Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S. Paulo


CRISE POLÍTICA
Editorial


Na Cadência Do Deboche


‘O Carnaval já passou, mas coube à deputada Ângela Guadagnin, do PT de São
Paulo, oferecer ao público a mais desinibida alegoria dos tempos que correm. As
cenas de sua solitária dança em plenário, comemorando a absolvição do
correligionário João Magno (PT-MG), ficarão na memória política do país como a
manifestação acabada do quadro de deboche que se instalou nas rodas do poder
central.


Seria o caso de invocar o decoro parlamentar; mas como é justamente esse
quesito que se viu pisoteado nas últimas decisões da Câmara, os critérios para
julgar o desempenho da deputada vacilam, balançam e gingam, conforme o senso de
humor e a complacência estética de cada um.


Do ponto de vista coreográfico, seria difícil avaliar a precisão, o ‘timing’,
o acerto dos passos da parlamentar, a menos que se soubesse ao som de qual
música, inaudível à opinião pública, ela imaginava estar, vá lá o termo,
sassaricando. ‘Mamãe eu quero mamar’, para quem celebra o triunfo e a glória do
valerioduto, não seria, data venia, uma escolha inadequada. Verdade que o fundo
musical das pizzarias costuma ser o de animadas tarantelas.


Não cabe pedir a Ângela Guadagnin esclarecimentos sobre esse ponto, uma vez
que tantos outros mais importantes, nos escândalos em curso, foram sonegados
devido à sua atuação feroz nas CPIs.


Ainda que constrangedor, o espetáculo não precisa suscitar extremos de
pessimismo. Em tempos idos, o teatro de revista se encarregava de fazer, entre
um e outro número de rebolado, a sátira dos costumes políticos. Passada a época
áurea de Dercy Gonçalves e Oscarito, talvez faltasse o tom de irreverência e
brasilidade -para lembrar um tema caro à deputada- com que se contrabalança, na
vida espiritual da nação, a vista deprimente das mazelas do poder.


Graças à deputada, o escândalo e a sátira, o mar de lama e o rebolado,
convergem num único palco. Não deixa de ser uma economia de tempo para o
respeitável público.’


Lilian Christofoletti


Palocci diz viver inferno e vincula crise às eleições


‘O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, rompeu o silêncio que já durava dez
dias e aproveitou uma cerimônia ontem em São Paulo para se defender. Admitiu ter
cometido erros e disse que hoje vive o ‘inferno’, em contraponto com a situação
econômica que, segundo ele, ‘está no céu’.


Desde o dia 14, quando a CPI dos Bingos ouviu o caseiro Francenildo Costa,
que contradisse Palocci ao afirmar que ele freqüentava a casa alugada por
lobistas, o ministro não fala à imprensa. Ontem, mesmo a contragosto, permitiu a
presença de repórteres na sala da cerimônia de posse do novo conselho da Câmara
Americana do Comércio, em São Paulo, mas não deu entrevistas.


Ao iniciar seu discurso de 36 minutos (16 a mais que o previsto), Palocci
anunciou a quebra de protocolo. Disse que não iria ler o texto ‘longo e chato’
que havia preparado, mas que gostaria de ter uma ‘conversa franca’. Na platéia,
havia 700 pessoas, entre presidentes de grandes companhias, advogados e
consultores.


Aparentando calma, disse várias vezes que a economia não será afetada pela
crise política, elogiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ligou o que
chamou de inferno pessoal às eleições.


‘Sou político e não me recuso a fazer o debate político, não me recuso a
falar sobre as coisas que me envolvem, mas, às vezes, o que faz parte da
política chega a um nível de exacerbação exagerada’, disse.


Em nenhum momento, Palocci fez uma citação direta das acusações que pesam
contra ele. Pelo contrário, disse que, apesar da proximidade das eleições, os
opositores devem pensar no que é o melhor para o Brasil, independentemente dos
interesses partidários. ‘Precisamos ter serenidade para atravessar esse período
de crise. Caso contrário, corremos o risco de ter uma eleição muito agressiva,
que vai acabar agredindo o eleitor em vez de oferecer a oportunidade de debater
democraticamente diferentes programas para melhorar o Brasil.’


