Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas.
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Folha de S. Paulo
Terça-feira, 16 de setembro de 2008
INTERNET
Em busca da conexão perfeita
‘A versão curta da história foi realizada em 1972, pelos humoristas ingleses do Monty Python. Numa esquete para o seu programa de TV, apresentaram o ‘All-England Summarize Proust Competition’. Como o nome diz, os participantes dessa espécie de concurso de calouros tinham que resumir os sete volumes da obra maior de Marcel Proust (1871-1922), ‘Em Busca do Tempo Perdido’, em 15 segundos.
A versão longa deve ocorrer, se tudo der certo, a partir do meio-dia (em Greenwich) do próximo dia 27, e pode se tornar o maior filme da história.
A artista francesa Véronique Aubouy pretende distribuir as milhares de páginas da obra entre desejados 3.000 inscritos no site do projeto (www.lebaiserdelamatrice.fr). Cada um será informado da página específica e do horário em que deve fazer a leitura, e todos juntos, diante de suas webcams espalhadas ao redor do mundo, comporão coletivamente um filme de aproximadamente 170 horas, a ser transmitido no mesmo endereço.
Até a manhã de ontem, já havia 881 pessoas inscritas, de todas as partes do planeta -a leitura, no entanto, terá que ser feita sempre em francês. Do Brasil, eram 34 inscritos.
Entre elas, o tradutor Sergio Flaksman e o fotógrafo e advogado Eduardo Muylaert. Cada participante pode escolher o local em que fará a leitura. Flaksman afirma que ainda não sabe onde acontecerá a sua, já que estará viajando pela Europa no período de realização do filme. ‘Onde estiver, ligo meu laptop e leio’, ele diz. Muylaert estará no Brasil, mas diz que também não pensou em um cenário específico. ‘Vou tentar encontrar o lugar mais bacana na hora.’
Muitos dos participantes dizem, em rápidos relatos para o site da artista, que não leram a obra completa. É o caso de Muylaert e Flaksman. O tradutor afirma ter lido os dois primeiros volumes, ‘No Caminho de Swann’ e ‘À Sombra das Raparigas em Flor’. Muylaert diz não ser ‘um grande leitor de Proust, como aliás a maioria não é’. ‘Ele é uma espécie de ilustre semidesconhecido.’
Ainda pairam dúvidas sobre a viabilidade do projeto. Fazer a reprodução completa de ‘Em Busca do Tempo Perdido’ parece ser tão difícil quanto resumir essa extensa obra sobre a relação entre memória, imaginação e realidade em apenas 15 segundos.
Num outro projeto, chamado ‘Proust lido’, Aubouy vem registrando desde 1993 a mesma obra do escritor francês. Já foram rodadas 77 horas de leitura de 789 participantes. A artista diz esperar concluir o trabalho até 2050. Trata-se de um ‘compromisso para a vida toda’, segundo ela.
No caso do projeto do próximo dia 27, Muylaert diz ter recebido um email de Aubouy em que ela pedia que os participantes conseguissem novos voluntários, e questionava: ‘Será que cada um de nós consegue mais um [leitor]? Será que a utopia vai virar realidade?’.
Há poucas semanas, um encontro entre os participantes do projeto foi marcado no mundo virtual Second Life. Nem Flaksman nem Muylaert participaram (a reunião, de toda forma, não era essencial para a organização da empreitada). ‘Para mim, isso é moderno demais’, diz Muylaert. ‘Recebi o convite para esse encontro nesse ‘outro mundo’, de realidade virtual, que não freqüento’, afirma Flaksman.
Até o final da semana passada, os participantes ainda não haviam recebido instruções sobre horário e trecho a ser lido.’
CAMPANHA
Projeto de internet de Marta gera dúvida
‘A candidata do PT à Prefeitura de São Paulo, Marta Suplicy, promete cobrir toda a cidade com internet sem fio gratuita num prazo de quatro anos. Mas o próprio comando da campanha reconhece que a universalização consumiria pelo menos oito anos, ou dois mandatos.
‘Vamos começar com os 3.000 prédios da prefeitura, mas isso é o começo. Depois vamos ampliar e, nesses quatro anos, vamos cobrir a cidade inteira. Para que a cidade de São Paulo possa ser uma cidade antenada’, disse Marta, em discursos no Sindicato das Costureiras de São Paulo e Osasco.
