Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O dever de publicar

Há muitas interpretações curiosas na praça a respeito do processo pelo qual documentos da diplomacia dos EUA chegaram ao WikiLeaks e aos órgãos de imprensa. Em meio a elucubrações diversas, duas teses tratam a imbricação do episódio com a prática do jornalismo. São as seguintes:

1) os jornais deixam de praticar reportagem. São irresponsáveis ao publicar telegramas vazados;

2) os jornais se associam ao comportamento temerário do WikiLeaks. Divulgam dados sensíveis, como a lista de locais vitais para a segurança de alguns países.

As duas proposições derivam de desinformação ou má-fé. Nenhuma das sete publicações no planeta com acesso privilegiado aos telegramas, a Folha incluída, deixou de averiguar o conteúdo dos despachos antes de publicá-los.

Ontem [10/12], por exemplo, a Folha ouviu várias fontes sobre o relato de 2005 no qual um diplomata dos EUA afirmava que Dilma Rousseff havia organizado três assaltos a bancos. O material apresentado aos leitores esclarecia não haver provas a respeito de tal acusação.

Não à autocensura

Sobre colocar em risco a vida de alguém, não parece ser o caso das reportagens que citam alguns dos milhares de telegramas obtidos pelo WikiLeaks. Há também uma cláusula explícita entre os jornais e a ONG tratando do tema: não divulgar nomes de pessoas que possam ficar em perigo físico por causa da revelação de suas declarações.

A Folha já segue normas rígidas e usou esse critério nas reportagens com despachos obtidos pelo WikiLeaks. Antes de um telegrama ser divulgado, cada frase é detalhadamente analisada por vários jornalistas envolvidos no processo.

Resta o episódio dos locais vitais para a segurança de alguns países. O WikiLeaks estava determinado a divulgar o dado. O que poderiam fazer os jornais? Se uma notícia vaza, a mídia tem o dever de publicá-la. Praticar autocensura não combina com o bom jornalismo.