TROPA DE ELITE
Radicalização periférica
‘Logo no início de Tropa de Elite – o interessantíssimo e polêmico filme de José Padilha – se fica sabendo que polícia, crime e tráfico fazem parte de um mesmo sistema: entrelaçam-se como fios de novelos gêmeos, corrompem-se e se degradam mutuamente. Quase de imediato se percebe também que o entrelaçamento é mais profundo. Nos morros e na cidade, os desejos de consumo, os estilos, a linguagem e os comportamentos sugerem uma ausência de distância social, ainda que seja escandalosamente ostensiva a disparidade de renda, educação e oportunidades entre aqueles mundos unidos pela diluição ética e pelo ofuscamento do futuro.
Os morros retratados no filme são ambientes abandonados, assistidos por uma ONG bem-intencionada, mas não pelo poder público. Jovens burgueses e de classe média compartilham espaços e drogas com jovens pobres, marginais e crianças, misturando de modo louco universos que, na base da sociedade, são incomunicáveis e se rejeitam com veemência. Parece não haver classes naquela ‘comunidade’ unida pelo desejo de sobreviver, de consumir, de ‘fazer algo’ e acontecer, sempre que possível contra o Estado (a polícia). Mas a exclusão, a miséria, a falta de perspectivas explodem por toda parte, a evidenciar um dilaceramento social extensivo. A violência generalizada é seu fermento, a dificuldade comunicacional, seu combustível. Não é somente a truculenta e fascista elite da tropa que se revela desqualificada para propor uma saída: todos – traficantes, universitários, políticos – chafurdam na mesma impossibilidade de ação positiva, dramaticamente abraçados.
Pode-se até dizer que o filme exagera na apresentação da violência, que nos morros também há gente decente dedicada a alcançar patamares consistentes de dignidade e sobrevivência. Que a polícia não é só aquilo que se vê, uma corporação corroída pela corrupção, pelo despreparo e pela luta interna. Como toda obra de arte, Tropa de Elite dá margem a muitas interpretações. Pode ter fascinado alguns brucutus de plantão e seduzido aquela parcela da população que acredita na lei do cão, mas não deixa ninguém indiferente. Ao desnudar uma situação lancinante, explosiva, faz um irrecusável convite à reflexão. Incentiva-nos a pensar no Brasil atual, onde o moderno está ao mesmo tempo radicalizado (repleto de tecnologia, individualizado e desinstitucionalizado) e aprisionado pela condição periférica do País, que nos mantém com boa parte do corpo submerso na pobreza, na ignorância e no atraso econômico-social.
O entrelaçamento destas duas ‘lógicas’, a da modernidade radicalizada e a da condição periférica, a do celular e a da miséria, dá cores ao Brasil atual. Voracidade produtiva e consumista, desejo contínuo de exposição, diversão e velocidade, conectividade fácil, desengajamento, fuga do Estado e da política são fenômenos derivados do moderno que se radicaliza. Vida que escoa pelos dedos, sem direção e sem formato estável: ‘líquida’, na sugestiva linguagem metafórica de Zigmunt Bauman. A condição periférica, por sua vez, nos encharca de pobreza, de violência, de luta insana pela existência, de indigência e não-reconhecimento, de massas subalternizadas, vistas como ameaça e problema, não como fato humano ou gente. A interpenetração das duas condições produz um tipo de vida: dinâmica, frenética, desigual, efêmera, inevitavelmente insegura e perigosa. Se a inovação tecnológica infrene apaga as distâncias de tempo/espaço, ao mesmo tempo polariza a convivência, separando as pessoas, por exemplo, em incluídos e excluídos digitais ou informacionais. Ao passo que, para uns, drogas e celulares são meios de vida, para outros, são fontes de prazer e entretenimento.
