Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

G-20, leilão de milho e Silvio Santos

Falar em guerra ou desordem cambial depende da avaliação de cada um, mas um fato é indiscutível: a principal questão da conferência de cúpula do Grupo dos 20 (G-20), encerrada em Seul na sexta-feira (11/11), continua sem solução. O comunicado final foi pouco mais que uma repetição dos compromissos assumidos nos últimos dois anos. Apesar disso, tentou-se em todas as coberturas mostrar algum avanço. A tese do ministro Guido Mantega foi valorizada nas matérias dos maiores jornais brasileiros: a reunião serviu pelo menos para o reconhecimento geral do problema e para uma discussão mais aberta e direta. Houve quem chamasse a atenção para o compromisso, assumido por todos os chefes de governo, de levar a sério a avaliação de políticas de cada governo, coordenada tecnicamente pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).

Tudo bem, mas faltou ressalvar alguns pontos importantes. O debate sobre a questão cambial já foi bastante aberto na última assembleia geral do FMI, em outubro. De fato, foi o assunto mais importante daquela semana. Em segundo lugar, o chamado Processo de Avaliação Mútua (conhecido pela sigla MPA, de Mutual Assessment Process) foi combinado em setembro do ano passado, em Pittsburgh, pelos líderes do G-20. No mês passado, durante a assembleia anual, o diretor-geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, apresentou o primeiro relatório num encontro fechado dos ministros de Finanças. É bom levar em conta detalhes desse tipo, para não apresentar o assunto como novidade. Descontados esses pontinhos e alguns outros pontinhos – como alguma interpretação exagerada de palavras da presidente eleita Dilma Rousseff –, a cobertura funcionou.

Inflação e dólares

Enquanto os governos do G-20 preparavam sua reunião em Seul, o IBGE divulgava um novo salto da inflação brasileira – 0,75% em outubro, a maior taxa para esse mês em oito anos. Qual a relação entre G-20 e a inflação no Brasil, puxada principalmente pelo custo da alimentação? A maior parte dos jornais omitiu, desprezou ou reduziu a quase nada essa parte da história. A alta dos preços da comida não é um fenômeno só brasileiro, mas internacional, e decorre não só de uma oferta menos folgada de produtos agrícolas. As cotações têm aumentado também por causa do excesso de dinheiro em circulação nos maiores mercados e das taxas de juros muito baixas, próximas de zero nos Estados Unidos e em vários países desenvolvidos.

Quando os juros caem ou permanecem baixos por muito tempo, os fundos e outros grandes participantes do mercado financeiro deslocam suas aplicações para ações, imóveis e produtos básicos, como alimentos e minérios. Usa-se a denominação de ativo real para qualquer bem como esses, para diferenciá-los dos ativos financeiros, como títulos públicos e contas de poupança. Produtos agrícolas podem valorizar-se mesmo quando a oferta é abundante, se o ganho proporcionado pelos juros for muito baixo e não houver sinal de risco imediato nos mercados de commodities.

O Valor foi um dos poucos jornais a ressaltar o vínculo entre a especulação financeira e a alta das cotações dos alimentos. Regina Alvarez, do Globo, mostrou em sua coluna a influência dos especuladores no aumento dos preços e ilustrou a matéria com um gráfico sobre a cotação da soja. Quanto ao Valor, foi o único jornal a anunciar a decisão do governo brasileiro de vender pouco mais de 300 mil toneladas de milho dos estoques oficiais e de intensificar os leilões de feijão, para tentar conter o aumento de preços no mercado interno.

A política monetária dos Estados Unidos tem sido fortemente expansionista e é uma das causas da depreciação do dólar, um dos assuntos centrais da reunião de cúpula do G-20, em Seul. Mas a grande emissão de dólares afeta não só o mercado de moedas. Influi também nas decisões de investimentos e uma das conseqüências é o desvio de muito dinheiro para as bolsas de mercadorias. Um dos subprodutos dessa movimentação é o aumento das pressões inflacionárias no Brasil e em vários outros países.

Furo eletrônico

A força dos meios de comunicação eletrônicos foi comprovada mais uma vez na crise do Banco Panamericano, de Sílvio Santos. Na terça-feira (9/11), Sonia Racy alertou no Estadão Online para um anúncio importante, nas horas seguintes, sobre o setor financeiro. Pouco depois, Eduardo Laguna, do Valor Online, informou sobre a divulgação, em breve, de um comunicado do Banco Panamericano. A ajuda de R$ 2,5 bilhões do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) a Sílvio Santos foi manchete do Estado de S.Paulo, do Valor e do Globo no dia seguinte. A vantagem dos meios eletrônicos depende, naturalmente, não só da velocidade na divulgação. Só a competência de bons profissionais garante o furo e a informação relevante em cima da hora.

Ainda sobre o caso do Panamericano: a entrevista de Mônica Bergamo com Sílvio Santos, editada na sexta-feira (12/11), rendeu mais que uma boa manchete para a Folha de S.Paulo (‘Quem pagar leva a rede SBT, diz Silvio Santos’). Proporcionou também uma leitura divertida, comentada e recomendada durante todo o dia. Entrevistas pingue-pongue são uma das pragas da imprensa nacional: em geral são chatas e representam desperdício de espaço para os jornais e de tempo para os leitores. No caso dessa conversa com Silvio Santos, a fórmula foi mais que perfeita. Nenhum resumo poderia substituir as palavras do entrevistado.

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Jornalista