocados em pauta pelos jornalistas.
Há espaço para o acompanhamento e é sabido que fatos novos acontecem diariamente, logo é possível essa mudança de mentalidade nas redações porque nem só do fato do dia se faz um jornal diário. O que define a importância de um assunto é a sua importância para o público consumidor de notícias. O resto é achismo de reunião de pauta.
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[Marcelo Feitoza é jornalista, Rio de Janeiro, RJ]