Se Donald Trump já pode ser considerado um dos presidentes estado-unidenses mais achincalhados pela grande imprensa brasileira, a mesma postura crítica não foi aplicada ao seu antecessor: o democrata Barack Obama. Desde que assumiu a Casa Branca, há oito anos, o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos tem sido praticamente idolatrado pelos principais veículos de comunicação tupiniquins.
Muitos analistas consideravam que a “postura pacifista” de Obama seria capaz de solucionar os focos de tensão do Oriente Médio, sobretudo o complexo conflito entre árabes e judeus na região da Palestina. O slogan da campanha democrata, “Yes, We Can”, se transformou em um mantra exaustivamente reverberado no Brasil, sendo utilizado, inclusive, por torcidas de futebol. Nos últimos dias, praticamente em todos os intervalos dos programas da GloboNews há menções positivas a Obama. Já uma postagem bastante compartilhada no Facebook destaca que em oito anos no comando do país mais poderoso do mundo, a família Obama não protagonizou nenhum escândalo, nenhum caso de corrupção, não legislou em causa própria e levou uma vida simples, sem maiores ostentações.
É certo que Obama é muito mais carismático que o excêntrico Trump. Sobre esta questão não restam dúvidas. Todavia, por mais influente que um político possa ser, um mandato presidencial é algo demasiadamente complexo, que está muito além de personalidades individuais. Ainda mais em um país como os Estados Unidos, onde o capital especulativo, interesses corporativos e lobbies, entre outros condicionantes, norteiam o andamento estatal.
Republicanos e democratas
Sendo assim, um indivíduo que se deixa levar pelas simplificações, maniqueísmos e clichês das representações midiáticas, pode, erroneamente, confundir a personalidade do presidente democrata com a maneira pela qual ele conduziu a política externa de seu país. O fato de ser acadêmico, negro e bem-humorado não impediu Obama de apresentar uma postura agressiva em relação a outros povos.
A realidade geopolítica é bem diferente do que aparece na tela da TV e nas redes sociais. Vejamos o saldo da administração Obama. Durante o seu mandato, o democrata não apenas continuou as guerras do seu antecessor, George W. Bush, como também deu início a intervenções militares diretas e indiretas em países como Líbia e Síria, gerando milhares de óbitos e uma das maiores ondas de refugiados da história. Mesmo a aproximação diplomática com Cuba, qualificada pela mídia hegemônica como benevolência estadunidense, teve por trás poderosos interesses econômicos sobre uma possível abertura do auspicioso mercado da ilha caribenha. Por outro lado, uma das principais promessas de campanha de Obama, o fechamento da prisão de Guantánamo, não foi cumprida.
Curiosamente, no discurso em que recebeu o Prêmio Nobel da Paz, Obama citou várias vezes a palavra “guerra”. Em última instância, no país que se considera a maior democracia do planeta, não há diferenças relevantes entre as propostas de republicanos e democratas. Conforme bem pontuou um analista político, enquanto os republicanos defendem que os Estados Unidos entrem em várias guerras simultaneamente, os democratas preferem se concentrar em um conflito de cada vez.
***
Francisco Fernandes Ladeira é mestrando em Geografia