Sobre o silêncio, Palocci disse que, como ministro, sempre irá se recolher
quando as acusações forem baixas. ‘Fiquei um pouco retraído nesta semana, mas
vou fazer isso sempre que a discussão resvalar para algum plano que desrespeite
a instituição, que desrespeite pessoas, que desrespeite o trabalho de cada
um.’


Nos 36 minutos de discurso, Palocci gastou uns cinco minutos em cumprimentos
e anunciando que não iria ler o discurso, uns 20 minutos falando sobre os
pilares de sustentação da economia brasileira e mais ou menos dez minutos sobre
a situação política.


Os convidados não tiveram a oportunidade de fazer perguntas a Palocci. Leia
abaixo trechos do discurso do ministro da Fazenda:


CÉU E INFERNO – ‘Como é possível uma economia que está no céu e um ministro
da Fazenda que está no inferno, no terceiro ou quarto círculo do inferno de
Dante [Alighieri, autor de ‘A Divina Comédia’]? Isso é possível porque a
economia brasileira começa a ganhar maturidade […] e isso não é só do meu
período, foram vários esforços que permitiram ao Brasil atingir um grau de
profundidade que suas políticas se tornam mais permanentes do que as
pessoas’.


FIRMEZA DE LULA – ‘Atingimos um nível de consolidação dos nossos compromissos
de equilíbrio fiscal, de melhora nas contas externas, de controle do processo
inflacionário, que formam uma combinação de pilares que o Brasil nunca teve no
passado. […] Isso foi possível graças à firmeza do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva. Insisto que nada teria acontecido sem o apoio do presidente, que é
muito racional, toma decisões claras e sabe que, às vezes, é preciso fazer um
esforço a longo prazo para obter resultados.’


FUTURO – ‘Temos como desafio neste e nos próximos anos continuar o nosso
trabalho, com as reformas microeconômicas, completar trabalhos como a lei de
falência, temos muito o que fazer’.


CRISE E ECONOMIA – ‘É verdade que a política está cobrando o seu preço, a
política está recrudescendo. Não penso que isso vá prejudicar a economia. Mesmo
nos momentos de mais tensão política, como no ano passado, não tivemos
desarranjos do processo econômico. Mas, de qualquer forma, o bom funcionamento
das instituições é fundamental para que o país caminhe bem.’


FORÇAS POLÍTICAS – ‘Infelizmente, penso que neste momento as forças políticas
se encontram num processo de conflito extremamente negativo para o país.’


ISOLAMENTO – ‘Sou político, […] não me recuso a falar sobre as coisas que
me envolvem, mas, às vezes, o que faz parte da politica chega a um nível de
exacerbação exagerada. Algumas pessoas não têm limites entre investigar o que é
justo e o que é perseguir. Essa é uma questão que está presente no atual momento
de conflito no Brasil e nós precisamos de serenidade. Caso contrário, corremos o
risco de ter uma eleição muito agressiva, que vai acabar agredindo o eleitor em
vez de oferecer a oportunidade de debater democraticamente diferentes programas
para o Brasil.’


ISOLAMENTO 2 – ‘Disseram nesta semana que eu me afastei da imprensa. Quero
que vocês compreendam que não posso, como ministro da Fazenda, debater todo tipo
de acusação baixa e ofensas. Não posso. Sempre que essas coisas acontecem, eu me
silencio um pouco, mas não deixo de fazer os meus compromissos. Não posso fazer
do Ministério da Fazenda um debate desses temas.’


