Com salários altamente defasados, em face do custo de vida, depreciado e malquisto pelos patrões, imagem para a qual colaborou o depauperamento do sindicato da categoria ao longo dos últimos anos, os que trabalham em jornalismo no Rio Grande do Norte amargam uma rotina das mais incômodas, para não dizer lastimável, do ponto de vista do mercado de trabalho e da realização pessoal.
Embora aprisionados a uma vida indigna, admira o conceito favorável que esse profissional goza no seio da sociedade, conforme as pesquisas que se sucedem em torno das categorias mais apreciadas pela população.
Com a desmobilização da categoria em torno do sindicato, tendo praticamente abandonado seu órgão de classe – o que poderia fortalecê-lo e resguardar sua autonomia, melhorando sua auto-estima –, partiu-se para se exercitar, na prática, a Lei de Muricy, do “cada um por si”, o que ensejou todo tipo de expediente em busca de “um lugar ao sol”.
Se de um lado, o patronato, a classe dos proprietários das empresas, na sua maioria políticos, se aproveitou da fragilidade exposta pela totalidade da categoria, desde que esta desperdiçou o escudo que representava a entidade de sua representação, para explorar ao máximo sua força de trabalho, de outro, o próprio governo do estado e a Prefeitura Municipal do Natal (as prefeituras do interior acordam remunerações em cada caso), que têm em seus quadros de pessoal expressivo número de comunicadores, há décadas pagam salários dos mais vis em todo o país – atualmente remuneram o jornalista com valor que não ultrapassa um ordenado de R$ 350, quando, pelo último acordo (2005) entre a categoria (sindicato) e os patrões, ainda vigente, o piso inicial (nível 1) é de R$ 693,34.
Anos de perda
Nesse quadro de usurpação do trabalho do jornalista (e de outras categorias) – consentido pela parte explorada, diante de sua incapacidade de reação –, a administração pública no RN (estado e Prefeitura Municipal do Natal) fizeram robustecer a prática do “apadrinhamento”, do “favoritismo”, sujeitando o profissional a recorrer a pistolão para obter gratificações. Com isto, registra-se no RN uma situação semelhante à suserania, regime que complementa e justifica o poder oligárquico, vivendo-se na prática relações feudais, com a presença de um senhor com domínio sobre o feudo, a cobrar tributos de seus vassalos, dando-lhes, em troca, auxílio e proteção.
Caminho aberto à venalidade, à subserviência e resignação – como resultado do esforço do profissional para conseguir alguém da cúpula do poder, ou “costas largas”, que lhe possa obsequiar a chamada “gratificação”, sinônimo de “sujeição” ao seu patrono ou protetor, contribuindo, agora, travestido de “defensor” da manutenção da tirania, da opressão e das injustiças sociais. Não admira que se desconheça, no Rio Grande do Norte, o gênero de jornalismo investigativo, com as grandes falcatruas, as violações das convenções morais e das regras de decoro – nepotismo, sanguessuga, mensaleiros, contas em paraísos fiscais no exterior, ganhos desonestos, vantagens pecuniárias ilícitas obtidas em operações de órgãos públicos por meio de suborno, tráfico de influência, comedeiras, ladroeiras, negociatas etc. – só apareçam na mídia local quando denunciadas pela grande imprensa do sul do país, muitas vezes em matérias pagas pelos próprios grupos oligárquicos na luta encarniçada pelo butim estadual.
Nem mesmo o chamado Plano de Cargos e Salários, ainda em discussão entre o governo do estado e algumas categorias, cobriu a diferença salarial, nem se cogitou de falar-se em indenização pelo montante perdido todos esses anos.
Sem respaldo
Mesmo assim, no Rio Grande do Norte, afora a universidade federal (UFRN), que joga no mercado, a cada semestre, seguidas fornadas de novos profissionais, as escolas particulares, que se multiplicam diante do lucrativo mercado, tiram proveito do grande número de jovens que buscam a formação acadêmica nesta área de serviço, atraídos pelo antigo “charme” da profissão. Um romantismo já neutralizado, diante da dura vida nas redações, mas ainda atraente, quiçá através da imagem passada pela televisão, embora a realidade do dia-a-dia não corresponda ao fascínio transmitido pelos galãs dos jornais da TV.
Agora mesmo, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Rio Grande do Norte (Sindjorn) negocia com os patrões as novas grades salariais, para ver se alcança patamares melhores que os atuais salários, estabelecidos em R$ 693,34 (nível 01, para quem inicia), R$ 714,20 (nível 02), R$ 872,18 (nível 03), este último, um patamar alcançado quando o jornalista tem anos de experiência, podendo lograr um lugar mais adequado no organograma das empresas, funções disputadas a golpes de foice no escuro, em razão do reduzido número das ocupações (chefe de redação, chefia de reportagem etc.).
No momento, o Sindjorn, cuja atual diretoria, mesmo lutando sem o respaldo da categoria, vem sendo contestada por um grupo de jornalistas descontentes com sua atuação, encaminha para negociação valores que nem de longe chegarão a cobrir o real custo de vida no estado e no país.
Imensa rotatividade
Num Estado reconhecido como detentor da menor remuneração paga a jornalista em todo o Brasil, o Sindjorn apresenta, na mesa de negociação com os patrões, propostas que apontam para um aumento de R$ 138,67 (20%) para o nível 1, que ficaria com R$ 832,01; um percentual de 18% para o nível 2, aumentando R$ 128,56 sobre o atual piso, que o elevaria para R$ 842,76; e finalmente 10% sobre o atual salário de nível 3, que passaria para R$ 956,40, com R$ 87,22 de reajuste.
Ao se constatar, diante desse quadro salarial, que o trabalho em jornalismo no Rio Grande do Norte tenha se transformando num simples “bico”, a direção do Sindjorn vem trabalhando para uma modificação na sistemática das negociações.
“Estamos insistindo na criação do piso único, utilizado na maioria dos estados. Acreditamos que enquanto não houver uma boa qualidade de salários vai continuar a baixa qualidade do jornalismo nas empresas jornalísticas”, diz o presidente do Sindicato, jornalista Aluísio Viana. “Nenhum jornalista vai ter dedicação exclusiva a um trabalho ou tampouco permanecer num emprego que não lhe proporcione um salário digno e uma recuperação mínima das perdas salariais nos últimos anos. Isso está provado na imensa rotatividade dos jornalistas nas redações, insatisfeitos com os salários e como conseqüência da péssima produtividade do jornalismo potiguar”.
******
Jornalista