Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Muita estatística, pouca precisão

No sábado (14/8) à noite, os telejornais da BBC incluíram um despacho do correspondente brasileiro, Paulo Cabral, sobre um dramático aumento no número de focos de queimadas no Brasil em comparação com 2009. Embora sem imagens, a notícia foi dada com extensão e incluída ao lado das impressionantes reportagens sobre os incêndios na Rússia, os 20 milhões de desabrigados pelas chuvas no Paquistão e o luto na China pelos 1.200 mortos num deslizamento também provocado por enchentes.


O que distinguia os incêndios no Brasil das demais catástrofes era o agente causador: só aqui os homens eram os responsáveis; na Rússia, Paquistão e China os desastres tinham causas naturais.


O correspondente da BBC certamente utilizou os dados de uma reportagem de página inteira, publicada no próprio sábado pelo Estado de S.Paulo (14/8, pág. A-22) mostrando um aumento de 85%, e a informação do Globo no mesmo dia, também destacada na primeira página, ainda mais assustadora: o crescimento do número de focos de incêndio no Brasil foi de 179% (pág. 16).


Prova provada


Chama a atenção o fato de que dois grandes jornais utilizaram a mesma fonte, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), para produzir dados estatísticos tão discrepantes.


A diferença entre os percentuais mostrados pelos dois jornalões é de mais do dobro (segundo o Globo os focos de incêndio subiram de 73 mil para 204 mil, segundo o Estadão a subida foi de 14 mil para 25 mil).


Esta elasticidade numerológica escancara uma realidade: apesar da sedução estatística, a grande imprensa ainda não conseguiu produzir um padrão mínimo de precisão.


Mais grave ainda é que um aumento tão expressivo no número de focos de incêndio e o noticiário da BBC não tenham chamado a atenção dos demais veículos, sobretudo os portais da internet.


Comprova-se mais uma vez que nos fins de semana nossas redações só funcionam para cobrir eventos esportivos.