ERROS – ‘Neste período de crise, houve erros de todas as partes. Eu não sou
daqueles que acham que só a oposição está errada. O governo cometeu erros, o
partido cometeu erros, eu certamente cometi erros, e todos nós temos de pagar
pelos erros que cometemos, mas não se pode transformar o debate político numa
crise sem fim, em agressões a vidas pessoais. Não se pode permitir que a
política atinja esse nível. Mas, quando chega a isso, me afasto.’


ELEIÇÃO – ‘Se não conseguirmos equilibrar esse processo político, poderemos
ter problemas, não na economia, mas poderemos comprometer o próprio processo e o
ambiente de uma eleição positiva que nós precisamos e podemos ter no
Brasil.’


SEGURANÇA – Quero dizer a vocês que fiquem tranqüilos e seguros, que não só o
nosso trabalho mas também o presidente Lula está muito vigilante em relação ao
processo econômico e, mais do que isso, aquilo que está conquistado […] dá
garantia para que o Brasil e a nossa política econômica não sofram impactos
indesejáveis.’


IMPRENSA- ‘A imprensa brasileira é dinâmica, é aberta, é democrática, faz bem
ao Brasil, mesmo quando ela briga conosco. […] Porém, alguns colegas de
imprensa precisam prestar atenção no que dizem porque ofendem pessoas, agridem
famílias.’’


REDE GLOBO
Folha de S. Paulo


Faturamento da Globo cresce 4,7% em 2005


‘As empresas controladas pelas Organizações Globo registraram em 2005 uma
geração de caixa (Ebitda, lucro antes de impostos e amortizações) de R$ 1,368
bilhão, 10,7% a mais do que em 2004 (R$ 1,236 bilhão). Já o faturamento do grupo
cresceu 4,7%, para R$ 5,588 bilhões, contra R$ 5,339 bilhões em 2004.


Em seu comunicado, a Globo destacou ainda a redução de seu endividamento, que
caiu para US$ 1,164 bilhão, ante US$ 1,494 bilhão ao final de setembro do ano
passado -ou seja, diminuição de US$ 330,1 milhões em um trimestre. No dia 24, a
empresa antecipou o pagamento de US$ 70 milhões em bônus de sua dívida.


Segundo comunicado da empresa divulgado em inglês, o Ebitda da Net Serviços,
prestadora de TV por assinatura, teve queda de 66,4%, para R$ 59,4 milhões,
contra R$ 176,7 milhões de 2004.


Os dados são do balanço consolidado da Globo Comunicação e Participações
S.A., empresa resultante da fusão da TV Globo Ltda. e da holding Globopar, sob a
qual estavam os outros negócios do grupo.


De acordo com o comunicado, a audiência da TV Globo caiu no horário das 7h à
meia-noite. Entre todas as emissoras, sua participação era de 56% em dezembro de
2004, percentual que recuou para 53% no mesmo mês do ano passado. No horário
nobre (das 18h à meia-noite), a participação cedeu de 63% para 59%.’


TV DIGITAL
Humberto Medina


Europeu detalha proposta para fábrica no país


‘A União Européia detalhou ontem ao governo brasileiro sua contrapartida
industrial para a escolha do padrão DVB de TV digital. Foram entregues uma
carta, assinada pelo embaixador João Pacheco, chefe da Comissão da União
Européia no Brasil, e dois anexos: um projeto de implementação de
desenvolvimento de semicondutores (assinado por empresas como Philips, Nokia e
Siemens) e um com as propostas específicas de cada empresa. Esse último anexo é
confidencial.


Segundo Pacheco, duas empresas têm a intenção de instalar uma fábrica de
semicondutores no Brasil. ‘Há disposição de duas grandes firmas, ST
Microeletronics e Phililps, de fazer a fábrica, mas, para fazer uma fábrica,
precisam cumprir um certo número de etapas’, disse ele. Entre as etapas, está o
estudo de viabilidade, que define se vale a pena ou não, do ponto de vista
econômico, fazer a fábrica no Brasil.