Encontramos traços deste modo de ser por onde quer que caminhemos. Ou será que as dificuldades e incertezas da escola e da educação têm que ver somente com fracasso pedagógico ou despreparo dos professores? A longa e interminável crise do Congresso Nacional seria, por acaso, o resultado exclusivo da mediocridade da classe política? E o que dizer da condição falimentar dos partidos? Podemo-nos contentar em atribuir as seguidas tragédias (aéreas, rodoviárias, urbanas, hospitalares) de nossos dias somente aos ‘sistemas’ e a seus operadores?
A modernidade radicalizada periférica está pulsando em nossos nichos sistêmicos e existenciais. A vida líquida, por aqui, é ainda mais informe. Não necessitaríamos de filmes como Tropa de Elite para saber disso. Bastaria olhar para os ambientes em que julgamos estar nossas maiores virtudes: nossas instituições, da família aos sindicatos, passando pelas escolas e pelos tribunais, pelo mercado e pelo Estado. Tudo parece meio desfocado e fora de controle: em transição acelerada, recomposição e ‘sofrimento’. Há coisas novas despontando, coisas velhas ruindo com estardalhaço, outras fenecendo em silêncio. O tom dominante é de dúvida, medo, incerteza e insegurança, mas não há como desprezar a potência positiva daquilo que emerge, nem achar que todos os cidadãos se deixaram contaminar por igual e não se orientam mais por nenhum valor cívico (honestidade, decência, integridade) ou aposta política.
A questão, como sempre, está na contradição e na ambivalência. Aquilo que se mostra mais ‘emancipador’ – a liberdade de escolha, a mobilidade, a democratização dos relacionamentos – também traz consigo novas injustiças e a reiteração de problemas já conhecidos: vantagens e oportunidades desigualmente distribuídas, hierarquias e assimetrias de novo tipo, exclusões inaceitáveis.
A época é estranha, turbulenta, difícil de ser decodificada. Ela está a nos dizer que problemas e conflitos não podem ser resolvidos por medidas unilaterais ou discursos fáceis. Dependemos sempre mais de pensamento crítico articulado e de políticas inteligentes, contínuas, democráticas, que valorizem as pessoas e produzam resultados sustentáveis.
Marco Aurélio Nogueira, professor de Teoria Política da Unesp,
é autor, entre outros, dos livros Em Defesa da Política (Senac, 2001) e Um Estado para a
Sociedade Civil (Cortez, 2004) E-mail: m.a.nogueira@globo.com’
VENEZUELA
A Venezuela começa a reagir
‘O coronel Hugo Chávez dispõe de folgada maioria na Assembléia Nacional para aprovar a constituição de seus sonhos. Pode-se dar como certo que, dentro de uns poucos dias, estará sacramentada a reforma que implantará na Venezuela um regime que submeterá toda atividade política, econômica, social e cultural à vontade de um único homem. E, de fato, é esta a única finalidade da reforma feita sob medida por e para Hugo Chávez: dar tintas de legitimidade constitucional a uma ditadura.
Mas também se pode dar como certo que Hugo Chávez já não conta com todo o apoio da sociedade venezuelana com que passou a contar desde a tentativa de golpe que o afastou do poder por 48 horas há quatro anos. O silêncio cívico que se seguiu às greves gerais e às gigantescas e quase diárias manifestações de rua que precederam a tentativa de golpe volta a ser rompido. Parcelas ponderáveis da população vão se dando conta de que o chavismo não é apenas mais uma moda populista ou uma alternativa legítima a muitas décadas de revezamento no poder de dois partidos que se haviam corrompido, mas, sim, é uma ameaça real e imediata às liberdades individuais e políticas. E não se deve estranhar essa percepção tardia.
Chávez só chegou aonde chegou porque é um grande comunicador e um excelente organizador. Suas intermináveis arengas radiofônicas e sua eficiente máquina de relações públicas ajudaram a anestesiar o senso crítico de boa parte da população. Com igual eficiência, ele estruturou o ‘bolivarianismo’ de forma a, simultaneamente, angariar apoios e a reprimir dissidências. O resultado é que cerca de 70% dos venezuelanos ou não sabem o que está sendo discutido na Assembléia ou não fazem idéia de quais serão as verdadeiras conseqüências da implantação do ‘socialismo do século 21’.
