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O iG entre a vaia e o aplauso (14/5/08)
A respeito da cobertura cultural do iG, chama atenção o site Aplauso Brasil. Apesar do nome, o Aplauso Brasil propõe-se a fazer crítica teatral.
Primeiramente, leia um trecho escrito por Michel Fernandes, editor do site, sobre a peça Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues, com direção de Antunes Filho, em cartaz no Sesc de São Paulo. Aí vai:
‘Nelson Rodrigues, deliberadamente confesso, utilizou Mournig Becomes Electra, do norte-americano Eugene O’Neill que, respectivamente bebeu nas seivas da trilogia trágica grega Orestéia, para compor o texto de Senhora dos Afogados, peça da fase mítica do autor carioca, centrada no momento em que a tradicional família Drummond, que se vangloria dos mais de 300 anos sem um caso de adultério, desintegra-se, entra num grotesco funeral em que, como carpideiras cínicas, comentam, cheios de ironia e maldade, um coro de vizinhos defensores da hipócrita moral desejada e defendida à ‘Instituição Família’.’
Como se vê, é difícil até chegar ao fim do parágrafo (clique aqui para ler o texto integral). Faltam pontuação, concordância, coesão e outros atributos do bom texto. Infelizmente, esse não é exceção.
Também vale notar o fato de que a maioria dos artigos limita-se a descrever a peça num tom simpático, amigável até inocente (clique aqui, para um exemplo sobre a terceira idade, com erro de crase na manchete). Prospera o bom-mocismo e faltam juízos realmente críticos. Há, porém, exceções, uma delas do próprio Michel Fernandes, mas ainda maltratando o português.
A seção de ‘matérias’ do site traz pequenas reportagens sobre as peças. Nelas aparece com freqüência a mistura de informação e opinião (clique aqui, para um exemplo). Um outro detalhe incômodo: os textos não trazem a data de sua publicação, o que dificulta a vida do leitor.
A base de um jornalismo de qualidade é distinguir os dois tipos de texto. Reportagem é uma coisa, crítica é outra. Eles exercem funções distintas, e deveriam obedecer a padrões também diversos, às vezes opostos. Uma busca a objetividade. A outra persegue uma expressão mais pessoal, apoiada em critérios.
No Aplauso Brasil, essas abordagens estão misturadas. Acho que isso é expressão de outra confusão sobre o papel do jornalista, da necessidade de seu distanciamento em relação aos objetos de que trata.
A imparcialidade sempre foi um valor jornalístico muito homenageado e pouco perseguido. Na era da internet, ela tende a ser sepultada pela avalanche de opiniões irrelevantes.
A função da crítica é mais do que nunca exigir muita qualidade das peças, apontar defeitos, prestar um serviço aos leitores e estabelecer uma interlocução à altura com os espetáculos abordados. Tem que explicitar seus critérios. Pode ser Aplauso, mas também deve ser Vaia. E para cobrar qualidade, deve antes dar o exemplo.
Apesar disso, o Aplauso Brasil tem o que ler. Em meio à opinião, há muitas informações, fichas técnicas, e um acompanhamento sistemático de atividades do meio teatral e de uma parcela do que está em cartaz.’