O anúncio de medidas do governo federal para combater a inflação ganha destaque em quase todos os jornais da sexta-feira (20/6). O ponto principal observado pela imprensa é a decisão de evitar medidas agudas como o controle de preços e outras formas de intervenção – como ocorreu no México e na Argentina.
O governo mexicano fechou um acordo com as indústrias para congelar preços de 150 produtos até dezembro e a presidente da Argentina, Cristina Kirschner, aumentou as tarifas de exportação para garantir a oferta de alimentos no mercado interno.
Tanto o México como a Argentina, onde se estabeleceu uma crise de relacionamento entre o governo e produtores rurais, estão tendo dificuldades para conter a inflação.
No Brasil, tanto a decisão do governo como a reação da imprensa revelam mudanças importantes no modo como o país encara as turbulências na economia. Há dez anos, quando o mundo atravessava a crise provocada pela queda dos mercados asiáticos, a imprensa cobrou do então presidente Fernando Henrique Cardoso a adoção de medidas de emergência, como a mudança na política de câmbio, mas tolerou a decisão de esperar o momento político que o governo considerou adequado.
Com isso, segundo avaliação publicada posteriormente pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Brasil perdeu o impulso do crescimento e as fragilidades internas afloraram.
Sinal de maturidade
Na crise que eclodiu em 2007, o Brasil foi apanhado numa condição mais segura, em pleno crescimento, com a inflação sob controle, empregos em alta e boa reputação entre os investidores internacionais. Mas a crise de alimentos viria a colocar em xeque o celebrado sucesso econômico do governo Lula.
O noticiário sobre a inflação chegou à beira do catastrofismo na semana passada, com as emissoras de televisão abordando donas-de-casa assombradas com os aumentos de preços nas gôndolas dos supermercados.
Mas, desta vez, o governo parece não ter se impressionado ao ponto de sacar os instrumentos de controle e intervenção que sempre dissimularam os efeitos da inflação e acabaram por agravar as crises no longo prazo. Nada de intervenções.
A decisão de combater a inflação pela oferta maior de produtos alimentícios é saudada pela imprensa como sinal de maturidade. Mas, desta vez, os riscos são de outra natureza. O que está sob maior perigo agora é nosso patrimônio ambiental.
O boi e a floresta
Os economistas do Banco Interamericano de Desenvolvimento alertam que a melhor defesa contra crises externas é a manutenção de regulamentações rigorosas no setor financeiro e práticas contábeis transparentes, ou seja, regras claras e válidas para todos e nenhuma dissimulação no diagnóstico.
Com a ampla oferta de informações e uma imprensa atenta e vigilante, poucos governantes se arriscariam hoje em dia a tentar tapar o sol com a peneira. No entanto, ao lado da questão econômica corre o desafio de conciliar a solução das crises e a manutenção do crescimento com a imperativa necessidade de preservar o meio ambiente. E é nesse sentido que os jornais de sexta-feira (20) trazem um alerta importante.
O governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, que acaba se apresentando como porta-voz do agronegócio, aparece no noticiário ameaçando com o aumento do preço da carne se o governo insistir em condicionar o crédito a práticas de proteção ao meio ambiente.
Faltando 11 dias para a entrada em vigor da exigência de regularidade ambiental para os produtores rurais que pedem financiamento público, a declaração de Maggi, considerado um dos maiores produtores mundiais de soja, revela um novo capítulo na difícil implantação de um modelo menos predador de produção agropecuária no Brasil.
Segundo os jornais de sexta, Maggi visitou o novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e ambos fizeram as pazes. O governador do Mato Grosso até anunciou que não vai boicotar o projeto de criação da Força Nacional de Segurança Ambiental.
Ele tem outros argumentos. Os produtores rurais que empurram as fronteiras agrícolas contra a floresta amazônica não precisam mais fazer boicote ou ameaças para impedir a vigência das restrições ambientais. O alerta sobre o perigo do aumento da carne neste momento vulnerável provocado pela inflação de alimentos soa como chantagem.
Não está escrito nos jornais, mas é chantagem.