Essa ignorância começa a diminuir, mas não por obra dos partidos de oposição ou do que restou dos carcomidos partidos tradicionais. A reação está vindo da sociedade organizada.
A demonstração mais visível dessa reação, até agora, foi a marcha dos estudantes universitários pelas ruas de Caracas, na terça-feira. Mais de 20 mil jovens concentraram-se na Universidade Central da Venezuela e seguiram em passeata até a Assembléia Nacional. Seu objetivo não era pressionar o Legislativo a rejeitar o monstrengo constitucional – que já estava quase todo aprovado em terceira e última discussão -, mas pedir que o referendo convocado para o dia 2 de dezembro fosse adiado para 2 de fevereiro. Querem tempo para que a população possa se inteirar da letra, do espírito e das conseqüências do ato que transformará Chávez em ditador constitucional da Venezuela.
A manifestação, autorizada pela municipalidade de Caracas e protegida pela Polícia Metropolitana, enfrentou durante todo o percurso a hostilidade de grupos de militantes chavistas. Foi interrompida momentaneamente pela repressão violenta da Guarda Nacional, mas não recuou. Finalmente, uma delegação de estudantes foi escoltada pela polícia até a Assembléia, onde entregaram o seu manifesto.
No mesmo dia, as Academias Nacionais de Letras, História, Medicina, Ciências Sociais e Economia emitiram comunicado conjunto, afirmando que só se pode mudar os princípios fundamentais da constituição vigente através de uma Assembléia Constituinte. ‘O contrário constitui uma fraude constitucional.’
O episcopado venezuelano também saiu a campo: ‘Um modelo de Estado socialista, marxista-leninista, estatista é contrário ao pensamento do libertador Simón Bolívar e também contrário à natureza do ser humano e à visão cristã do homem, porque estabelece o domínio absoluto do Estado sobre a pessoa. Experiências de outros países mostram que em tal sistema o Estado e seu governo se convertem em opressores das pessoas e da sociedade, restringem a liberdade pessoal e a expressão religiosa, e causam gravíssima deterioração da economia, produzindo pobreza generalizada.’
A Assembléia Nacional, controlada por Chávez, aprovará a constituição liberticida. Mas as manifestações desta semana mostram que, daqui por diante, Chávez não poderá continuar fingindo de democracia. Só a repressão pela força policial-militar poderá evitar que seu reinado termine antes do que ele pretende.’
TV PÚBLICA
O Estado de S. Paulo
TV pública tem que se impor, diz Franklin
‘O ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, avaliou ontem que a TV pública terá alguns anos para mostrar à sociedade ‘que é importante’. Se não conseguir, um governo contrário à sua existência poderá extingui-la sem resistências, acrescentou o ministro, em debate sobre a TV pública na Comissão de Serviços Públicos da Assembléia gaúcha. Também voltou a afirmar que o governo reconhece o risco de a TV assumir conotação ‘chapa branca’ e por isso estabeleceu fiscalização por meio de conselho curador.’
INTERNET
Internet via celular na China desafia o Google
‘O site de buscas Google afirma estar enfrentando um desafio incomum para a empresa no mercado de internet da China: atingir uma massa de internautas que navega pela primeira vez por celulares, em vez de usarem computadores. O problema está fazendo a companhia projetar novos produtos direcionados ao mercado local. Com 1,3 bilhão de habitantes, a China tem hoje cerca de 500 milhões de usuários de celulares. O número de usuários de internet no país é de 162 milhões.’
Windows pode entrar no laptop de baixo custo
‘A Microsoft disse ter feito progressos na tentativa de criar uma versão do sistema operacional Windows XP compatível com o laptop de baixo custo XO, criado pela fundação Um Laptop por Criança. O computador, criado para ser usado pela crianças de países pobres, usa como sistema operacional o software livre Linux. Para a Microsoft, ficar fora de um projeto como esse significará a perda da oportunidade de expor dezenas de milhões de crianças em todo o mundo ao seu sistema.’