Um dos responsáveis pela elaboração do programa de governo do PT, Roberto Garibe explica que, para o primeiro mandato, a meta seria criar ‘ilhas digitais’, graças à instalação de antenas nos cerca de 3.000 prédios da prefeitura.
Em outros dois anos, o programa seria ampliado para os grandes corredores. Só depois atingiria toda a cidade.
‘Na primeira fase, dos quatro primeiros anos, vamos equipar todos os prédios públicos com WiFi. A idéia é que, em até seis anos ou mais, a gente consiga ampliar isso para toda a cidade’, disse Garibe.
Dependendo da topografia, cada antena teria raio de até 500 metros de alcance. O comando da campanha ainda não calculou quantos moradores seriam beneficiados pelo programa. Segundo Garibe, a idéia é oferecer o serviço em escolas, bibliotecas e telecentros, contemplando também os vizinhos de prédios públicos.
O programa, segundo Garibe, custaria R$ 64 milhões em quatro anos, incluindo manutenção e fiscalização. Garibe, no entanto, não sabe quanto seria necessário para garantir acesso do usuário à internet. ‘Vamos comprar isso no atacado e negociar o preço. Queremos fazer isso em parceria com o setor privado. Temos sinalização de que há interesse em fazer.’
Para garantir cobertura, Garibe aposta não só no apoio do setor privado mas na ‘evolução da tecnologia’. ‘Há possibilidade de que, numa parceria público-privada, a gente consiga futuramente preencher esses espaços que os prédios públicos não vão preencher.’
Classe média
Lançada pela campanha de Marta -que pretende conquistar espaço na classe média- a promessa é estrela na campanha de TV. Ontem, numa entrevista para um site, o prefeito e candidato à reeleição, Gilberto Kassab (DEM), prometeu ampliar o serviço de telecentro. Marta reagiu, acusando-o de copiar suas propostas.
O comando da campanha de Geraldo Alckmin lançou dúvidas sobre a viabilidade da proposta. O deputado tucano Júlio Semeghini diz que o PT ‘parece não saber exatamente o que fazer’. ‘É como se tivessem lançado só para aparecer como autor da proposta.’
Segundo ele, é necessário um estudo que beneficie apenas as comunidades mais carentes. ‘Se for em prédio público, no centro, o PT vai subsidiar a classe média e empresas.’’
TODA MÍDIA
Unasur, Unasul
‘Os sites dos chilenos ‘El Mercurio’ e ‘La Tercera’ ecoaram pela América Latina à espera da Unasul, que abriu encontro ‘após a chegada de Chávez e Lula’. O líder do partido de Michele Bachelet, na submanchete do ‘El Mercurio’, dizia que ‘a reunião da Unasul é a prova de fogo da América Latina’, se a região ‘quer ser respeitada no concerto global’.
Para a cobertura chilena, a presidente ‘encabeçou’ a cúpula e buscou ontem ‘aproximar as posições de Chávez e de Lula’. Já no enunciado do espanhol ‘El País’, ‘Lula toma as rédeas da crise boliviana’, contra ‘ingerências externas’ e também os ‘insultos aos EUA’. E no argentino ‘La Nación’, foi uma ‘chance para o Brasil mostrar seu peso’.
‘BRAZIL’
Na capa do ‘Boston Globe’, a chamada de ontem para a crise e o ‘presidente Evo Morales do Brasil’
NOMES…
O dia todo, até a escalada do ‘Jornal Nacional’, a Globo evitou a expressão Unasul, falando em ‘presidentes sul-americanos’. Também vetou ‘massacre’ para descrever o massacre de Pando.
AOS BOIS
Já a Folha Online trazia na home, ao longo do dia, o título ‘Bolívia prende suspeitos de massacre; Morales participa de reunião da Unasul’. UOL e outros sites já se arriscam por trilha semelhante.
CORPOS EM EXIBIÇÃO
Na manchete do site da Agência Boliviana de Informação, até começar a Unasul, prosseguiam as denúncias de Pando, falando-se já em morte de ‘crianças’.
E na manchete on-line do jornal ‘La Razón’, a abertura de processo contra o governador de Pando, pela violência que levou dezenas à morte.
‘11 DE SEPTIEMBRE’
Início da noite e o chileno ‘El Mercurio’ deixou de lado a cobertura extensiva da Unasul para abrir, em manchete, ‘Bolsa de São Paulo anota sua pior queda desde o 11 de Setembro de 2001’. Era também o enunciado por aqui, da Folha Online ao ‘Jornal Nacional’.
