Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornais noticiam mas não explicam

Em meio aos debates sobre o modo como o Brasil administra seu patrimônio natural, que se estendem para fora do Brasil e excitam a imprensa internacional, o presidente da República anunciou na quinta-feira (5/6) a criação de três das cinco reservas previstas para a região amazônica.


Os jornais, em peso, destacaram a frase de Lula dizendo que a Amazônia é igual água benta, todo mundo acha que pode meter o dedo. Mas deixaram de lado alguns detalhes importantes. Um desses detalhes é a natureza de cada reserva.


Alguns dos maiores especialistas em Amazônia discutem a eficácia de parques nacionais e reservas naturais em regiões da floresta onde existe minério ou em áreas próximas de zonas desmatadas. Em muitos casos, projetos de manejo integrado são mais eficazes para garantir a preservação. Os jornais passaram ao largo dessa discussão.


Outra questão é a razão pela qual as outras duas reservas previstas não foram aprovadas. Uma delas fica em área rica em bauxita, e o governo preferiu evitar que a criação da reserva viesse a impedir no futuro a extração do minério.


Terra de ninguém


Essa era uma oportunidade interessante para a imprensa questionar a falta de uma estratégia de longo prazo para a Amazônia, que permita conciliar a preservação da floresta, o bem-estar das populações nativas e a necessidade econômica de explorar suas riquezas. A criação de reservas, por si só, não melhora as condições de proteção do patrimônio natural, porque é impossível patrulhar toda sua extensão.


Mas o único jornal que deixou o discurso do presidente em segundo plano e tentou olhar para a questão amazônica de uma forma mais abrangente foi o Globo. O Globo informa que 8,5% da Amazônia – ou cerca de 42 milhões de hectares – estão em situação irregular ou fora do controle do governo. São terras não-documentadas, ou com documentos falsos e sobreposição de títulos.


Para se ter uma idéia, observa o jornal, a área equivale aos territórios dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraíba e Sergipe. Somados. É uma área maior do que a Alemanha e praticamente o dobro do território britânico sobre a qual o Brasil não tem soberania. Ali se pode desmatar impunemente, pois não há como multar os proprietários.


E a imprensa não vê que essa terra de ninguém é que acaba se transformando na ponta de lança da agropecuária na Amazônia. Essa é uma das ocasiões em que os jornais dão a notícia, mas não ajudam o leitor a entender a verdade.