Ainda segundo o embaixador, haveria também promessa de compra da produção
feita no Brasil. ‘O que nós podemos dizer hoje é que, da parte das empresas, há
intenção de avançar nessa direção [da construção da fábrica]. Não só as empresas
estão dispostas a criar a inteligência, o conhecimento aqui no Brasil, como
também estão dispostas a comprar a produção do Brasil’, afirmou.


Pacheco disse não poder detalhar as ofertas específicas de cada empresa.
‘Essa parte é confidencial. Mas há coisas mais concretas, e há disposição para
negociar.’


Pacheco aproveitou para convidar representantes do governo brasileiro a
visitar fábricas na Europa. ‘Na carta há um convite para que sejam vistas na
Europa as fábricas desse consórcio DVB. Assim dá para falar com os dois lados’,
afirmou. Anteontem, o ministro Hélio Costa (Comunicações) disse que os ministros
brasileiros viajariam, nos próximos 15 dias, ao Japão e à Coréia do Sul.


Em tese, o Brasil deve escolher entre os padrões (sistemas de transmissão)
japonês (ISDB), europeu (DVB) ou americano (ATSC) para a TV digital. Na prática,
entretanto, segundo a Folha publicou no último dia 8, já houve decisão pelo
padrão japonês. O padrão ISDB-T de modulação (transmissão) tem a preferência das
redes de TV brasileiras. Em ano eleitoral, o governo optou pelo padrão
defendidos pelas emissoras. Assim como os europeus, os japoneses também
prometeram a instalação de uma fábrica de semicondutores no país.


Nas partes da proposta européia que foram divulgadas, há pouca novidade em
relação ao já revelado. Os europeus oferecem empréstimo de 400 milhões para
financiar a instalação da TV digital e cooperação para pesquisa e
desenvolvimento. As empresas Nokia, ST Microeletronics, Thomson, Philips, Rohde
& Schwarz e Siemens demonstram, genericamente, como seriam as etapas para
implementação da fábrica: preparação de capital intelectual e humano, análise
das condições e viabilidade, preparação do ecossistema e implementação das
unidades de manufatura.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


Globo perde seu último braço em Portugal


‘A Globo perde na próxima sexta seu último tentáculo televisivo em Portugal,
país em que já dominou a audiência na TV aberta e em que esteve presente na TV
paga com cinco canais (dois Telecines, Sexy Hot, Canal Brasil e GNT).


O GNT português, último desses cinco canais ainda no ar no país, deverá ser
desativado no dia 31. O contrato da Globosat com a TV Cabo (Portugal Telecom),
maior operadora lusitana, vence nesse dia, mas não há indícios de que será
renovado. O motivo: a Portugal Telecom, que visa cortar custos de 1,5 bilhão nos
próximos três anos, propôs reduzir drasticamente o valor que paga pelo canal, e
a Globo não aceitou.


O GNT é um dos canais mais vistos em Portugal. Mistura programas da Globo
(telejornais, atrações de auditório e séries nacionais) com de canais da
Globosat (‘Manhattan Connection’).


As novelas são exibidas na aberta SIC, da qual a Globo já não é mais sócia. A
SIC perdeu a liderança de audiência. Nenhuma novela da Globo aparece mais entre
os cinco programas mais vistos.


O GNT soltou anteontem nota dizendo que ‘até o momento’ não foi contatado
pela TV Cabo. Disse também que está surpreso com a eventual troca de sua
programação pela da Record e que poderá recorrer à Autoridade da Concorrência (o
Cade de lá). No Brasil, a Globosat já começou a remanejar para outros canais os
15 funcionários do GNT português.


OUTRO CANAL


Infomercial A Globo é cheia de princípios comerciais. Não admite anúncios
estrelados por seu atores nos intervalos das novelas em que eles trabalham. Mas
transformou ‘Big Brother Brasil’ numa prateleira de mercearia de esquina.
Anteontem, a prova do líder da semana, um dos pilares do ‘reality show’, foi
nada menos do que um merchandising de uma marca de cola.


