Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Futuros leitores perdidos

A seção ‘Carta ao leitor’ da Veja, que expressa a opinião do veículo, equivalente aos editoriais dos jornais, demonstra toda a parcialidade covarde com que um veículo de comunicação pode operar. A edição de 8 de setembro (nº 1.870) é emblemática. Na página 9, sob o título ‘Sete de Setembro Vermelho’, a ‘Carta ao leitor’ traz uma crítica despudorada ao MST, mirando suas ofensas, desta vez, no método de ensino praticado nas escolas dos acampamentos do movimento. São 1.800 escolas de ensino fundamental, das quais 1.000, informa o texto, instituições públicas. O que torna essas escolas um problema, segundo Veja, são certas ‘peculiaridades’ nas lições repassadas ao sem-terrinha.

Versos satânicos

Crianças de 7 anos de idade, que em 7 de setembro fazem do Grito do Ipiranga o Grito dos Excluídos, são, realmente, preocupantes para a elite financiadora da Veja. Afinal, são esses mesmos mantenedores que enriquecem com as fábricas de diplomas e apodrecem a educação do país. Para eles, comemorar o nascimento de Karl Marx e a morte de Che Guevara, depois de séculos de domesticação cívica, cultuando a ordem e o progresso, deve ser realmente um jogo perigoso. Os 160 mil alunos incomodam a Veja porque crianças ‘forçadas’ a abandonar as lúdicas cantigas de roda para entoar gritos de revolução, que montam teatrinhos com peças abominando os transgênicos, em vez de encenarem os contos de fada importados do Primeiro Mundo, que cultuam o dia dos brasileiros excluídos, e ignoram o halloween americano, dificilmente se tornarão futuros leitores da Veja.

O mercado editorial é uma selva, e a Veja, uma velha raposa, que sabe que o ‘bom’ leitor se forma ainda pequeno. Por não se tratar de criadouros de futuros leitores desse tipo de imprensa, as escolas dos acampamentos do MST são taxadas de nocivas pelo semanário. Nocivas, diz a Veja, porque além de jogarem às favas uma das funções capitais do Estado, que é fornecer ensino básico às nossas crianças, ainda inculca nesses jovens uma ideologia revolucionária. E esta deve ser a palavrinha que tanto preocupa a Veja: revolução. E como boa cerceadora do livre pensamento que é, a Veja não ficou apenas na ‘denúncia’. ‘Os campos de doutrinação do MST precisam urgentemente ser vistoriados pelo governo brasileiro, e seus currículos, submetidos a algum tipo de avaliação pelo Ministério da Educação’, sugeriu.

Para veículos desse tipo, o importante são escolas que formem consumidores cuja única identidade que lhes conferirá cidadania seja o cartão de crédito. Os demais viram notícia. Concluindo suas bravatas, Veja ‘alerta’ para o risco de se ignorar que em vez de civismo essas escolas estão ensinando a milhares de brasileiros os rudimentos da revolução marxista. Um ultraje, verdadeiros versos satânicos para quem dá as cartas na sociedade do fetiche e do darwinismo social. Que o MST forme bons alunos!

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Estudante de Jornalismo da Ufal, Alagoas