Começando pela Reuters Brasil e avançando pela TV, Globo inclusive, a cobertura correu depois para o ministro da Fazenda e para o presidente do Banco Central, atrás de palavras de conforto. Eles saíram dizendo que o país ‘está preparado’ ou ‘se preparou’.
TRÊS DOS BRICS
O pouco que se lia de Brasil, no exterior em crise, reunia os ‘emergentes’ todos. Suas ações ‘mergulham’, avisava um enunciado no ‘Financial Times’. Sofreram ‘pressão especial’ os exportadores de commodities, ‘como a Rússia e o Brasil’, e os dependentes de capital externo, ‘como a Turquia’.
No Market Watch, a queda de ‘Rússia, Índia e Brasil, três dos Brics’.
BRASIL GARANTE?
Por outro lado, o UOL deu no alto da home, do blog de Fernando Rodrigues, que ‘agora até os papéis do Brasil poderão ser usados como garantia para bancos dos EUA tomarem empréstimo do Fed’. É que uma das medidas definidas pelo banco central americano, no fim de semana, permite usar títulos com ‘grau de investimento’, caso do Brasil, para tomar dinheiro de curto prazo.
A PRÓXIMA VÍTIMA?
Nos EUA, as manchetes on-line também anunciavam, no fim do dia, a maior queda na Bolsa de Valores de Nova York desde o 11 de Setembro.
A começar do ‘FT’, no entanto, com o enunciado ‘Fed abre negociações sobre a crise na AIG’, seguida pelo ‘New York Times’ com ‘Fed toma os primeiros passos para ajudar a AIG’, as atenções se voltaram no início da noite para a maior seguradora dos EUA. Mais um pouco e a agência de classificação Standard & Poor’s cortou a nota da AIG, cujas ações desabaram 61%, só ontem -e a sigla do American International Group foi parar na manchete do ‘Wall Street Journal’.
Enquanto isso, o Market Watch já mostrava a abertura na Ásia, com Japão e Coréia do Sul em queda, por conta do ‘derretimento dos bancos de investimento’ e das ‘perspectivas incertas da AIG’.
SEIS OBAMAS OU MAIS
As bizarrices da campanha municipal foram parar ontem no ‘Guardian’, com a reportagem ‘E agora, os Obamas do Brasil -os seis’. Dizendo ‘Bem-vindo à Obamamania à brasileira’, o correspondente conta ao menos seis que mudaram de nome para tentar alguns votos à custa do americano. Na foto, Henrique dos Anjos, que explica a troca dizendo que o confundiam com o Obama original’
DITADURA
Fotos mostram corpos de guerrilheiros do Araguaia
‘Jamais encontrados, os corpos de dois guerrilheiros do Araguaia estiveram em poder de militares, revela uma seqüência de fotos cujos negativos foram obtidos pela Folha. As fotografias mostram três homens do Exército junto aos cadáveres. Elas exibem ainda a chegada do helicóptero militar que os tirou da selva, a arrumação dos cadáveres em lonas e a partida do helicóptero.
Um dos corpos seria do médico João Carlos Haas Sobrinho, um dos líderes da guerrilha do PC do B. O outro cadáver não está identificado. É possível que seja do guerrilheiro Ciro Flávio Salazar de Oliveira, morto no mesmo combate que vitimou Haas, em 30 de setembro de 1972. Parte das fotos não é inédita. Algumas já foram publicadas em livros e na imprensa nos últimos 20 anos, mas de forma isolada, sem o encadeamento proporcionado pelos negativos. Agora é possível saber a cronologia dos fatos.
Os negativos estão há 36 anos com o ex-sargento do Exército José Antônio de Souza Perez, 60, que mora em Patrocínio, cidade com cerca de 85 mil habitantes no Triângulo Mineiro. Ele diz tê-los recebido de um colega soldado, do qual não lembra mais o nome. Conta que as fotografias foram batidas no Pará, na margem esquerda do rio Araguaia, em um acampamento improvisado na selva amazônica, onde os dois trabalharam ao longo de 1972.
Procurados pela Folha, o Ministério da Defesa e o Exército informaram que não se pronunciariam sobre as fotos.
