O jornalismo é o ofício de observar, relatar e publicar os fatos da atualidade. Alimentado pela curiosidade humana, presta um serviço de utilidade pública indispensável à vida em comunidade. De natureza essencialmente gregária, o homem não pode, não deve e não consegue estar sozinho, isolado de seus semelhantes. Alimenta-se da convivência social, sangue que irriga suas veias, oxigênio que infla seus pulmões.
O jornalismo é método, é técnica, é modo de narrar. É discurso sobre a realidade. O jornalismo é a arte de representar as coisas do mundo. Ele transmite a cultura, mantém acesa a memória, confirma e fortalece a identidade de um povo. O jornalismo faz com que nos reconheçamos todos como participantes e testemunhas de um tempo histórico. O jornalismo propõe um sentido e uma lógica para o caos e para a desordem em que os acontecimentos do dia-a-dia parecem definitivamente mergulhados.
O jornalismo é uma linguagem, um idioma, uma senha, um código útil para decifrar os enigmas do universo que nos rodeia. É uma chave de acesso. Com suas regras, seus critérios e seus paradigmas, oferece um caminho bastante aceitável para lidar com os fenômenos da vida, muitos dos quais nos assustam, nos intrigam e nos surpreendem. O jornalismo instala uma abordagem sobre os fatos que nos auxilia a entendê-los e a aceitá-los. O jornalismo formula as perguntas e caça as respostas.
É importante compreender, entretanto, que, queiramos ou não, como qualquer atividade praticada pelo homem, o jornalismo é virtude e vício, ao mesmo tempo. É política e negócio. É interesse e lucro. É fonte de sobrevivência e riqueza para mercados, empresas e pessoas. Move dinheiro, anima empreendimentos, açula vaidades e orienta projetos de vida.
Senso crítico e poder de análise
É uma possibilidade a mais de comunicação entre os exemplares da espécie. É uma tentativa a mais de aproximação e entendimento entre as tribos que habitam o planeta e que, como tantas outras, pode ser bem sucedida, ou falhar rotundamente. Revela tanto a grandeza de uns quanto a miséria de outros.
O jornalismo também é instrumento. De persuasão, de conversão, de doutrinação. O jornalismo se presta a muito. Em circunstancias em que é intensa a disputa pelo poder, seja ele de que tipo for, o jornalismo se expõe de forma indevida, descuidado e negligente, e se denuncia nos seus objetivos mais secretos, nos seus projetos menos confessados. É freqüente, nesses casos, ainda anunciar-se como jornalismo. É flagrante o quanto, a essa altura, já se transformou em propaganda, o quanto já se perdeu nos descaminhos da corrupção ou da covardia.
Cabe, pois, ao receptor da mensagem jornalística, agir atentamente, conhecer o contexto em que vive e aprender a ler nas entrelinhas, saber como defender-se. O mandamento supremo do leitor experiente é desconfiar. É cruzar as informações recebidas com as fornecidas por outras fontes. Se puder consultar as originais, tanto melhor. Hoje a internet abre possibilidades infinitas aos investigadores mais tenazes. Outra regra de ouro é a de confrontar relatos sobre os mesmos fatos produzidos por adversários ideológicos. Esta providência anima o senso crítico e aguça o poder de analisar, refletir e tirar as próprias conclusões.
Por uma vida melhor
Ao receptor inteligente, interessado em ler o que não está escrito e sensível ao peso ou à ausência das palavras, abre-se também a senda estreita que ele deve explorar, se quiser aprofundar-se na compreensão do que o jornalismo oculta e revela: a trilha que conduz ao entendimento das artimanhas da linguagem, das armadilhas da sintaxe. Por que é esse o verbo? Qual é a intenção em utilizar esse adjetivo? Quem é o sujeito indeterminado? Que reticências são essas?…
Recomendo, por último, ao leitor persistente, mais uma providência: reparar nas omissões, nos esquecimentos, nas lacunas, nas falhas, no que não foi dito, na pergunta que não foi feita. O que está nas ruas e não está nas manchetes? O que está nos corações e nas mentes das pessoas e não merece nem uma nota de pé de página?
Moeda de várias faces, faca de muitos gumes, herói e vilão, mocinho e bandido, o jornalismo pode ludibriar os incautos e iludir os ingênuos. Mas pode, igualmente, despertar a consciência social, motivar a cidadania, estimular a luta pelos direitos e por uma vida melhor. Que tipo de jornalismo você quer consumir? Que tipo de leitor você é?
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Jornalista, advogado, doutorando em Direito Internacional pela Universidade Autônoma de Madri e apresentador do programa Rede Mídia, na Rede Minas de Televisão