De pouco ou menos do que isso parece ter servido a brilhante sacada do comentarista Arnaldo Jabor, entrando no ar no Jornal Nacional da sexta-feira, depois da extensa matéria (1/3 do programa, segundo o colunista da Folha Nelson de Sá) sobre as multimilionárias contas ilegais de Paulo Maluf no exterior – enfim comprovadas para além de qualquer dúvida razoável.
Três vezes, em meio à exibição das evidências e da história de como foram obtidas, a reportagem recuperou declarações do ex-prefeito, de agosto de 2001.
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‘Não tenho negócios, não sou titular de nenhum valor e não tenho nenhuma conta, em nenhum banco daquela ilha [Jersey, no Canal da Mancha] ou em qualquer paraíso fiscal do planeta.’**
‘É falsa qualquer tentativa de vinculação do meu patrimônio pessoal com minha vida pública.’**
‘Não tenho nenhuma conta em paraíso fiscal. Deixa gravado aí: se eu tenho uma conta bancária na Suíça, o que for, deixo para você a procuração para doar para a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.’Foi o que inspirou Jabor a liquidar o assunto assim: ‘Diante dessas notícias, eu quero dizer que não sou Arnaldo Jabor, este não é o Jornal Nacional, nem estamos na TV Globo e vocês não estão assistindo à televisão. Quem pode provar? Aliás, vocês não existem, nem eu. E nem prova prova mais coisa alguma no Brasil.’
‘Ontem’ e ‘hoje’
Pois mal. No fim da semana, tanto a Folha, como o Estado e o Globo – estes últimos em títulos espaçosos – prestaram-se ao papel de dançar conforme a velha, gasta, cínica e desacreditada melopéia malufista. Tanto pior para a verdade, tanto mais ofensivo para o leitor.
Publicaram, como se fossem fatos e não factóides:
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‘’Quem encontrar, o dinheiro é dele’, desafia Maluf’ (Estadão)**
‘Maluf: quem achar contas em paraísos fiscais poderá ficar com o dinheiro’ (O Globo)**
‘E tem mais: desafio – desafio fica um pouco forte – eu assumo o compromisso do primeiro que encontrar qualquer depósito na minha conta na Suíça a ficar com o dinheiro.’ Adiante: ‘Agora, quero que você diga o seguinte: faço por meio desta declaração gravada na Folha de S.Paulo uma escritura: o primeiro que achar o dinheiro é dele.’ (Em longa entrevista intitulada ‘Maluf atribui denúncia a interesse eleitoral’.)Declarações de figuras notórias como Paulo Maluf e de quem para elas trabalha só deveriam ser publicadas se contiverem alguma novidade, se não se destinarem a fazer o povo de bobo, usando a mídia como esparro, ou se forem amostras convincentes da rematada cara-de-pau de seus autores.
Foi por isso que a Veja, na sua robusta matéria de capa ‘A megafortuna de Maluf no exterior’ transcreveu o diálogo de seus repórteres com o assessor Adilson Laranjeira na sexta-feira (Maluf prometeu dar entrevista, mas não apareceu, diz o semanário). Vale a pena ler (ou reler):
‘Veja – Qual a diferença prática entre beneficiário e dono da conta?
Laranjeira – Que ele não movimenta a conta.
Veja – Se Maluf é beneficiário, o saldo da conta lhe pertence.
Laranjeira – Não, não, não necessariamente.
Veja – Alguém pode ter colocado Maluf como beneficiário de uma conta à sua revelia?
Laranjeira – Isso.
Veja – Por que alguém faria isso?
Laranjeira – Aí, só a pessoa que fez pode responder.’
P.S. No abre da sua matéria de domingo sobre o caso, o Estadão menciona a documentação publicada ‘ontem’ pelo jornal e ‘hoje’ pela revista Veja. Primeiro, o redator omitiu que a Folha também deu a história no sábado (com a reprodução das assinaturas de Maluf em documento bancário suíço e na sua declaração de bens à Justiça Eleitoral em 2000 – o que o Estado só faria, e pela metade, no dia seguinte). E ignorou, estranhamente, que a Veja estava sábado cedo nas bancas junto com o Estadão… [Texto fechado às 23h13 de 10/5]