A guerrilha rural na região do Bico do Papagaio (sudeste do Pará, sul do Maranhão e norte do então Estado de Goiás, hoje Tocantins) foi organizada pelo então clandestino PC do B, a partir da segunda metade dos anos 60. Iniciada em 1972, a repressão militar terminou três anos depois. Houve poucos sobreviventes. Os historiadores estimam que cerca de 60 guerrilheiros foram mortos pelos militares. Apenas um corpo foi identificado, o de Maria Lúcia Petit, assim mesmo passadas duas décadas da morte.
O recolhimento
O ex-sargento Perez lembra que estava no acampamento quando a equipe que comandava recebeu uma mensagem por rádio. A informação passada era de que em breve seriam levados até o local corpos de guerrilheiros mortos há pouco em confronto.
Os dois cadáveres chegaram ao local conduzidos por fuzileiros navais amarrados pelos pés e mãos em ripas de madeira. Juca foi logo identificado, por causa do diário que carregava. A outra vítima do confronto não tinha qualquer indicação de identidade. Perez nunca soube de quem se tratava.
Para remover os corpos, aterrissou no acampamento um helicóptero militar. Fuzileiros e militares do grupo de Perez trabalharam na preparação dos cadáveres, envoltos em lonas listradas e colocados no aparelho, que decolou em seguida.
Na opinião do ex-sargento, o helicóptero seguiu possivelmente rumo à base militar instalada no campo de pouso de Xambioá, cidade na margem direita do Araguaia, em então área de Goiás. Ele afirma que nunca mais soube dos corpos.
A publicação das fotos ao longo dos anos é um mistério para Perez. Ele imagina que a origem pode ter sido o soldado que bateu as fotografias e era o dono da câmera, levada de modo clandestino para o Araguaia, pois os praças eram proibidos pelo oficialato de registrar cenas de combate.
Ele também presume que, em algum momento, as fotos podem ter sido apreendidas por algum oficial, que, anos depois, as teria divulgado de maneira anônima. Perez ficou com os negativos para tirar cópias de fotos em que posava. Ele conta que, por causa de circunstâncias do trabalho na mata, jamais teve a chance de devolvê-los ao dono.
Xambioá
O cadáver de João Carlos Haas Sobrinho, o dr. Juca, foi visto em Xambioá depois de trazido da selva pelo helicóptero militar, conta a jornalista e pesquisadora Myrian Luiz Alves. Moradores da pequena cidade na margem direita do rio Araguaia -hoje Estado do Tocantins- mostraram a ela até o local do sepultamento.
Em 1972, os militares conseguiram matar oito guerrilheiros, três deles no dia 30 de setembro. Eram Juca, Ciro Flávio Salazar de Oliveira, o Flávio, e Manoel José Nurchis, o Gil.
A revelação dos negativos obtidos pela Folha mostra o corpo que seria de Juca ao lado de um outro, de estatura menor. Dados corporais em poder da pesquisadora indicam que Juca media, quando tinha 18 anos, 1,82 m de altura. Gil media cerca de 1,75 m; Flávio, já adulto, media de 1,65 m a 1,70 m.
De acordo essa medição, o mais provável é que a outra vítima mostrada na foto tenha sido Flávio, mineiro de Araguari, ex-líder estudantil e aluno da da Faculdade de Arquitetura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Tinha 28 anos quando foi morto.
Nos anos 90 e no início desta década, expedições de parentes e pesquisadores a Xambioá encontraram o local onde Juca teria sido enterrado. Uma ossada chegou a ser retirada da suposta sepultura de Juca em 1996, mas nunca houve conclusão a respeito da identificação desses restos mortais.
Autor de ‘A Guerrilha do Araguaia: a Esquerda em Armas’ (editora UFG, 1997), o historiador Romualdo Pessoa Campos Filho disse à Folha que a descoberta dos negativos que mostram integrantes das Forças Armadas ao lado de dois cadáveres ‘é um prova contundente de que os militares’ estiveram ‘com os corpos dos guerrilheiros’.’
TELEVISÃO
Record amplia jornal no ‘quintal da Globo’
‘A Record vai investir R$ 5 milhões na construção de uma nova redação no Rio de Janeiro. A redação será uma ‘news room’, também servirá de cenário para telejornais. Segundo a emissora, terá capacidade para abrigar 120 jornalistas.
A estratégia da Record é fortalecer seu jornalismo no ‘quintal da Globo’, como seus executivos se referem ao fato de o Rio ser a sede de sua principal concorrente.
Ao lado de São Paulo, o Rio é a cidade onde a TV do bispo Edir Macedo mais cresceu no Ibope nos últimos anos.
O crescimento da audiência dos telejornais da Record, principalmente do ‘Balanço Geral’, que no Rio é apresentado por Wagner Montes, ex-jurado de Silvio Santos, chamou a atenção da Globo. Dirigentes da Globo já vêem mais do que dinheiro da Igreja Universal por trás desse crescimento. Reconhecem algum mérito, como o apelo popular. O assunto foi discutido recentemente pela cúpula da emissora.
Uma pesquisa encomendada pela Record aponta que o telespectador carioca vê nela um jornalismo ‘mais independente’ e de ‘maior credibilidade’, principalmente na figura de Wagner Montes.
Além da nova redação, a Record promete contratações de profissionais e a compra de novos equipamentos para o Rio.
A atual redação será reformada para se transformar em estúdio do ‘Balanço Geral’.
DEFEITO 1
Todas as emissoras estão em queda no Ibope de São Paulo neste mês. Isso já era esperado com a Globo e a Band, que cresceram em agosto por causa da Olimpíada. A Globo caiu de 18,2 pontos, na média das 7h às 24h, para 16,7 nas duas primeiras semanas de setembro.
DEFEITO 2
A Record retraiu de 7,6 pontos para 7,5. O SBT está com média diária de 6,3 pontos, contra 6,9 em agosto. Assim, voltou a se distanciar da Record na disputa pelo segundo lugar. No Ibope nacional (só até 10/ 9), o movimento é semelhante.
DEFEITO 3
No caso do SBT, a queda é atribuída à estréia do feminino ‘Olha Você’. Para todas as emissoras, o horário eleitoral gratuito é o grande vilão.
GENTE QUE FAZ
A Globo responde ao barulho da Record. Lançou uma edição especial de sua revista dirigida ao mercado publicitário na qual ‘50 anunciantes de todo o Brasil contam como investiram e lucraram com a Globo’.
TENSÃO
Promete não ser fácil a vida de Grazi Massafera, protagonista da próxima novela das seis, de Miguel Falabella _que nunca escondeu seu desconforto com ex-big brothers que viram atores. O autor a mandou regravar uma cena em que se saiu muito melhor em teste.
ATAQUE
Sem os direitos do Campeonato Brasileiro, a Record está em campanha contra a CBF. Estreou domingo uma série de reportagens sobre a ‘falência do futebol brasileiro’.’
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O Estado de S. Paulo
Terça-feira, 16 de setembro de 2008
DOCUMENTÁRIO
Filme quer denunciar violência policial
‘Violência Extrapolada é o título que deve batizar o documentário da jornalista Ali Rocha sobre os ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) e a reação policial, em maio de 2006. O trabalho, em fase de captação de recursos, deve ser, segundo ela, ‘um retrato da impunidade’ e do ‘extermínio de pobres pela polícia’.
Ali disse que outros diretores produzem dois filmes sobre o episódio, com outras abordagens e ares de ficção. ‘É como no caso do Tropa de Elite.’ No entanto, a idéia dela é ser fiel à realidade. Desde maio de 2006, ela acompanha as investigações das mortes e a vida de algumas famílias de vítimas.
‘Minha idéia é acompanhar casos emblemáticos. Um deles é de uma menina grávida de 9 meses, morta com o marido, ex-traficante. Segundo testemunhas, eles foram abordados por uma viatura descaracterizada. Antes de ser morto, ele pediu que não a matassem. Ela levou um tiro na barriga e um na cabeça.’
Além de reconstruir aqueles dias, ela pretende fazer revelações: ‘Quero mostrar que aquele toque de recolher foi fabricado pela polícia, com o objetivo de sair para rua e se vingar. Naquela noite, registrou-se o maior número de mortes: 117 pessoas.’’
LITERATURA
A utopia de um melancólico
‘Conta-se por aí que, no dia 29 de setembro de 1968, Sérgio Porto e Stanislaw Ponte Preta chegaram juntos ao céu. Ambos sofreram um infarto na mesma hora. Segundo se imagina, estando lá em cima eles puderam acertar as contas pendentes. Uma delas era a confusão corriqueira que se fazia com os dois: Sérgio e Stanislaw eram a mesma pessoa. Que grande equívoco! Quase 40 anos após sua morte, Sérgio Porto deixa como legado a idéia de que é possível apostar na imaginação e no humor como projetos humanistas. Ele é o criador de Stanislaw Ponte Preta, personagem do qual se tornou escravo por conta do sucesso.
Essa é a opinião da historiadora Cláudia Mesquita, autora da biografia De Copacabana a Boca do Mato: O Rio de Janeiro de Sérgio Porto e Stanislaw Ponte Preta (Edições Casa de Rui Barbosa, 332 págs., R$ 20), que será lançada na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio, hoje, às 17 horas. Cláudia participa de debate com Ângela Porto, uma das três filhas de Sérgio, a historiadora Isabel Lustosa e Paulo Roberto Pires, editor da Agir, que está relançando as obras do jornalista carioca. A Revista do Lalau, com textos inéditos e dispersos, chega às livrarias no fim deste mês.
Cláudia desenvolveu a tese de que, em vez de pseudônimo, Stanislaw é o heterônimo (por ter personalidade distinta) de Sérgio, com o qual sintetizou duas culturas, a da zona norte (Boca do Mato) com a da zona sul (Copacabana), e dois cariocas, o solar (o homem de praia) com o noir (o cronista da noite).
‘Com o heterônimo, Sérgio Porto uniu uma cidade que começava a ser tornar ?partida? pela modernização do Rio’, diz Cláudia. A solidariedade, vencida pelo crescente egoísmo, deixou de ser prática cotidiana para se tornar utopia do passado. E objeto de idealização, fenômeno que permanece até hoje: os anos JK e o advento da bossa nova são lembrados como o momento exemplar de um país otimista e feliz. ‘Mas nem tudo era felicidade’, ela diz. ‘Talvez a explicação para essa visão atual esteja na necessidade de se voltar ao passado para fugir do presente’, arremata.
Quando Cláudia Mesquita diz que o Rio é um espaço dividido, ela se refere ao livro A Cidade Partida, do jornalista Zuenir Ventura. Durante 10 meses, ele freqüentou a favela de Vigário Geral e acompanhou a mobilização da sociedade civil contra a violência, o que resultou no movimento Viva Rio. Asfalto e morro se encontravam para se aniquilar. Cláudia diz que a separação abissal entre zona sul e subúrbio, microcosmo do que ocorre em território nacional, começou com a transferência da capital para Brasília, em 1960, mesma época da criação da ‘cultura do carioquismo’. ‘A mudança da capital provocou a vontade de criar uma identidade carioca, era uma compensação pela perda do status’, ela explica.
Nos anos 1950, com a modernização da imprensa brasileira, os cronistas ganharam uma legitimidade inédita. ‘Sérgio Porto era o mais carioca dos cronistas.’ Mas a consolidação do carioquismo precisou de ‘estrangeiros’: Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, (mineiros), Rubem Braga (capixaba), Nelson Rodrigues (pernambucano), entre outros.
Stanislaw Ponte Preta foi criado no Diário Carioca, em 1953, para substituir Jacinto de Thormes, um colunista social. A condição de Sérgio Porto era escrever com liberdade e sob um pseudônimo. ‘Achava que, acima de tudo, devia ser petulante para competir com os cronistas mundanos que, por mais importante que fosse a notícia a publicar, falavam de si mesmos antes de dar a notícia’, ele explicou no prefácio de Tia Zulmira e Eu.
‘Minha intenção era encontrar o Sérgio Porto por trás do Stanislaw Ponte Preta’, diz Cláudia. E o que ela encontrou foi um homem lírico e nostálgico com a Copacabana onde morou a vida toda (na mesma rua e número, no 53 da Leopoldo Miguez), invadida pelos prédios com quitinetes e desbancada como bairro da moda pela ‘República de Ipanema’. ‘Ele viu a modernização com angústia, com sentimento de perda.’ Assim ele se revelou em A Casa Demolida e As Cariocas, livros de crônicas.
De Sérgio Porto pode-se dizer o que Brás Cubas, personagem de Machado de Assis, disse sobre si mesmo: ele escreveu com a pena da galhofa e a tinta da melancolia. A posteridade, no entanto, está acostumada a prestar atenção somente à sua pena. Ou, para ser mais preciso, à sua Olivetti, máquina de escrever da qual tirava o olho só para pingar colírio, assim ele se referia ao excesso de trabalho, que aumentaria se não tivesse morrido, ao 45 anos, antes de o AI-5 ser instituído em dezembro de 1968. Stanislaw passou a esconder um homem cada vez mais triste e indignado com a ditadura militar, segundo Cláudia. E a boa notícia nessa história é que, depois, lá no além-mundo, Sérgio Porto promoveu outra conciliação, agora com o seu personagem. Um humanista, ele perdoou Stanislaw Ponte Preta, aquele por quem se deixou ‘gostosamente destruir’.’
