Fiquei chocado ao ler o artigo ‘Revistas dão vexame e ninguém se incomoda’, escrito por Alberto Dines, do Observatório da Imprensa. Ao criticar o suposto denuncismo da imprensa, Dines dá um exemplo cabal de como um jornalista pode ser apressado, leviano e injusto ao se sentar diante de uma folha de papel em branco. Exemplo típico do denuncismo de quem denuncia o denuncismo.
No artigo, Dines aborda o que ele imagina ter sido o modus operandi da entrevista da secretária Fernanda Karina Somaggio à IstoÉ Dinheiro. Segue o que ele escreveu:
‘A entrevista-bomba de Fernanda Karina, programada para sair em setembro do ano passado, foi engavetada depois da visita de Marcos Valério a Domingo Alzugaray, dono da Editora Três, responsável pela publicação da IstoÉ Dinheiro. O lobista revelou ainda que pagou R$ 300 mil ao jornalista Gilberto Mansur, funcionário da editora e seu consultor. Menos de 24 horas antes, no programa Observatório da Imprensa na TV, o repórter Leonardo Attuch, autor da matéria com Fernanda Karina, declarava peremptoriamente que a matéria não foi publicada em setembro de 2004 por falta de provas; negava, também peremptoriamente, qualquer encontro com Marcos Valério. O depoimento no dia seguinte de Marcos Valério mostrou que o jornalista mentiu duas vezes: esteve com Marcos Valério e a razão que impediu a publicação daquela bomba não foi a falta de provas, mas o peso dos R$ 300 mil pagos à Editora Três.’
São acusações graves e que não podem ficar sem resposta. Como já foi exaustivamente explicado, a entrevista foi feita em duas etapas: setembro de 2004 e junho de 2005. No primeiro momento, não foi publicada por decisão editorial. Karina acusava seu ex-chefe sem provas e não se dispôs sequer a nos enviar sua agenda. Em junho, após as acusações de Roberto Jefferson à Folha de S. Paulo, Karina deixou de ser a acusadora da história e passou a ser a testemunha central do caso. Como qualquer estagiário de direito é capaz de compreender, às testemunhas não cabe provar. Cabe apenas testemunhar. E foi na condição de testemunha que Karina foi apresentada ao leitor da IstoÉ Dinheiro.
Absolutamente transparentes
Dines afirmou ainda que a reportagem não foi publicada em setembro do ano passado em função do lobby de Gilberto Mansur, assessor do publicitário Marcos Valério. É uma mentira deslavada e Dines sequer se deu ao trabalho de checar os dados da CPI. Mansur, que trabalha para as agências de Valério há quase 10 anos, recebeu um pagamento de R$ 300 mil em março de 2004. O primeiro contato de Karina com a revista Dinheiro foi feito seis meses depois, em setembro de 2004. Como alguém pode receber para abafar algo que sequer existia?
Dines afirma que eu menti duas vezes em seu programa, o Observatório da Imprensa. A primeira, por ter negado ‘peremptoriamente’ qualquer encontro com Marcos Valério. Eu não poderia ter negado o que não me foi perguntado. Mas, se a pergunta tivesse existido, eu não teria me omitido. Até porque eu nunca estive com ele. Apenas o vi, de relance, uma única vez na editora. E, se dei um ‘bom dia’ a ele, foi muito. Aliás, o mesmo relato foi feito por Valério na CPI. Minha segunda mentira, segundo Dines, seria não ter revelado no programa a razão pela qual a entrevista não foi publicada nove meses atrás. No programa, eu disse a verdade, ou seja, que a entrevista não saiu por razões editoriais. Eu estaria mentindo se dissesse o que Dines julga ser verdade. Até porque, como já expliquei, como alguém pode abafar uma entrevista inexistente?
Dines disse ainda que a revista IstoÉ publicou apenas uma pequena e tímida nota sobre o caso Mansur. Mas quem entrevistou a secretária Karina não foi a revista IstoÉ. Foi a revista IstoÉ Dinheiro. E nós, na última semana, dedicamos três páginas ao assunto na reportagem ‘A versão de Marcos Valério’. Desde o começo de toda essa história, cercada de insinuações falsas e sórdidas (dinheiro para publicar, dinheiro para engavetar, dinheiro para entrevistar), temos sido absolutamente transparentes. Foi em nome dessa transparência que, nas últimas duas semanas, fiz questão de falar em duas ocasiões ao Observatório da Imprensa. Lamento apenas que Dines, o novo denuncista da imprensa brasileira, se julgue no direito de tirar conclusões tão precipitadas quanto falsas.
Alberto Dines responde
Leonardo Attuch foi atacado pela síndrome de Roberto Jefferson. O deputado tentou sair do banco dos réus com o hábil recurso de colocar um montão de gente a seu lado. Já o jornalista Attuch tenta escapar das graves suspeitas que envolvem seu comportamento espalhando acusações contra aqueles que o desmascararam. Jefferson e Attuch equivalem-se.
Quando o jornalista foi atacado por Veja e CartaCapital, oferecemos a ele a chance de se defender. Primeiro nesta edição online e, em seguida, na edição televisiva deste Observatório (em 5/5/2005). Pedimos que explicasse como é que um repórter tão expedito tenha perdido a oportunidade de dar o furo e, assim, introduzir figura & façanhas de Marcos Valério. Sua resposta não foi convincente, deixou inúmeras suspeitas, mas ficou o registro.
No dia seguinte, Attuch foi desmentido espetacularmente pelo próprio Marcos Valério, que contou em detalhes sua visita à Editora Três e o engavetamento, logo em seguida, da matéria de capa de IstoÉ Dinheiro com Fernanda Karina Somaggio (que poderia ter antecipado o escândalo em alguns meses).
Não é por solidariedade que Attuch defende o jornalista Gilberto Mansur. Ele o faz para proteger a figura de Domingo Alzugaray, publisher da Editora Três, seu patrão, neste momento empenhadíssimo em não aparecer novamente no noticiário depois da gravação sobre a venda de uma capa de IstoÉ à Schincariol.
Gilberto Mansur é (ou foi) consultor das empresas de Marcos Valério, é (ou foi) consultor da Editora Três. Isto não empana o seu currículo profissional como jornalista. Mas na qualidade de consultor ou operador de negócios fez a aproximação entre Valério e Alzugaray. Graças a esta operação, deixou os dois clientes satisfeitíssimos: Valério imaginou que estava livre da denúncia da ex-secretária Fernanda Karina e Alzugaray prestou um enorme favor a um lobista conhecido por sua generosidade.
Quem ficou mal foi Attuch, que no programa Observatório da Imprensa na TV declarou que deixou de dar o furo no ano passado porque não tinha provas suficientes. Pode ser. Menos de 24 horas depois, ficou evidente que o jornalista consciencioso foi pivô ou vítima de um escabroso negócio do patrão que agora tenta proteger.
Jornalista consciencioso não age desta maneira: perde o emprego mas diz a verdade. (A.D.)
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Editor de economia da IstoÉ Dinheiro