MP aciona Google para obter dados
‘O Ministério Público do Rio ingressou na quinta-feira com uma ação civil na 26ª Vara Cível contra a Google Brasil Internet Ltda. O objetivo é obrigar a empresa a fornecer, sem intervenção judicial, dados de usuários do Orkut acusados de cometerem crimes. Cada requisição descumprida resultará em multa diária de R$ 50 mil. A Google alega que os dados ficam nos Estados Unidos.’
SÃO PAULO
Kassab propõe nova lei para liberar jornais gratuitos
‘O prefeito Gilberto Kassab (DEM) enviou à Câmara um projeto de lei para garantir a distribuição dos jornais gratuitos nas ruas. A proposta altera a redação de um parágrafo da lei sancionada na semana passada pelo prefeito, retirando o trecho que só autorizaria a distribuição gratuita de publicações com no mínimo 80% de conteúdo jornalístico.
A nova redação permite a distribuição gratuita de jornais e periódicos, desde que se enquadrem na Lei Federal nº 5.250 – a Lei de Imprensa -, que obriga o registro dos veículos nos cartórios de Registro Civil das Pessoas Jurídicas. Enquanto o projeto não for votado, segue valendo a proibição já transformada em lei. O prefeito deve regulamentar, em 90 dias, quem fará a fiscalização. A multa para quem desrespeitar a restrição foi estipulada em R$ 5 mil, dobrada em caso de reincidência. O novo projeto será aprovado sem dificuldades, por causa da reação contrária à primeira proposta.’
‘Metro’ e ‘Destak’ não fazem parte da ANJ
‘Os jornais Metro e Destak, os principais com distribuição gratuita na capital paulista, não integram a Associação Nacional dos Jornais (ANJ). A suposta adesão à ANJ era vista por vereadores como uma brecha a ser apresentada na regulamentação da lei sancionada pelo prefeito Gilberto Kassab para evitar a proibição de distribuição dos jornais gratuitos nas ruas da cidade. Os vereadores estudavam como evitar a proibição antes de a gestão Kassab decidir reformular a lei.’
GREVE
Um incêndio sem chamas ameaça Hollywood
‘Cinema americano em greve? Há quem acredite que isso jamais acontecerá. Mas a verdade é que pode, perfeitamente, acontecer. E daqui a dez dias.
Foram exatamente com essas palavras que iniciei uma matéria, neste caderno, em 21 de abril de 2001. Só não as coloquei agora entre aspas porque o prazo, desta feita, caiu pela metade: a próxima greve dos roteiristas de Hollywood (ou escritores, ‘writers’, como genericamente são chamados e sindicalizados) está marcada para daqui a cinco dias.
Motivos? Os de sempre. Basicamente, maior participação nos lucros obtidos na comercialização de outras mídias, como TV, DVD e internet. À frente do movimento, como da vez anterior, o Writers Guild of America, o sindicato dos que escrevem roteiros, esquetes, piadas e correlatos para filmes e programas de televisão. Que, aliás, são dois: um na Costa Oeste (presidido por Patric Verrone, que fez carreira entre os Muppets e os Simpsons), outro na Costa Leste (presidido por Chris Alberts). Ambos afinados como há muito não andavam. Azar dos produtores.
Se apenas os incêndios que há uma semana devastam a Califórnia já interromperam as externas de algumas telesséries (entre as quais, 24 Horas, Cold Case e Big Shots), imagine os estragos complementares que uma nova greve de escritores poderá causar à produção de filmes, shows e enlatados. Afinal de contas, a primeira matéria-prima de um filme e uma telessérie continua sendo o script.