INTERNET
Saramago entra na era da internet
‘O escritor português José Saramago, de 85 anos, extrapola os limites físicos dos papéis para expressar opiniões e se comunicar com os leitores. O autor, Prêmio Nobel de Literatura, acaba de inaugurar o espaço O Caderno do Saramago no site de sua fundação: www.josesaramago.org. No texto Palavras de Uma Cidade, Saramago apresenta um artigo classificado por ele como ‘uma carta de amor’ a Lisboa. Também é possível assistir a um vídeo com fotos e trechos do artigo principal. José Saramago acaba de terminar seu novo livro, A Viagem do Elefante, que ainda vai ser lançado. Há um trecho da nova obra no novo site.’
TELEVISÃO
HBO produz mais 2
‘Após se destacar com a realização de séries brasileiras de ação e drama, como Mandrake e Filhos do Carnaval, a HBO terá em 2009 duas produções ‘Made in Brazil’ com foco no humor. Foi o vice-presidente executivo de Aquisições e Produções Originais da HBO Latin America, Luis Peraza, quem contou a boa nova ao Estado.
Cada seriado terá meia hora de duração – mais uma novidade, pois o canal só produziu até hoje séries com episódios de uma hora. Misterioso, Peraza não quis adiantar os nomes dos trabalhos. Apenas entregou que eles devem ir ao ar na metade do ano que vem.
O executivo aproveitou para deixar claro que a HBO não deixará de fora de seu cardápio as séries dramáticas e já trabalha com mais três novos projetos de seriados nacionais do gênero.
Peraza também contou que no final deste ano será lançado o DVD de Mandrake, com todos os 13 episódios do primeiro e segundo ano da série. Será o primeiro DVD de uma produção brasileira da HBO.
Neste domingo, dia 21, estréia Alice, terceiro drama do canal fechado. É a primeira produção original da HBO gravada em São Paulo.’
ONIPRESENTE
Lula é nosso único acontecimento
‘Quando eu comecei a escrever em jornal, há 17 anos (santo Deus…), fiz um juramento de que nunca começaria um artigo com a célebre frase: ‘Estou diante da página branca, em busca de um assunto…’ E cumpri a promessa, querido leitor. Jamais fiz isso. Mas, hoje, não sou eu quem está sem assunto; é o Brasil. Parece não acontecer mais nada no País. Como se explica isso?
Bem, é que Lula é o único acontecimento. Ele se apropria do que acontece e interpreta-o em seu interesse. Pode transformar acontecimentos em não-acontecimentos e vice-versa. Pode transformar o nada em fato e o fato em nada. Com seu carisma e marketing constante, joga uma nuvem de poeira nos olhos do País.
Ele entendeu que basta apoderar-se dos defeitos e cacoetes políticos do Brasil e saber manobrá-los para tudo marchar como ‘normalidade’. Apesar de crises de ‘fais divers’, nunca o Brasil pareceu tão normal. Com a economia bombando, como ele teve a sensatez de manter a boa política econômica do governo anterior, basta a Lula manter a imagem do funcionamento político normal, aceitando as anormalidades como normais, aceitando vícios dos poderes como fatos inevitáveis e, sabe ele, nem tão danosos à sua administração. Lula fatura como seus todos os acertos do governo anterior e jogará seus erros nos ombros de quem vier depois, disse uma vez Dora Kramer. O que me dói neste governo é o que ele poderia estar fazendo com a imensa grana que entrou com esta bonança e com as alianças que teceu. Mas, grandes mudanças e reformas essenciais dariam muito trabalho, desgastes, e Lula não quer aporrinhação. Ele conseguiu ficar fora de todos os escândalos que os babacas bolchevistas aprontaram. Saiu limpo e mais branco ainda, com o OMO da impunidade.
Sejamos justos; Lula merece elogios. Ele tem sido sensato, aqui e na América Latina, quer fazer algo pelo Brasil, sim, trouxe o conceito de fome e pobreza para a agenda administrativa e tem sido democrático.
