Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O jornal ‘chapa-branca’ e as eleições

O jornal Estado de Minas não desmente a versão popular de ser ‘chapa-branca’, ligado, sempre que pode, como durante o governo Aécio Neves, aos interesses do Palácio da Liberdade. Eis alguns exemplos do que faz o jornal para reforçar esta crença. Edson Zenóbio, um dos seus donos, na edição do dia das eleições, 05/10, fez um entusiástico elogio à estratégia de Aécio e Fernando Pimentel para a eleição de Márcio Lacerda à prefeitura de Belo Horizonte. Tirou das prateleiras empoeiradas da sua memória a figura do bruxo de Geisel e da ditadura militar, Golbery do Couto e Silva, para abençoar a façanha; afirmou que Golbery, ‘que na sombra, na surdina, idealizou e conduziu a histórica distensão política’ à época do regime militar, devia estar, ‘no andar de cima’, aplaudindo Aécio e Pimentel.

Entusiasmado com as maquinações do governador e do prefeito de Belo Horizonte, e mais do que certo da eleição de Lacerda já no primeiro turno, Zenóbio soltou o verbo. Para ele o governador e o prefeito uniam ‘competência e credibilidade’ na promoção da aliança por Belo Horizonte, ‘consolidando (se) a cada dia’.

Alinhamento incondicional

O dono do auto-intitulado ‘grande jornal dos mineiros’ fechou os olhos para o fato dos seus estrategas terem lançado para uma prefeitura importante, como Belo Horizonte, um candidato sem currículo político e, assim, sem o menor preparo para o diálogo eleitoral com o público. Acabaram trocando as bolas e fizeram a campanha de 2010 em 2008! Quem, com efeito, mais se manifestava, gesticulava e vocalizava nas aparições públicas das passeatas e lances do horário político na TV eram o governador e o prefeito. Entregaram ainda, para Lacerda, todo o trabalho mais pesado, de responder às muitas críticas a fatos da sua biografia, como a relação com o ‘mensalão’ de Marcos Valério e o PT e as peripécias da sua frágil campanha.

A surpresa não tardou e veio logo na tarde daquele mesmo dia, com o escrutínio da votação. O segundo colocado na disputa, Leonardo Quintão, encostara em Lacerda com uma diferença pouco superior a dois pontos percentuais. A surpresa tomou conta de todos os ambientes. Se pudesse, o dono do Estado de Minas, já naquela mesma tarde, correria às bancas e recolheria toda a edição do seu jornal que publicara o elogio desvairado.

Outro exemplo do alinhamento sistemático do jornal com o Palácio da Liberdade está na prosopopéia do analista político Marcos Coimbra, um dos donos do Instituto Vox Populi, contratado há tempos pelo jornal. É mais uma das numerosas peças de que o periódico dispõe para cantar a mesma música do alinhamento incondicional com o ocupante de turno do executivo mineiro.

Amainar os ânimos do PT

No texto publicado no domingo (12/10), dia do primeiro debate do 2° turno entre os candidatos e véspera da retomada da propaganda televisiva e radiofônica, ele atacou o candidato do PMDB, Leonardo Quintão. As forças oficialistas querem conter a todo custo o adversário que derrubou os muros da cidadela e ameaça expugná-la no 2° turno das eleições. Coimbra, em sua trincheira tão bem situada no coração de uma das fortalezas mais influentes do estado, o ‘jornal dos mineiros’, não pode, de fato, ficar de braços cruzados.

Lula, diz ele, não se envolveu diretamente nas disputas onde candidatos da sua base contendiam pela prefeitura local. Deixou, entretanto, que quem quisesse se referisse ao seu apoio na própria propaganda. Em Belo Horizonte, no entanto, ele foi mais envolvente. Além de fazer ali o que fizera em toda parte, sem participar diretamente da campanha, procurou os modos para mostrar inclinação por Márcio Lacerda e trabalhou para amainar os ânimos da direção nacional do PT – fortemente mobilizada, inicialmente, contra a aliança do PT com o PSDB em Belo Horizonte.

De analista político a cabo eleitoral

Mas o fato que mais intrigou Coimbra nada tem a ver com Lula, e sim, com o candidato Leonardo Quintão, em relação ao apoio eleitoral de Aécio Neves. Diz, a propósito, o sócio da Vox Populi que ‘o governador disse com todas as letras que apóia Márcio Lacerda e que o vê como o mais qualificado para ser o prefeito da cidade. Isso, normalmente, deveria bastar para esclarecer a questão. Para Quintão, no entanto, é como se uma manifestação dessas não tivesse qualquer significado. Na sua propaganda eleitoral, nas declarações à imprensa durante o primeiro e agora no segundo turno, ele parece que não ouve ou não entende o governador. Toda vez que pode, afirma contar com o apoio de Aécio’.

Em nenhum momento o ‘sociólogo e cientista político’ do Estado de Minas concedeu que tudo o que Leonardo Quintão disse, mesmo desagradando aos seus ouvidos e dos seus parceiros e/ou patrões, era verdade e não merecia a sua tão escandalizada reprovação, ou seja, ‘que pertencia à base político-parlamentar de Aécio Neves, que era seu aliado e seu amigo’. O próprio Aécio Neves confirmou tudo isto em várias declarações à imprensa. Marcos Coimbra abandonou, pelo visto, os hábitos muito honoráveis do analista político, para vestir, da forma mais plebéia, a camisa do cabo eleitoral.

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Professor aposentado do Departamento de Ciência Política da UFMG, doutor em Política pela Universidade de Urbino (Itália)