A vingança é um prato que se serve quente – diz o adágio popular – e há de se degustá-lo até o fim. Exagero, talvez, pensar nesses termos em relação ao comportamento da imprensa nas denúncias dos Correios e do mensalão, para não dizer forçoso em distinguir algo como um ‘complô midiático’, arquitetado pelos grupos detentores dos meios de comunicação em conluio com grupos políticos de oposição ao governo.
A corda se distende, é certo – e o jogo está armado. Os interesses e os interessados são muitos, e as motivações várias: desde as particulares, ou principalmente estas, passando pelas subservientes (com a respectiva paga) até as mais ‘bem-intencionadas’, diga-se, em nome da democracia.
Uma avalanche de fatos tem sido noticiada sob diferentes enfoques, delineando um cenário de intensa crise política, quiçá institucional como querem alguns (a fim de recolher as sobras nos próximos pleitos, quem sabe).
Ressentimento e oportunismo
Verdade que a imprensa cumpre o seu papel – e tem o dever de fazê-lo como prestação de serviço público, de esclarecimento, de investigação e aprofundamento da discussão de questões tão delicadas da vida nacional – peca, entretanto, quando se deixa contaminar por uma ordem discursiva predeterminada, por empenhar a voz ao pensamento único, por não revelar (ou omitir) todos os interesses e matizes em jogo, não somente no âmbito nacional e sim no cenário global – a não ser que se pretenda um país eternamente servil aos preceitos neoliberalizantes do capital estrangeiro. Talvez a crise seja de identidade.
Mas o que interessa no momento é que o governo paga o preço – e talvez o tivesse de pagar de qualquer maneira – pelo tratamento dispensado à imprensa – concedeu poucas entrevistas coletivas, e quando o fez os procedimentos não foram os mais democráticos; tem priorizado a propaganda, reclama com freqüência das críticas recebidas ou simplesmente tem anuído com a condescendência aparente de muitos jornalistas.
As relações muitas vezes se amesquinham e não é preciso ser um expert para notar o ressentimento ou o oportunismo, com exceções, no trato jornalístico dado ao governo. Mas é justamente pela imprensa que o governo deve prestar contas à sociedade, demonstrar sua transparência e lisura, também sinalizar que está empenhado em esclarecer os fatos e punir os culpados. Todavia a opção parece ser a do improviso em discursos contundentes ou dos pronunciamentos com caráter de propaganda política.
Mudar o governo ou a política?
A guerra é a de informações – e o campo de batalha, uma vez mais, é o da mídia com o seu poder de convencimento e de manipulação. Não quer dizer isto que possa derrubar o governo, mas tem força suficiente para ser incisiva e elucidativa, tanto quanto perniciosa, sob o escudo da liberdade democrática. Há muitas maneiras, entretanto, de exercer tal liberdade, inclusive para que não surjam guardiões que em nome dela acabem instituindo a censura. Tênues os limites, ainda mais quando os discursos se inflamam e se resvala para a espetacularização. Outra vez a questão é de opção, com as presumíveis conseqüências.
Precipitado, porém, clamar ‘Fora Lula!’, antes de uma minuciosa e escrupulosa apuração. O governo tem em mãos uma oportunidade única para erradicar, de vez, essa maneira espúria, repleta de vicissitudes e fisiologismo de se fazer política.
Esse o trunfo de Lula – resta saber se será capaz de mobilizar a opinião pública e as forças políticas (que hoje o acusam e ao PT) para implementar mudanças profundas na política nacional, uma vez que tais mudanças afetariam diretamente todos os partidos (e todos aqueles que se beneficiam dos favores do Estado).
Querem mudar o governo, não a maneira de se fazer política – afinal é preciso que tudo mude para que nada mude efetivamente.
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Funcionário público e poeta, Jaú, SP