Mas, este artigo trata mais de sua genialidade política. Aí, sim. Trata-se de um Maquiavel espontâneo, forjado na luta dura da viagem entre as classes sociais.
Ele aparece todos os santos dias na TV, rádio e jornais, pois descobriu o Brasil real e aí está seu gênio – descobriu algo que ninguém viu antes: que o Brasil não precisa de governo; basta parecer que tem. Ele entendeu que não existe uma meta a priori, desistiu de qualquer idéia de atingir uma síntese. Esta é a grande dificuldade de se analisar seu governo. Os comentaristas típicos partem de uma premissa de progresso no futuro e esperam que ela seja cumprida na prática. Mas nós não conseguimos concluir nada. Afinal, é bom ou ruim? Ninguém tem certeza. Lula não trabalha com isso. Acha isso uma bobagem ‘modernista’. Seu projeto é ele mesmo. Ele deixa o Brasil andar sozinho e não mexe no essencial. Ele raciocina indutivamente caso a caso, sem grandes projetos totalizantes.
Lula adotou como atitude o sentido da ‘cordialidade’ que Sérgio Buarque de Holanda descreveu. Como a classe dominante do Nordeste, da qual ele foi a vítima, Lula usa o jeitinho do ‘homem cordial’ para si mesmo. ‘Aos amigos aliados, tudo’; tolerância até com os macarrões de um Severino para governar em paz. Ele sabe que tudo se esquece. Quanto à Lei e questões institucionais, ele não liga muito. Não fere a lei, mas tolera que seus sórdidos aliados o façam, como se dissesse: ‘É o Brasil, que que se vai fazer?’
E, atenção, inimigos meus, vou dizer uma frase polêmica: talvez só essa velha cordialidade ibérica nos preserve uma louca e tropical ‘democracia’. Lula usa isso.
Lula desmoralizou os escândalos, tolerando-os. Ele não é malandro nem desonesto, mas tem sensibilidade para o que o Brasil quer ver.
Este é o outro tema deste artigo: Lula como ator. Sim. Até hoje só foi enfrentado por outro gênio do palco: Roberto Jefferson, que até lhe fez o favor de livrá-lo dos bolchevistas psicopatas que o impediam de governar. Agora, só tem tarefeiros e pelegos na boquinha, mas que não fazem tanto mal quanto os ‘dirceuzistas’, que nos jogariam na vala da Argentina.
O Lula-ator tem o selo de legitimidade de sua vida de operário. Tudo bem. E ele passa habilmente a ‘sabedoria’ que o sofrimento lhe deu, a paciência diante das crises: ‘Calma, pequeno-burgueses!… Eu sei o que é a vida, já passei por coisa pior!’ Lula desqualifica qualquer seriedade dramática com brincadeiras populares, como o Corinthians, o dedo cortado, o Brasil comparado ao Sítio do Pica Pau-Amarelo, o mar salgado de xixi. Mas, se precisar, ele fala sério com a bruta indignação do sindicalista vítima do ‘sistema’, assim como pode ser tranqüilo e debonaire na reunião da Febrapam ou sereno com reis e duques. É um crack. Só vi o Lula perder o prumo no auge do mensalão, quando temeu por si. Ali, suas sobrancelhas se arquearam de verdade e seus olhos giraram para cima, nas órbitas. Ali, ele teve medo mesmo de ser jogado de volta ao passado de pobreza e marginalidade. Já na campanha da reeleição, com a subida do Alckmin, ele arregaçou as mangas, mandou fazer um palanque de passarela como o do Mick Jagger e botou para quebrar. Era um leão acuado que ganhou de goleada.
Esta multiplicidade de cores, cambiantes, velozes como as lulas, é sua maior munição.
Quando se zanga, dá medo. Quando ri, é uma graça – suas covinhas são irresistíveis, nos acalmam, nos desmobilizam; suas piadas, mesmo sem graça, tiram a tragicidade de crises.
Isso tudo, sem falar no seu ‘design’ perfeito: barriguinha, um Getúlio barbadinho, simpaticíssimo, o nome de fácil legibilidade como ‘Pelé’… em suma, um craque.
E tem mais; o País é tão ‘imexível’, tão duro de roer, tão resistente a qualquer cirurgia ou reforma, que talvez Lula tenha razão em sua tática de ciência política…’
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