Orlando Marques, presidente da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade) e membro do board da multinacional Publicis, reconhece que o momento é difícil. A economia veio fraca de 2014 e a falta de confiança dos consumidores prejudica o consumo. Mas ele prevê que o quadro mude no último trimestre e defende um maior investimento na mídia impressa.
O que esperar do mercado de publicidade nos próximos meses e em 2016, em face à conjuntura econômica brasileira?
Orlando Marques – O começo do ano não foi muito bem porque houve um segundo semestre de 2014 já meio enfraquecido.
A economia é a principal causa da retração dos anunciantes e também, por conta disso, o mercado não terá um 2015 de resultados muito expressivos. A expectativa é de que haja uma boa retomada no último trimestre de 2015 e que seja possível entrar com o pé direito em 2016. O mercado brasileiro é muito grande, e as grandes marcas não podem abandoná-lo, sob risco de perder shares conquistados a duras penas.
O grande motivador do consumo e da dinâmica do mercado como um todo é o grau de otimismo da população. Infelizmente, o consumidor está pessimista e por isso não compra. E como os preços cresceram por causa da inflação, ele está recorrendo à poupança para manter seu nível de vida.
Grandes nomes da publicidade mundial vieram a público recentemente para advertir que a eficiência das mídias impressas como veículos publicitários está sendo subestimada. O mais recente foi Martin Sorrel. Como vê essa questão?
O.M. – Concordo 100% com Martin Sorrel quando ele diz que não podemos desprezar a força da mídia impressa. O digital veio para modificar o sistema como um todo e tem sua força, mas não é a bala de prata ou o remédio que cura todos os males. A internet não faz tudo sozinha, assim como a televisão não fazia no passado.
Há hoje uma atenção demasiada à internet e ainda não há ferramentas muito confiáveis que garantam que ela entrega tudo o que promete. Importante ressaltar também a força e a credibilidade dos meios impressos, e essas conquistas são passadas para os anunciantes e para as suas marcas.
O grande desafio é mostrar que os jornais e revistas hoje não são mais só veículos impressos e sim plataformas de conteúdos de grande valia e respeito que se distribuem por vários meios, inclusive o digital, acumulando grandes e qualificadas audiências.
Acabo de voltar de uma reunião da 4a’s americana – a ABAP deles – em Austin (Texas), e um dos temas destacados lá foi exatamente essa falta de segurança nas pesquisas ligadas à mídia digital. É preciso acabar com o modismo de que o digital resolve tudo. O mundo digital sozinho não constrói uma grande marca. É preciso usar a credibilidade e a boa reputação dos veículos tradicionais, e aí o jornais e revistas são os que melhor agregam seus valores aos de um bom produto e de uma boa marca.
Não está ocorrendo um deslumbramento com as plataformas digitais não vinculadas à mídia estabelecida por parte dos publicitários – inclusive ignorando as fraudes que vêm ocorrendo, como denunciou a associação americana de anunciantes em dezembro último?
O.M. – Há sim um interesse maior dos mais jovens por meios digitais como um todo, porque é nesse universo que os jovens se falam e se conectam, mas é preciso que os meios impressos falem mais de si. Falem da força que eles têm e das suas audiências totais. Quanto à fraudes, não as vejo por aqui e, se elas existem, nosso dever é denunciar e apurar porque nossos profissionais têm respeito pelo dinheiro do anunciante.
Como vê os jornais – impresso e no digital – como veículos publicitários?
O.M. – Os jornais – impressos ou não – são veículos de grande respeito pela maneira séria e profunda com que tratam a notícia, apurando-a com afinco para levar aos seus públicos seriedade, agregando credibilidade, análise e debates inteligentes e construtivos.
Eles não devem pretender competir com a internet, mas usar a internet como mais uma forma de distribuição. E isso valoriza as marcas que ali anunciam. Agrega valor a elas. São veículos fortes e importantes. Mas precisam falar mais de si, de suas audiências e não somente de seus exemplares (exemplar é apenas uma das formas de se distribuir a notícia que eles tão bem apuraram, mas não devem somente se restringir a ela).
A pesquisa brasileira de mídia 2014, encomendada pela Secom/PR, constatou mais uma vez que os jornais são líderes em credibilidade tanto em relação ao conteúdo jornalístico quanto ao publicitário. A importância da credibilidade não vem sendo subestimada na hora da programação de mídia?
O.M. – A credibilidade não vem sendo desprezada ou subestimada. Todos reconhecem esse valor nos jornais. Um bom e recente exemplo disso é a atual campanha da Friboi que nasceu e se consagrou nos jornais para depois buscar outros meios. Há uma tendência errada de olhar só parte do que os jornais fazem – que é o meio impresso. As agências têm de olhar as audiências totais em todas as plataformas, e os jornais têm de se apresentar assim para os profissionais de mídia. O foco é vender o conjunto das audiências.