Levando O show do último programa de ‘Big Brother Brasil 6’, terça-feira,
será de Zeca Pagodinho _que empresta alguns de seus sucessos para a trilha
sonora de Agustinho, um dos favoritos.


Chiadeira É grande a insatisfação de afiliadas da Record com a matriz da
rede. Reclamam que perderam receitas publicitárias locais com as recentes
mudanças na grade (o ‘Jornal da Record’ foi sacrificado) e com a exibição de
novelas sem intervalos comerciais.


Amarelo Faltando quatro meses para a estréia de ‘Páginas da Vida’, próxima
novela das oito da Globo, Manoel Carlos está passando por problemas pessoais. A
mulher do autor se recupera de uma delicada cirurgia. E ele tem dedicado parte
de seu tempo a ela.


Lenda A piada da semana no mercado de TV e publicidade vem de novo do SBT:
Silvio Santos estaria usando um gravador para dar ordens a seus subordinados:
chama os executivos a uma sala, mas lá eles só encontram uma gravação com a voz
do ‘patrão’.’


MERCADO EDITORIAL
Rafael Cariello


Livrarias articulam lei contra descontos


‘Em reação à crescente presença e importância das grandes redes no mercado de
livros no Brasil, os donos de livrarias do país estão se articulando para
propor, até o fim do ano, uma lei para regulamentar o setor e impedir a
concessão de descontos agressivos na venda de livros.


As livrarias que se dedicam exclusivamente ao negócio do livro têm pelo menos
um inimigo declarado: a rede varejista francesa Fnac, que além de obras
literárias e de não-ficção vende CDs, DVDs e aparelhos eletrônicos, e sua
política agressiva de promoções -a cadeia, com lojas em grandes cidades
brasileiras, promove descontos de 20% em lançamentos do mercado editorial.


Segundo a ANL (Associação Nacional de Livrarias), que reúne cerca de 500
integrantes, outras lojas, que dependem exclusivamente do lucro obtido com os
livros, não têm como competir com essa prática das grandes redes, supermercados
e sites de venda na internet, que classifica como ‘predatória’.


Seu presidente, Eduardo Yasuda, defende a adoção no Brasil de algo que poderá
ser um mau negócio para o consumidor: a lei do preço fixo para livros,
instrumento já adotado em países europeus e na Argentina. Na França, onde a lei
surgiu em parte como reação ao crescimento da Fnac, o desconto máximo permitido
para lançamentos por um período de dois anos é de 5%. Em Portugal, o desconto
para lançamentos é regulamentado, pelo prazo de 18 meses, em no máximo 10%.


Yasuda afirma que a categoria está discutindo o melhor formato da lei para o
Brasil e que, nesse momento, tenta conquistar o apoio das editoras para sua
proposta. Em seguida, diz, apresentarão uma proposta de legislação. ‘A idéia é
que até o fim do ano a gente consiga’, afirma.


Ouvida pela Folha, a Fnac disse que ‘se coloca ao lado do consumidor na luta
pelo livro mais barato e pela diversidade’.


Rui Campos, diretor da Livraria da Travessa -uma das mais tradicionais do Rio
de Janeiro-, defende a adoção da lei, e explica que o lucro obtido com a venda
de lançamentos e best-sellers é importante para as livrarias médias e pequenas,
pois eles financiam a manutenção de uma oferta variada de livros que vendem
menos.


Se as grandes redes, que não dependem exclusivamente do lucro do livro para
sobreviver, puderem oferecer o desconto que quiserem nesses best-sellers e
lançamentos, ele diz, elas tornarão inviável a venda desses mesmos livros nas
simples livrarias.


Além disso, afirma, grandes redes conseguem impor um desconto maior na hora
da compra dos livros das editoras, já que têm muitos pontos de venda. Enquanto o
mercado em geral compra os livros com descontos de 40% ou no máximo 50% do preço
de capa, redes como a Siciliano, que ele cita, conseguem impor um desconto de
60% na hora da compra.


