Os grandes jornais paulistas finalmente se deram conta da gravidade da situação provocada pela combinação das fortes chuvas com a incúria das autoridades. Tanto o Estado de S.Paulo como a Folha de S.Paulo entregam a seus leitores, na quarta-feira (12/1), edições especiais sobre as enchentes e deslizamentos que atingem milhares de famílias na região metropolitana da capital. Com uma novidade: os dois jornalões começam a questionar a competência do prefeito de São Paulo e do governador do estado.
Segundo a Folha, o governador Geraldo Alckmin promete obras para o próximo verão e joga a culpa no colo de seu antecessor, José Serra. O jornal lembra que seu partido está há 16 anos no comando do estado e que o próprio Alckmin, em mandato anterior, realizou uma obra bilionária de rebaixamento da calha do rio Tietê, com a promessa de acabar com as enchentes.
‘O que deu errado?’ questiona a manchete no caderno ‘Cotidiano’, da Folha, acrescentando a resposta: ‘faltou alerta’ para fechar as ruas alagadas e ‘faltou fiscalização’ para evitar a ocupação de morros e outras áreas instáveis.
A palavra
Um jornalismo cheio de dedos impede que se declare a verdade: faltaram competência e sensibilidade.
Para se ter uma idéia de como os problemas são vistos com olhos diferentes conforme os personagens envolvidos, basta lembrar que, por muito menos, os jornais ainda tascam nas manchetes a expressão ‘caos aéreo’ a cada atraso de vôo em algum aeroporto brasileiro.
A imprensa adotou a expressão após o acidente com o Boeing 737 da Gol, que se chocou em pleno vôo com um jato executivo Embraer Legacy, em 29 de setembro de 2006. O afastamento de oito controladores de vôo para investigações deflagrou naquela ocasião uma ‘operação padrão’ em aeroportos de todo o país, causando sucessivos atrasos e cancelamentos.
O caderno ‘Metrópole’ do Estadão também cobra a responsabilidade do governador e do prefeito, lembrando que os locais alagados são conhecidos há 24 anos, relata os dramas de muitas famílias e diz que as verbas para canalizações de córregos foram reduzidas.
A situação é descrita como caótica, mas em nenhum momento os jornais abrem manchetes sobre o ‘caos urbano’.
Caos deve ser apenas o aéreo, e conforme quem esteja no governo, é claro.
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