Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Jornal condena por antecipação

O Globo deu na quinta-feira (12/5), em alto de página ímpar (21), título de oito colunas, com discreta chamada no pé da primeira página: ‘MP quer arquivar inquérito contra Turnowski’. A reportagem ocupa seis colunas de 13 centímetros. Allan Turnowski era chefe da Polícia Civil do estado do Rio quando, em fevereiro, foi acusado pela Polícia Federal de ter vazado informações sobre a Operação Guilhotina, que levou à prisão 39 pessoas, entre as quais 30 policiais civis e militares. Eram acusados de ligação com milícias e de vender armas para traficantes. Entre eles estava Carlos Oliveira, ex-braço direito de Turnowski. Já estão em liberdade, indiciados em processo criminal.


A maneira como a notícia foi dada, em 15 de fevereiro, causou estranheza, como se pode ler em ‘O financiamento criminoso da política‘. Transcreva-se o primeiro item da argumentação:




No Globo, Turnowski está sob chumbo grosso na primeira página, ‘acusado’ em depoimento de testemunha de receber mensalão (somando duas cotas, seriam R$ 600 mil; em um ano, R$ 7,2 milhões!). No interior do jornal, a série de reportagens reunida sob o chapéu ‘Faxina na polícia’ começa com Turnowski não mais ‘acusado’, mas julgado e condenado pela manchete da página: ‘O varejo da corrupção’. A defesa de Turnowski só aparece duas páginas depois, o que não deixa de chamar a atenção.


O que ficou de fora do noticiário do Globo, mas não de outros jornais: ao indiciar Turnowski, a Polícia Federal teria ‘dado uma força’ ao secretário de Segurança do Estado do Rio, José Mariano Beltrame, delegado de carreira da PF. Ele havia entrado em confronto com Turnowski depois que este desencadeara uma bizarra incursão na Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco), chefiada pelo delegado Claudio Ferraz. Ferraz era o auxiliar mais importante de Beltrame no combate às milícias.


Recapitulo, para o leitor distraído, ou enfarado: a PF detonou Turnowski, que havia detonado Ferraz, auxiliar próximo de Beltrame (mas hierarquicamente subordinado a Turnowski).


Pelo telefone, chefe de polícia mandou avisar?


O Globo não apresentou a argumentação do Ministério Público, noticiada pela Folha de S. Paulo:




De acordo com o Ministério Público, não há provas de que o ex-chefe da Polícia Civil tivesse conhecimento da operação. Para o órgão, não há nenhum indício de que tenha havido ‘contato do então chefe de polícia com os supostos indiciados’.


A Promotoria também aponta que ‘outros alvos da operação não foram presos e não foram encontrados em suas residências e, em momento algum, se supôs que esses outros tenham sido informados por alguém’.


Ainda segundo o Ministério Público, não faria sentido Turnowski alertar por telefone um investigado que estava sendo monitorado. ‘Seria ilógico que, sabendo que alguém é alvo de monitoramento, se diga para a pessoa através do telefone que ela está sendo monitorada’, disse a Promotoria.


Não se entra aqui no mérito das acusações e das atividades dos personagens envolvidos. Se há algum santo nessa história, só a Santa Sé poderá, oportunamente, avaliar. A questão é estritamente de observação da mídia. O delegado Turnowski já havia sido condenado pelo Globo (‘O varejo da corrupção’, lembremo-nos, era a manchete interna). Agora, a depender de manifestação do juiz titular da 32ª Vara Criminal do Rio, Guilherme Schilling Pollo Duarte, talvez não vá a julgamento.