No dia 31 de março de 1964, o Brasil foi golpeado por uma intervenção civil-militar que acabou por resultar em uma ditadura que se estenderia por longo período de tempo e suspenderia as práticas democráticas. Contudo, as memórias que ao longo do tempo se constituíram acerca destes acontecimentos foram diversas.
Em 1984, 20 anos após a deflagração do golpe e momento final da transição democrática, nos jornais e revistas de maior circulação do país, verificou-se várias perspectivas, algumas vezes simultâneas e conflitantes, acerca do golpe e suas motivações, da ditadura etc. Este olha resultou na vasta produção de memórias acerca do período. Essa mesma mídia, em 2004, 40 anos após o golpe, tratou de forma diversa os acontecimentos em questão.
O discurso jornalístico de 1984 permitiu uma maior justificação e legitimação do golpe de 1964 e da ditadura. Embora muito se tenha falado sobre a democracia, as expectativas e promessas existentes em torno desta, os obstáculos que enfrentaria em decorrência do regime militar etc., não se rompeu com a idéia de que a ditadura, ainda que tenha cometido seus excessos, foi benéfica, sobretudo do ponto de vista do desenvolvimento econômico.
Em 2004 prevaleceram as discussões acerca das questões da violência e da tortura, praticamente inexistentes em 1984. Portanto, naquele ano, a ditadura passa a ser valorada pela mídia como período de violação dos direitos civis dos cidadãos.
Em 1984, período em que a memória sobre os acontecimentos da ditadura ainda não estava consolidada, aproximadamente 14,8% dos textos jornalísticos que trazem essa temática julgam que o desenvolvimento justificaria a ditadura, enquanto 16,9%, praticamente a mesma cifra, que não. Já em 2004, apenas 0,59% dos textos acreditam no desenvolvimento como justificativa para o regime, contra 4,17% que descartam tal argumento. Dessa forma, percebemos que, progressivamente, a utilização do argumento de cunho econômico decresceu em utilização e alcance.
Versões silenciadas
No que se relaciona ao tema imprensa, percebemos que este não foi abordado de maneira ampla em nenhum dos dois momentos em questão, embora tenha obtido mais espaço em 2004. Essa fato marcaria uma não-reflexão ou reflexão acrítica da imprensa – otivada pelas características presentes no campo jornalístico e na lógica de produção da notícia etc. –com relação à ‘censura’ por ela sofrida nos anos de ditadura militar e seu papel no golpe e na manutenção do regime militar.
Se em um primeiro momento a direita que se encontrava no poder conseguiu de maneira geral impor as suas memórias acerca do golpe, mobilizando uma série de meios propagandísticos e educacionais, o que, no curto prazo, obteve consideráveis resultados, na medida em que a ditadura foi se tornando impopular, as versões silenciadas nesse primeiro momento começaram a aparecer com mais vigor, sobretudo a partir de 2004, embora muitos temas mereçam ainda maior reflexão por parte da imprensa.
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Respectivamente, bacharel em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e mestranda em Direito Internacional pela Universidade de La Coruña (UDC); bacharel em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB)