Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Lentes de um criador multifacetado

Um dos textos mais interessantes que este Observatório publicou na semana passada foi o de Marcelle Ribeiro, transcrito de O Globo (6/5) sobre a incrível batalha travada em 1961 entre as maiores revistas americana (Life) e brasileira (O Cruzeiro) sobre a miséria nas duas maiores cidades de seus países, Nova York e Rio de Janeiro.


A ótima história está à disposição do leitor (ver ‘Miséria versus miséria ‘). Mas ela traz à tona o nome de Gordon Parks, a respeito de quem Marcelle Ribeiro apenas menciona como o autor das fotos de Life.


Sabe-se pouco de Parks no Brasil, embora ele tenha sido uma das mais fascinantes figuras do jornalismo, das artes e da militância política dos EUA no século 20. Vale a pena recuperar um pouco de sua memória.


Imagens memoráveis


Negro, ele nasceu em 1912, no estado de Kansas, na miséria do racialmente segregado sul dos EUA, caçula de 15 irmãos. Apaixonado desde criança por fotografia, conseguiu comprar sua primeira câmera numa loja de penhores e aprendeu sozinho a técnica de capturar imagens.


Durante o ‘New Deal’ do governo de Franklin Roosevelt, provavelmente o único período da história americana em que o Estado se ocupou com o bem estar dos mais pobres do país, ele conseguiu emprego como fotógrafo numa das muitas agências governamentais criadas na época, a FSA (Farm Security Administration), que entre outras missões dedicava-se a documentar as condições sociais da nação durante a grande recessão dos anos 1930.


Parks conseguiu tanto prestígio com seu talento que quando a FSA fechou, em 1943, obteve sucesso como free-lancer para diversas publicações, das grandes revistas de moda, em que fazia dinheiro, às politicamente engajadas, onde extravasava seus sentimentos humanitários.


Ele foi o primeiro negro a fotografar e escrever para Life, onde trabalhou durante duas décadas. Fez fotos memoráveis dos grandes líderes negros dos EUA da década de 1960 e, com suas reportagens, ajudou a combater o racismo e as injustiças sociais em seu país.


Olhar negro


A sua missão no Brasil em 1961 o incitou a se aventurar no cinema: fez um curta documentário sobre Flávio da Silva, o menino então com 12 anos, que ajudava a cuidar da família de retirantes nordestinos residente no bairro da Catacumba, no Rio de Janeiro.


Outros dez filmes foram dirigidos por Parks, inclusive o muito elogiado Shaft, de 1971, com célebre trilha sonora de Isaac Hayes, considerado um dos marcos do movimento do cinema negro americano, primeira produção dirigida por um negro em um grande estúdio de Hollywood (Warner Brothers).


Flávio da Silva também foi o motivo de um dos 20 livros que Parks publicou em sua vida, inclusive o premiado romance autobiográfico The Learning Tree, de 1963.


Gordon Parks ainda compôs músicas, escreveu poesias, ajudou a organizar entidades para promover a condição de vida de negros pobres e a dar oportunidades de estudo a jovens negros talentosos nas artes.


Morreu em 2006. A Gordon Parks Foundation, em Pleasantville, Nova York, preserva o conjunto de sua obra.


Abaixo, cinco das fotografias mais famosas de Gordon Parks.


***










******

Jornalista