‘Na medida que empresas estranhas ao mercado livreiro puderem conceder esses
descontos, você estará fazendo uma sangria no mercado, você vai empobrecê-lo’,
afirma. ‘Quem tem só livraria não tem como bancar.’


Campos afirma que a concessão agressiva de descontos e a venda de pontos de
visibilidade para livros em vitrines e lugares nobres das lojas -prática de
grandes redes revelada pela Folha há dois domingos- constituem uma ameaça à
edição de livros de menor vendagem e, portanto, à variedade de oferta aos
consumidores. ‘O objetivo da lei [do preço fixo] é proteger a diversidade e a
existência de publicações as mais diversas. Protege o pequeno editor, o pequeno
autor. Não é apenas a livraria’, ele diz.


‘Acreditamos que promoções não implicam necessariamente em menor variedade de
títulos’, disse a Fnac, por sua assessoria de imprensa. ‘As promoções são mais
uma ferramenta na nossa luta para baratear o preço dos livros e aumentar o
acesso a eles.’


Marcelo Levy, diretor comercial da Companhia das Letras, diz que a lei do
preço fixo é um tema ‘muito controverso’. De toda forma, diz: ‘É possível que, a
curto prazo, uma política de descontos agressiva seja positiva para o leitor.
Mas, a médio prazo, ela pode ser nefasta. As livrarias que não conseguem
acompanhar essa política estão fadadas a ter dificuldades. Aí o leitor vai ficar
refém dessas empresas que trabalham com esses descontos’.’


Leila Suwwan


Venda de espaço em vitrines é prática corrente nos EUA


‘Nos Estados Unidos, a colocação de um livro em posição de destaque em
livrarias -aumentando o potencial de venda- faz parte de acordos de ‘publicidade
cooperativa’ entre lojas e editoras, prática aceita no setor porém pouco
divulgada para os consumidores. Essa prática também vem sendo adotada no Brasil
(e despertando polêmicas), como mostrou reportagem da Ilustrada no domingo dia
12.


Uma esquina de prateleira, uma das mesas centrais próximas das portas ou
escadas, ou um estande próprio nas grandes lojas, como a Barnes&Noble ou a
Borders, pode custar de US$ 1.000 (R$ 2.160) a US$ 10 mil (21,5 mil) por livro.
Esse é só um elemento do acordo.


‘A maioria das grandes editoras fornece uma quantidade de verba cooperativa,
geralmente 5% a 10% das vendas. As livrarias podem usar esse dinheiro como
quiserem, o que inclui o espaço de loja e anúncios de jornal’, disse à Folha o
especialista em marketing de livros John Kremer.


Assim como no Brasil, há resistência no setor para comentar o assunto e as
editoras fazem apenas queixas veladas, já que não consideram obrigação da loja
fazer publicidade. Todos os livros chegam às prateleiras, ao contrário do que
ocorre com produtos em supermercados ou músicas em estações de rádio.


Para as livrarias, trata-se de organizar o espaço de forma mais rentável.
Elas argumentam que os espaços nobres não são ocupados por produtos inferiores
e, por isso, os consumidores não estariam sendo iludidos. Mas críticos apontam
desvantagem para pequenas editoras que têm menos verba para marketing.


Internet


A prática também chega às vendas pela internet. Espaço de destaque nos sites
também é pago pelas editoras. No caso da Amazon, é possível pagar para que um
título apareça associado ao livro que o consumidor buscou, sob o título de
‘melhor valor’, com desconto para a compra casada.


‘Como a maioria dos revendedores, a Amazon.com aceita verbas cooperativas das
editoras para promover alguns títulos no site. Porém, nós não vendemos nossas
críticas e não dizemos que um livro é bom apenas porque é um título que tem
apoio de uma editora’, explicam os responsáveis no próprio site.


‘Eu não acho que os consumidores estão sendo prejudicados. Eles podem
encontrar os livros que procuram nas prateleiras’, diz Kremer.’


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