Há um contrato em vigor entre o WGA e a associação dos produtores de filmes e programas de TV (Alliance of Motion Pictures and Television Producers), que expira na próxima quarta-feira. Na última semana de agosto, os dois lados prometeram acertar os ponteiros até 19 de setembro. Um mês depois, nem um dia a mais, nem um dia a menos, uma reunião do WGA, com recorde de comparecimento, pôs a hipótese de greve na agulha, agendando o disparo para o Halloween.
O confronto era inevitável. Os escritores reivindicam um contrato de três anos com um aumento nos adicionais que passaram a receber, depois da greve de 2001, sobre a venda de filmes e shows televisivos lançados em DVD. ‘Precisamos de um contrato que nos assegure uma participação condizente com o sucesso financeiro proporcionado pela globalização’, sumariou Patric Verrone, à frente do WGA desde 2005.
Os produtores propuseram a substituição dos adicionais por uma bonificação a ser paga só depois que os filmes e os programas de TV começassem a dar lucro. Alegam os estúdios que a economia cinematográfica atravessa uma crise sem precedentes. Ficou muito mais caro produzir e lançar um filme com imodestas ambições comerciais. Não bastasse, com o desvio crescente de público para outras modalidades de entretenimento (a indústria de videogames já é mais próspera que a de filmes), as bilheterias foram encolhendo. Só com as vendas de DVDs, os custos escorchantes de produção e marketing de um filme costumam ser ressarcidos.
Os escritores sabem que tudo isso é verdade, mas não querem perder o maná das novas tecnologias e sentiram-se humilhados pela contraproposta da bonificação, em detrimento dos privilégios já adquiridos.
‘Nós somos os negros da indústria cinematográfica’, queixou-se há décadas o roteirista Lester Cole, que, com mais nove escritores, fundara, em 1933, o Screen Writers Guild, embrião do WGA. Por essa e outras, Cole acabaria entre os ‘Dez de Hollywood’ engaiolados pelo macarthismo.
Hoje talvez Cole trocasse de parâmetro, optando pelos ETs. Quem vive da palavra escrita não tem por que sentir-se integrado a uma terra onde a maioria só lê com atenção contratos, créditos de filmes, extratos bancários e testamentos. Tratados a papinha no começo do cinema sonoro, que a seus préstimos recorreu no desespero, os escritores acabaram virando uma escória de luxo, proibidos de pisar no sets de filmagem, obrigados a engolir calados a intromissão em seus scripts e a ficar de plantão para atender a alterações de última hora impostas por diretores, produtores, e até mesmo atores de elevado cacife e sideral vaidade. Vocês viram o que aconteceu com Burton Fink. E com Joe Gillis, o personagem de William Holden em O Crepúsculo dos Deuses, que acabou boiando, sem vida, numa piscina do Hollywood Boulevard.
Uma trégua é possível. Provisória, naturalmente. Os escritores podem suspender a greve, trabalhar alguns meses sem contrato, e voltar à carga, supostamente com mais força, no final de junho, que é quando expira o contrato do sindicato dos atores, o Screen Actors Guild, bem maior, bem mais poderoso, e simpático à causa dos seus ‘colegas intelectuais’.
No sindicato dos diretores (Directors Guild of America) o WGA não confia. Em 2004, o DGA fechou seu contrato com a AMPTP oito meses antes do prazo previsto, deixando os escritores com a broxa na mão. Os diretores conseguiram parte do que pretendiam (contribuição substancial dos produtores a seus planos de saúde), mas tiveram de abrir mão de outras aspirações, como a ampliação de direitos sobre a venda de DVDs. O atual contrato do DGA termina na mesma data do dos atores, mas não seria surpresa se seu atual presidente, o cineasta Michael Apted, e o diretor executivo Jay Roth acertassem as diferenças da categoria com os produtores bem antes de 30 de junho.
Em 2001, os atores ameaçaram cruzar os braços, mas os estúdios se safaram apressando a confecção de filmes e telesséries, nos primeiros meses do ano. A situação agora é mais complicada. O SAG está negociando oito contratos separados, que também cobrem comerciais e trabalhos interativos.
