Estou muito distante daqueles que consideram a imprensa como mero instrumento de manipulação e discordo completamente dos que caracterizam os meios de comunicação como o PIG, um suposto “partido da imprensa golpista”, como acusa a “blogosfera de esquerda”. A história da imprensa demonstra a sua importância, suas vitórias e também suas misérias, por que não?, sendo ela, como qualquer outra, uma atividade humana, sujeita ao bom e ao ruim, ao bem e ao mal, ao belo e ao vulgar.
Porém, ultimamente, vinha tendo a sensação de que os jornais davam destaque excessivo à operação Lava Jato em desfavor de outros escândalos de corrupção tão ou mais cabeludos do que o ataque aos cofres da Petrobras: a bandalheira na Receita Federal (Zelotes) e o caso SwissLeak (HSBC). Mas como sempre digo aos jovens estudantes, e nas reuniões que coordeno do Conselho de Leitores do O Povo – quando surge crítica a alguma cobertura –, não podemos nos deixar levar pelo “impressionismo”, ou seja, analisar apenas uma edição do jornal para fazer julgamento acabado sobre determinado tema.
Por isso resolvi revisar as primeiras páginas de dois importantes jornais, um de São Paulo, a Folha de S. Paulo e outro do Rio, de Janeiro, O Globo, entre os dias 1º de março até 10 de abril, portanto, 41 dias, para ver quantas manchetes foram dedicadas a cada um dos assuntos. Como se sabe, a manchete de capa destaca o assunto que o editor considera o mais importante da edição.
Das 41 edições analisadas no período, O Globo dedicou 14 manchetes de capa e um quadro na dobra superior (recurso na primeira página que dá destaque equivalente à manchete), à Lava Jato. Ao escândalo do SwissLeaks foram duas manchetes de capa e quatro quadros na dobra superior. Na Folha de S. Paulo foram 12 manchetes de primeira página à operação Lava Jato e um quadro na dobra superior. Não houve nenhuma manchete de capa a respeito das contas de brasileiros, suspeitas de irregularidades, mantidas na agência suíça do HSBC.
Observe-se que a Lava Jato foi desfechada em março de 2014, não mais saindo das manchetes dos jornais, sendo que o escândalo mais novo, do HSBC, foi revelado em fevereiro deste ano, portanto ainda “quente”.
A operação Zelotes tornou-se pública no dia 26 de março – assim, esse pequeno levantamento cobre 15 dias, desde a sua revelação. Tomando como base esse período, a Zelotes ganha uma manchete de primeira página no Globo, sendo que, da Lava Jato, são cinco. Na Folha de S. Paulo há duas manchetes sobre a Zelotes e quatro a respeito da Lava Jato.
Portanto, é bem fácil observar a desproporção da cobertura, pelo menos nesses dois jornais, levando-se em conta as suas manchetes de primeira página.
Sem nenhuma sombra de dúvida, a maior responsabilidade nas falcatruas ocorridas na Petrobras é do governo, mesmo que a iniciativa privada também esteja metida nos malfeitos. Porém, no caso SwissLeaks (em que o HSBC era usado como lavandeira e duto para a evasão de impostos), e na operação Zelotes (na qual grandes empresas livravam-se do fisco comprando facilidades), não se pode espetar a conta nas costas do governo nem de políticos. A responsabilidade recai unicamente sobre milionários e empresas acima de qualquer suspeita. Seria esse o motivo de alguns setores da imprensa usarem antolhos (voluntariamente) que lhes facilita olhar apenas em uma direção?
Qual o maior escândalo?
Segundo a Folha de S. Paulo (10/4/2015), a Petrobras estima que a corrupção subtraiu cerca de R$ 6 bilhões da empresa. Para O Globo (27/3), o valor do imposto sonegado por grandes empresa (operação Zelotes) pode chegar a R$ 19 bilhões.
Balcão
“Quem paga imposto é só os coitadinho, quem não pode fazer acordo, acerto. (…) eles tão mantendo absurdos lá contra os pequenininho e esses grandões aí tão passando tudo livre, tudo isento de imposto, é só pagar, passa.” Palavras de Paulo Roberto Cortez, conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) da Receita Federal, em gravação captada pela Polícia Federal.
Internet
Caso o leitor queria saber quais empresas estão enroladas na Zelotes ou proprietários de contas no exterior no HSBC (SwissLeaks), basta fazer busca na internet usando algumas palavras-chaves, como “zelotes, carf” e “swissleak, hsbc”.
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Plínio Bortolotti é jornalista