Tradicionalmente, a métrica aplicada aos jornais é a circulação, enquanto outras mídias medem audiência. Isso prejudica os jornais, não? Alguns dos principais institutos de pesquisa estão trabalhando na formatação de pesquisas que mudam essa situação, captando também a audiência dos jornais em outras plataformas, além das regiões metropolitanas e do papel. Qual a sua opinião a respeito?
O.M. – Como dito anteriormente, é importante falar de audiência e os jornais têm de promover e qualificar suas audiências (e não apenas a circulação).
A mídia local, os jornais de menor porte, mantém uma posição forte como fonte de informação jornalística e comercial nos respectivos mercados, mesmo com o surgimento das mídias digitais. Eles não são subaproveitados como veículos publicitários? O que fazer para mudar esse quadro?
O.M. – Os jornais precisam ter fortes ligações e relevâncias para as comunidades onde estão inseridos. O jornal pode falar da economia e da política, mas, se não olhar para a sua cidade e os interesses do seu cidadão, perderá a importância e a utilidade. Quanto mais útil é para o leitor, mais forte será para o anunciante e para suas marcas. O cidadão quer saber do funcionamento do seu bairro e da sua cidade.
A prestação de serviços pode ser o grande diferencial para os veículos serem mais próximos das comunidades. É o melhor jeito de criar elos com a população. Reparem que a forte e líder TV aberta dá grande importância ao jornalismo das suas praças exatamente por isso.
Você esteve presente no 10º Congresso Brasileiro de Jornais, quando foi apresentado o projeto de reposicionamento da mídia Jornal. Qual a sua opinião a respeito?
O.M. – Lá no Congresso vi todos os executivos falando a mesma língua e se apresentando da mesma forma, com a mesma oferta comercial na área digital. Foi encontrado um caminho que agora tem de ser explorado ao extremo até um dia deixar de fazer isso só no digital, mas também no meio Jornal como um todo.
A rede Digital Premium e o Marketplace da ANJ serão lançados oficialmente em breve. Qual a sua opinião a respeito dessas iniciativas?
O.M. – Temos de fazer o Digital Premium acontecer, ser um sucesso, para depois ser o jeito de comercializar jornais como um todo e não só no digital. Não pode haver medo de errar ou timidez por parte dos jornais com relação ao Digital Premium. Tem de fazer acontecer porque me parece claro que essa forma de comercialização vai revolucionar o meio e vai entrar também pela comercialização tradicional.
Temos de demolir uma das queixas de quem programa jornal que é dizer que ele é trabalhoso e complicado. O Digital Premium quebra esse argumento porque simplifica e facilita a compra de mídia.
Como vê a atuação dos novos e grandes players do mercado, como Google e Facebook?
O.M. – Eles vivem do mercado publicitário e não têm respeito por esse mercado: não levam em conta as práticas nem as métricas publicitárias. Não dizem sequer o que faturam e como faturam ou como vendem seus anúncios. Nosso desafio é fazê-los parte do mercado.
Em que medida a publicidade programática é prejudicial para as agências?
O.M. – Ela é mais uma maneira de comprar e avaliar a mídia. As agências têm de saber trabalhar com ela e é isso o que o mercado está fazendo. É importante lembrar que não há empresas de mídia no Brasil, e esta é mais uma razão para as agências fazerem também essa compra de mídia de maneira correta e eficiente.
Os aprendizados da mídia programática já começam a influenciar as áreas de mídia das agências no Brasil, e isso vai nos ajudar a ser mais rápidos e mais eficientes, porque no fundo é essa rapidez e esse acerto que buscamos.
E a publicidade nativa e o brand content? Estamos diante do fim da separação entre “Igreja e Estado”? É saudável essa interação entre conteúdo jornalístico e publicitário?
O.M. – Não tenho certeza de que seja o fim. Não acredito que o fim da separação entre Igreja e Estado seja bom para a Igreja ou para o Estado e muito menos para os leitores e anunciantes. O anunciante não pode e não quer tapear a audiência misturando anúncio com matéria editorial, mas temos de descobrir a melhor maneira de tratar conteúdos com interesse comercial e claramente publicitário e diferenciá-los dos conteúdos jornalísticos.
Considera adequada a política do Governo Federal de investimentos publicitários?
O.M. – Eu não sei claramente qual é a política, mas o setor espera que a política seja técnica sempre – que respeite pesquisa, audiência, relevância etc. E que faça o melhor uso do dinheiro e dos recursos públicos, sempre com o objetivo de cumprir da melhor maneira o papel da atividade publicitária – munir o cidadão de informações de forma que ele se mantenha informado e saiba fazer escolhas de forma consciente.
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Carlos Müller e Ricardo Pedreira, do Jornal ANJ