Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O homem de verdade e seu lado hard

Lançada em fevereiro deste ano pela Editora Mix Brasil, a H Magazine une-se ao pool de publicações voltadas para o público gay no país. Planejada para homens homossexuais maduros, na faixa etária acima dos 30 anos, a revista busca se diferenciar de outra revista famosa da mesma editora, a Junior. Enquanto nesta descortina-se para o leitor um universo aspiracional jovem, festeiro, recheado de pautas sobre moda, consumo e beleza e intenso roteiro de festas e lugares badalados em todo o Brasil, a H foca reportagens mais comportamentais, com histórias e personagens que podem ser encontrados no dia a dia, colunas de aconselhamento e um certo tom político ausente em outras publicações do segmento. Enquanto na Junior o slogan é ser a revista do homem livre e inteligente; a H se coloca pretensamente como a revista do homem de verdade. Mas o que significa ser esse homem de verdade no universo delineado?

Se ser um homem de verdade é ser um homem que lê, trabalha, estuda, ama, se casa, tem neuras, problemas, queixas, frustrações, perdas e ganhos, a H Magazine vai além da sua coirmã Junior, onde o homem gay representado parece ser bem resolvido em seu mundo perfeitinho de propaganda de margarina – embora a própria Junior esteja dando um passo concreto a fim de ser mais próxima da realidade, com pautas mais palpáveis. Mas se a H dá mostras de estar transitando com relativos acertos nesses quase nove meses de existência ao trazer entrevistas apuradas, personagens mais reais e colunistas que propõem reflexões caras ao universo homossexual, a revista parece dividir opiniões quando o assunto é a abordagem do sexo, que faz em seu universo de um modo mais explícito e incisivo.

Tarefa difícil

Além dos ensaios fotográficos picantes, diferentes em relação aos da Junior – que se aproximam mais de um editorial de moda e beleza –, outro destaque a ser observado no conteúdo de H é o seu caderno chamado “Hard”. Na verdade, um encarte dentro da revista feito com papel, cor e textura diferentes do das outras páginas, como numa tentativa de assinalar que a partir daquele momento o foco e o teor são outros.

Com textos de tom explícito e fotos mais ousadas, o caderno cumpre uma função durante muito tempo adiada pelo Grupo Mix Brasil em suas publicações impressas: falar de sexo com a linguagem do sexo. Enquanto na Junior e até mesmo em outras matérias dentro da própria H Magazine, as pautas sobre sexo e questões vinculadas são mais contidas, com construções textuais habilidosamente contornadas pela equipe da editora; em “Hard”, palavras como “pau”, “bunda”, “currar”, “comer” e outras correntes no imaginário e dialeto considerados vulgar do sexo aparecem sem rodeios. O conteúdo das páginas do caderno encartado em H também é bem ousado, com relatos sobre orgias, encontros casuais, histórias de sexo selvagem e festas em cruising bar e saunas onde rola de tudo. Conteúdo para chocar os desavisados e os mais puritanos.

A publicação de um caderno como este vai bem ao encontro de um fenômeno que domina os veículos de comunicação há muito tempo em todo o mundo: o fenômeno da sexualização. Como bem descrevia o pensador francês Michel Foucault em seus estudos sobre a sexualidade, a nossa sociedade tem uma obsessão quase compulsiva em saber sobre sexo e falar sobre ele. Mas se é comum o interesse social em assuntos ligados a sexo, ver um caderno dentro de uma revista tão elegantemente concebida recheado de palavras consideradas obscenas e imagens cruas, diametralmente, pode ser um choque à primeira vista e, numa leitura mais apressada, pode nos fazer desconsiderar todo um conjunto que envolve a publicação.

Olhando mais profundamente e com certos pudores de lado, a salutar relativização pode ser propriamente encarada. Claro que tudo pode ser melhor dosado e alguns comentários de leitores publicados na própria seção de cartas da revista demonstram isso: enquanto uns se animam com páginas mais ousadas, abraçando a ideia de ver contos picantes e imagens de nu, outros preferem uma erotização mais branda, sem passar do tom na abordagem sobre sexo. A tarefa não é fácil, mas cabe à equipe de H encontrar um equilíbrio. Fiquemos de olho nesta evolução.

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[Fernando Barros é relações públicas]