Fico pensando para que tipo de leitor a Veja e a IstoÉ escrevem… Se para um leitor altamente colaborativo, que aceita qualquer tipo de sugestão, se para os que têm bola de cristal – adivinham tudo – ou para os iletrados, que apenas decodificam o beabá escrito e nada entendem… É um dilema tentar adivinhar… Se eu continuasse tentando não chegaria a lugar nenhum por pura falta de informação, não propiciada pelas revistas de circulação nacional do país. É por isso que não volto a assiná-las.
A Veja comenta a não-divulgação, pela Istoé, da pesquisa para o 2º turno das eleições para presidente. Não critica a outra para não contrariar uma igual, mas sugere a quem beneficiaria publicar parcialmente a pesquisa. Vejam:
‘(…) beneficia o ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho, que neste momento luta pela indicação de seu nome como o candidato do PMDB nas próximas eleições e cujas ligações com a Editora Três saltam aos olhos.’ (disponível em: http://veja.abril.uol.com.br/250106/p_064.html)
Saltam aos olhos de quem? Se a Veja não pode afirmar qual é a natureza da relação existente entre Garotinho e a Editora três (leia-se IstoÉ), como é que o leitor vai adivinhar? Como é que o leitor vai obter essa informação se o ‘jornalista’ não a deu, não a passou, apenas sugeriu?
Não trabalho com jornalismo, não tenho obrigação de saber quem são os donos, diretores, enfim, nomes que inter-relacionam Garotinho e a Editora Três (IstoÉ). Se a Veja não nomear os bois, não saberei jamais… E ainda dizem que a função da imprensa é informar à população… De quê? Desse jeito, só se o leitor tiver bola de cristal. Ou a imprensa informa o leitor, ou não informa! (A segunda opção é o que acontece nesse caso.)
Uma lição
Vejam este outro fato que qualquer leitor um pouco mais atento pode questionar ao ler a matéria da Veja. Ela afirma que Garotinho é o grande beneficiário da omissão dos números pela IstoÉ. Será que só Garotinho é beneficiado na dança dos números na corrida ao Planalto? Não seria ingenuidade e falta de visão jornalística, num momento de crise do PT, em que o tucanato vinha renascendo das cinzas, dizer que só Garotinho se beneficia com a omissão da divulgação do retrocesso de Serra no 2º turno e com aumento de 7 pontos de Lula também no 2º turno?
Fazer alusões sem informação explícita a respeito da ligação de Garotinho e a Editora Três e não analisar a relação dos números com a realidade política, com o histórico de pesquisas e com todos os beneficiários da pesquisa é ser parcial, portanto, não-jornalístico!
Mas, o pior de tudo é o último parágrafo do texto da Veja, um atentado a minha inteligência… E supõe um leitor estúpido (não confundir com leitor a quem informações foram sonegadas) que não é capaz identificar, num texto, quem praticou uma ação, ou seja, um sujeito. Vejam:
‘Na questão 19, o Ibope perguntou que ações fariam o entrevistado votar em Garotinho. Incluem-se na lista opções como ‘mostrar que é a favor dos pobres’, ‘mostrar que saberá combater a corrupção e a impunidade’ e ‘não misturar religião com política’. Deveria ter sido incluída, ainda, mais uma alternativa: não enganar jornalistas, emissoras de TV e jornais para beneficiar-se em disputa interna partidária‘. Poderia surgir dela uma lição importante para o candidato Garotinho. A de que a mentira tem pernas curtas, como as de um menininho.’ (grifo meu)
Caiam em campo
O texto da Veja informa que a Editora Três (leia-se IstoÉ) encomendou a pesquisa e que a publicou sem dar todas as informações (deixando o leitor – a quem deve explicações – desinformado). Para meu espanto, porém, a culpa pela ação da publicação enganosa é atribuída a Garotinho!
Voltando à quinta série: quem praticou a ação de publicar a matéria, quem é o sujeito da ação? Meu Deus! O que é isso? A IstoÉ omite, diz que não houve simulação e o culpado é o Garotinho? Então, que se prove a ligação entre ambos, ou pelo menos se dê algo com substância superior ao ‘salta aos olhos’! Política virou fofoca de televisão nesse país!? A Abril está dando uma de Congresso Nacional? Não ataca uma outra editora que foi desleal e parcial com os leitores e põe a culpa num político, e o que é pior, sem esclarecer as ligações, sem afirmar, sem pesquisar, sem dar evidências que permitam ao leitor julgar os fatos?
Senhores da Abril e da Três, vocês estão fazendo jornalismo para quem? Para si ou para a nação? Dêem uma contribuição séria a este país, ajudem a construir um país – com informações – que permitam ao leitor conhecer a verdade dos fatos. De suposições estamos cheios, queremos jornalismo – imparcialidade – compromisso com a verdade. Se vocês não a têm, não inventem ou sugiram, caiam em campo e façam trabalho jornalístico e não impressionismo jornalístico.
Quem publica?
Podem pensar alguns que sou eleitor do Garotinho: esse pensamento seria totalmente equivocado, não votaria nele em nenhuma hipótese, mesmo que fosse candidato único.
O único motivo que me fez escrever esse texto foi o fato de ter me sentido vítima do mau jornalismo praticado pela Três, ao fazer o que fez, e pela Abril, por comentar da forma como comentou. E há ainda os que acham que estamos mal de políticos…
É pena que não se possa fazer reforma no jornalismo como se faz em relação a uma legislação antiga: nesse caso, os políticos inventam, mudam alguma coisa e algo se transforma, mesmo que de forma imperceptível. Mas, e no jornalismo? Quem é que pode mudar algo inadequado e errado? Melhor, os políticos discutem entre si e a imprensa publica, a opinião pública faz pressão e o povo sai ganhando. Mas, quando o assunto é entre as empresas de jornalismo, o máximo que se faz é escamotear o erro jornalístico e pôr a culpa num político e o povo – leitor – sai perdendo. Quem publica as obscuras relações entre editoras e grupos políticos? Existe imparcialidade jornalística nessas situações? Como, se o patrão não deixa publicar? Acho muito difícil que um dos destinatários desse e-mail publique algo, até por que não sei quem paga os seus salários, no entanto, valeu pelo desabafo, nem que seja como página de diário!
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Professor