Apesar da crise, os estúdios estão mais bem amparados do que na grande greve de 1988 (22 semanas de paralisação e um prejuízo de US$ 500 milhões), pois agora pertencem a conglomerados com as arcas cheias de dólares. Deram mostras disso um ano atrás, quando Peter Jackson e outros contratados pela produção de Halo recusaram-se a reduzir seus salários. Em questão de horas, a Fox e a Universal deixaram o projeto à deriva.
Esbanjando prosápia, J. Nicholas Counter III, há 25 anos presidente e negociador da AMPTP, aventou promover um lockout, caso nenhum acordo seja fechado até a próxima quinta-feira. Desistiu da idéia ao dar-se conta de que a barração de eletricistas, maquiadores e outros técnicos à porta dos estúdios poderia afetar a imagem dos produtores. Counter nada tem a oferecer, a não ser um contrato leonino. ‘Impossível encontrar fórmulas de ajuste a sistemas ainda em fluxo, sem custos nem retornos previsíveis’, justifica-se.
Em 1988, David Letterman abriu o seu Late Show alertando os telespectadores e a platéia que não tinha o que fazer, pois os profissionais que escreviam suas piadas estavam em greve. ‘Vou aproveitar pra fazer a barba’, anunciou, com a maior cara-de-pau, chamando ao palco um barbeiro. ‘Deve durar uns 55 minutos, senhoras e senhores. Não mais do que 55 minutos!’ E a barba foi feita, com a devida calma; tanto que durou 55 minutos. Johnny Carson, que na época comandava o talk show de maior audiência do país, passou a encher o tempo improvisando comentários jocosos sobre fotos trazidas (e tiradas) por seu parceiro Ed McMahon.
Como em 1988, os talk shows serão os mais afetados pela greve marcada para o dia 1º. Sobretudo o Late Show (CBS), o Daily Show e The Colbert Report (Comedy Central), construídos em cima do noticiário do dia. Quem irá municiar as gozações e os monólogos de David Letterman, Jon Stewart e Stephen Colbert? Embora eles próprios produzam parte de seus scripts e saibam improvisar, o sindicato só os autoriza a aproveitar material pessoal escrito antes da deflagração da greve.
Numa emergência, o jeito será apelar para reprises, artifício que os fãs das telenovelas vespertinas, por exemplo, não toleram. Pânico nos bastidores da CBS: The Young and the Restless, assistida diariamente por 6 milhões de telespectadores, conseguiu adiantar apenas um mês de gravações. Esgotado o estoque de novos capítulos, deverá, como as demais soap operas, ser substituída por atrações telejornalísticas e esportivas. Programas de esporte, concertos e shows produzidos na Inglaterra e Austrália poderão pintar nas telinhas americanas, caso a greve persista por muito tempo. A NBC estuda a possibilidade de pôr no ar a versão inglesa do seriado The Office.
Dependendo do início e da duração da greve, alguns programas nada sofrerão. Os aficionados de Os Simpsons podem ficar tranqüilos. Assim como os de séries longas resguardadas por um esquema cauteloso de produção, como Law & Order: SVU e House. Para evitar surpresas desagradáveis, a NBC acelerou a conclusão de 30 novos episódios de Heroes.
Não são boas as notícias para o público cativo de Lost: sua produção parece irremediavelmente comprometida. A maioria dos reality shows, infelizmente, está a salvo, pois seus roteiristas não são sindicalizados. E ai deles se cismarem de entrar para o WGA. Doze roteiristas de America’s Next Top Model insistiram nessa idéia, atraídos pela pensão e seguro-saúde assegurados pelo sindicato, e foram recentemente demitidos pelos produtores do programa.
Os cinéfilos podem ficar sossegados. Se curta a paralisação, seus efeitos serão quase imperceptíveis. Os estúdios operam com bastante folga de tempo e há muito acumulam pilhas e pilhas de scripts. Mas algumas produções em andamento deverão sentir o tranco. Embora iniciadas com a greve já no forno, não havia como nem porquê apressar o ritmo dos trabalhos. Correr com uma produção é roubada na certa. No cinemão, a pressa sempre foi inimiga da perfeição.’
