Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Imprensa criminosa

Jornais tabloides britânicos se tornaram sinônimo de leviandade na apuração dos fatos, exagero nos relatos e espetacularização da notícia. Após 168 anos em circulação, o dominical News of the World – um dos mais bem-sucedidos na exploração do sensacionalismo – desaparece das bancas vitimado pelos próprios excessos. O caso não se restringe a mau jornalismo. Em causa está uma sucessão de atos criminosos que já levou envolvidos à prisão e deve resultar em novas punições para funcionários da News International, de Rupert Murdoch.

O caso chama a atenção pela extensão, pela aparente certeza de impunidade e pelo grau de desconexão dos editores e repórteres com boas práticas do jornalismo e com regras triviais de decência. Já se sabia há anos que o tabloide havia contratado um investigador particular para grampear e invadir caixas postais telefônicas de celebridades. O anticlímax, contudo, veio nesta semana: a revelação de que, em 2002, o jornal invadira a caixa postal de uma adolescente de 13 anos desaparecida, o que deflagrou a ira do público.

Os violadores do sigilo ouviram recados deixados por amigos e parentes, gente desesperada em busca de um ente querido. Não bastasse isso, apagaram mensagens para abrir espaço para novas gravações, o que levou a família a crer que a jovem estivesse viva, quando já havia sido assassinada. Ao todo, estima-se que 4.000 pessoas tenham sido atingidas pelo esquema, inclusive familiares de militares mortos no Iraque e no Afeganistão e de vítimas dos atentados de 2005 em Londres.

Ultrapassou-se, como é óbvio, toda e qualquer fronteira de privacidade. A imprensa não tem o direito de promover escutas clandestinas nem de violar correspondências. Só se admite que veicule conteúdo assim obtido se seus agentes não forem os autores da quebra de sigilo e caso a informação seja de interesse público.

“O News of the World está no negócio de chamar os outros à responsabilidade. Mas falhou quando se tratava de si próprio”, resumiu comunicado da direção do jornal. Um epitáfio apropriado.