CINEMA
Roma encerra hoje sua mostra – e Babenco faz bonito
‘Ennio Morricone rege hoje a cerimônia de encerramento da segunda edição do Festival Internacional de Cinema de Roma. Sob aplausos e protestos, o RomeFilmFest começa a se firmar como evento de peso no calendário cinematográfico mundial. ‘Roma merece um festival. Foi aqui que nasceu o cinema. As críticas são sempre bem-vindas, mas o festival é mais bem-vindo ainda’, afirmou o mestre Morricone, que hoje estará à frente da Orquestra Santa Cecília e se apresentará antes da entrega dos troféus Marco Aurélio, o prêmio máximo da festa.
Há quem diga que este ainda é um festival que percorre os caminhos do cinemão, que recheia de estrelas de Hollywood as sessões Première, que não ‘valem’ prêmio, deixando em segundo plano os filmes que de fato entraram no festival para valer. Procede. Um bom exemplo é Halle Barry. A diva fechou ontem o desfile de celebridades. Halle e Benicio Del Toro foram as duas últimas estrelas internacionais a passarem pela Sala Santa Cecília, a principal do evento. A dupla protagoniza o drama Things We Lost in the Fire ( Coisas que Perdemos no Incêndio), de Susanne Bier.
A passagem de Halle causou, obviamente, muito mais alvoroço que a exibição do maravilhoso La Rabbia, cópia restaurada do clássico de Pasolini, que contou com debate acalorado depois de sua exibição.
Halle interpreta Audrey Burke, uma dona de casa de Seatle casada com um marido quase perfeito, Brian (David Duchovny, de Arquivo X). Seu único porém é ‘perder tempo’ demais com o amigo Jerry Sunborne (Benicio del Toro), um ex-advogado viciado em heroína. A amizade rende algumas brigas entre o casal. Até o dia em que Brian é assassinado e Audrey se diante do desafio de reconstruir sua vida.
Hector Babenco fez bonito na primeira exibição de seu O Passado na Europa. O filme integra a mostra competitiva e foi um dos mais elogiados por público e crítica. ‘Este não é um filme feito para mulheres ou homens. É sobre gente, relacionamentos, separação e amor’, dizia Babenco para o público.
Bem-recebido também foi Reservation Road, de Terry George. ‘Este é um filme sobre vingança, mas também sobre a capacidade de perdoar. Acho que todos nós, ocidentais, acabamos nos tornando muito preocupados em encontrar culpados para os atentados de 11 de setembro’, declarou o irlandês.
A repórter viajou a convite da organização do festival’
TELEVISÃO
Cristina Padiglione
Faustão em obras
‘Estacionado nos 17 pontos de média há três fins de semana, o Domingão do Faustão terá de se calçar para o calendário de 2008. A primeira providência será abastecer a parte inicial do programa de idéias mais atraentes ao público infantil.
Isso visa, antes de mais nada, a incentivar um progresso no número de televisores ligados no horário. Outra: se o novo programa de Xuxa aos domingos vingar, Faustão entrará no ar depois da loira. E, embora esteja produzindo um formato voltado a adultos, ela nunca deixa de atrair crianças. Esse nicho se reforça com a presença da Turma do Didi, exibido pouco antes, no mesmo domingo.
E a principal sugestão do Domingão para buscar a criançada é resgatar as gincanas das Olimpíadas do Faustão. Circo e aventura também estão no pacote.
Outra proposta do Domingão é criar um quadro de responsabilidade social com exemplos de vida de anônimos. Seria um meio de fazer frente a um filão politicamente correto descoberto há pouco tempo pelo programa do Gugu, no SBT: o Livro Legal, em que o apresentador sugere uma obra literária, lê trechos dela e distribui exemplares entre a platéia.’
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